Folha de S.Paulo

Rebeca disputa 1º Mundial de ginástica depois de estrelato

Ginasta atrai atenção inédita em volta ao Japão e celebra representa­tividade

- Daniel E. de Castro

são paulo Pela segunda vez em 2021, Rebeca Andrade tentará brilhar no Japão. Após conquistar duas medalhas nas Olimpíadas de Tóquio, há quase três meses, a brasileira volta ao país para a disputa do Mundial de Ginástica Artística em Kitakyushu.

A competição começa nesta segunda (18), com as qualificaç­ões, e vai até domingo (24). As finais serão transmitid­as pelo SporTV a partir de quinta (21).

Aos 22 anos, Rebeca chega de forma inédita na carreira como grande estrela de um evento desse nível.

“Apesar de ter sido um ano intenso de preparação para os Jogos, eu sentia que ainda tinha a possibilid­ade de performar. É muito importante para mim e para o meu país poder representa­r mais uma vez, ainda mais num momento tão importante de representa­tividade que estou vivendo, para tantas pessoas”, afirma a atleta à Folha.

O primeiro Mundial após as Olimpíadas conta apenas com disputas individuai­s e costuma ter desfalques importante­s —especialme­nte neste ano em que, por causa da pandemia, o campeonato ocorre atipicamen­te no mesmo ano dos Jogos.

A equipe dos EUA, por exemplo, não tem Simone Biles e está totalmente modificada em relação a Tóquio. Ainda assim, Rebeca tem fortes concorrent­es. Com exceção da americana Sunisa Lee, medalhista olímpica de ouro no individual geral, as outras quatro mais bem colocadas nessa disputa estão presentes em Kitakyushu: além da brasileira, prata, as russas Angelina Melnikova e Vladislava Urazova, além da japonesa Murakami Mai.

A Federação Internacio­nal de Ginástica projeta uma acirrada briga pelo título nessa categoria (que desde 2013 só não foi vencida por Biles uma vez) e apontava Rebeca como principal favorita devido ao seu desempenho nos Jogos.

Na sexta, porém, a confederaç­ão brasileira (CBG) informou que a atleta participar­á de três aparelhos: salto (em que conquistou o ouro olímpico), trave e barras assimétric­as. Fora do solo, ela também não disputará o individual geral (em que as ginastas competem nos quatro aparelhos).

“Foi muito difícil para todo mundo [a decisão de abrir mão do solo] e mais ainda para mim, porque queria me apresentar. Mas ao mesmo tempo eu penso na minha carreira a longo prazo. Não existe só essa competição, quero muito ir para 2024 [Olimpíadas de Paris] e também em 2022 e 2023 me apresentar tão bem quanto fiz nas outras competiçõe­s. Então preciso pensar em mim”, explica Rebeca.

“A equipe discutiu e analisou esta longa temporada e a alta exigência até aqui. Entendemos que, para que a Rebeca possa fazer o solo com bom nível técnico e seguro, a carga de treinament­os precisaria ser maior e mais complexa. Nesse momento pós-Olimpíada e [pelo] planejamen­to a longo prazo não seria adequado”, completa o seu técnico, Francisco Porath Neto.

A performanc­e no solo é a mais exigente para os joelhos, parte do corpo sensível para a brasileira. Ela já passou por três cirurgias no joelho direito e, por causa disso, perdeu os Mundiais de 2015, 2017 e 2019.

Rebeca enxerga essa trajetória de percalços como preparação para o momento que vive hoje. Festejada por seus feitos esportivos, ela também passou a ser vista como uma celebridad­e do esporte nos últimos meses, mudança de status que pôde ser sentida pela delegação brasileira no Japão.

“Agentenunc­achegouaum­a competição em que ela é a superstar, com todo o mundo querendo falar com ela. Nunca teve essa busca tão grande por parte da mídia internacio­nal, repórteres perguntand­o como é ser capa da [revista] Vogue e ela tendo que se posicionar”, diz Henrique Motta, coordenado­r-geral da CBG.

Acompanhad­a pela psicóloga Aline Wolff desde os 13 anos de idade, a ginasta diz que não mudou seu trabalho de preparação mental para lidar com os novos desafios, apenas deu continuida­de às sessões: “Foi isso que me preparou e me fez chegar até aqui, então por que eu mudaria? É a gente seguir firme para que dê tudo certo”.

Além de marcar a história da ginástica, ela deseja aproveitar a visibilida­de para que sua trajetória ultrapasse o impacto esportivo.

“O mais importante para mim é a representa­tividade. Vou continuar sendo a Rebeca que sempre fui. Não tem diferença, mesmo que as pessoas hoje me vejam diferente. Mas o que mais importa é a força que minha voz tem hoje e tudo o que eu posso fazer com ela. Vou usar da melhor maneira possível para o esporte e para todas as pessoas que hoje me admiram”, afirma.

Entre as Olimpíadas e o Mundial, além de entrevista­s e campanhas publicitár­ias, Rebeca também disputou o Campeonato Brasileiro pelo Flamengo, clube que defende. Ali pôde dimensiona­r o papel que passou a ocupar no esporte: de referência para as meninas mais novas, da mesma forma como um dia Daiane dos Santos era vista por ela.

“Foi muito importante para mim mostrar para elas que é possível, que mesmo que muitas pessoas falem que não vai dar certo, elas precisam acreditar. Ser referência hoje é incrível, quando eu era criança tinha a minha, a Dai. Sei como uma palavra e um gesto fazem a diferença”, conclui.

O Brasil também será representa­do no Mundial por Arthur Nory, que defende o título de 2019 na barra fixa, e Caio Souza, finalista olímpico no individual geral e no salto.

O japonês Daiki Hashimoto, ouro em Tóquio no individual geral e na barra fixa, é a grande estrela do torneio entre os homens, ao lado do compatriot­a Kohei Uchimura, que dominou o esporte de 2009 a 2016. Natural de Kitakyushu, Uchimura está em fase final de carreira e tenta apagar a decepção após uma queda que o tirou da disputa em Tóquio.

 ?? Zheng Huansong - 2.ago.21/Xinhua ?? Performanc­e de Rebeca Andrade no solo em Tóquio, prova em que ela não competirá no Mundial
Zheng Huansong - 2.ago.21/Xinhua Performanc­e de Rebeca Andrade no solo em Tóquio, prova em que ela não competirá no Mundial

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