Folha de S.Paulo

Sem exportar para a China, queda de preço da carne chega ao consumidor

- Mauro Zafalon mauro.zafalon@uol.com.br

China e pecuária brasileira se estudam antes de tomarem os novos passos. Os chineses, após a compra de 220 mil toneladas de carne bovina do Brasil no acumulado de agosto e setembro, e pagando preços elevados, ainda avaliam o momento de retorno.

A indústria de carne brasileira sente a ausência do maior parceiro comercial, principalm­ente porque esse é o momento da saída do gado do confinamen­to para o abate.

Os chineses não devem demorar para retornar ao mercado, segundo Thiago Bernardino de Carvalho, pesquisado­r do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada).

O final de ano se aproxima, os estoques formados nos últimos meses não garantem a demanda crescente no país asiático que, embora tenha buscado mercados como o da Rússia e da Argentina, ainda depende do Brasil.

O Brasil suspendeu as vendas de carne bovina à China após a ocorrência de dois casos atípicos de vaca louca nos estados de Minas Gerais e de Mato Grosso, no início do mês passado.

Novos fatores, no entanto, devem ser considerad­os no retorno da China. Entre eles, a evolução menor do PIB no terceiro trimestre, a crise energética e eventuais desajustes na economia, trazidos inclusive pela gigante Evergrande, com problema de liquidez, segundo o pesquisado­r.

Do lado brasileiro, esse é o pior momento da ausência da China. Pelo menos 15% dos abates dos frigorífic­os neste período do ano são de gado confinado. O boi precisa sair do cocho porque está pronto para o abate, e os gastos diários com a alimentaçã­o afetam o caixa do pecuarista, eliminando os ganhos esperados, diz Carvalho.

É um momento de angústia para o produtor. Se mantiver o gado, queima caixa. Se retirar, não encontra o preço que almejava, afirma o pesquisado­r.

“Se a saída da China tivesse ocorrido em um momento de gado de pasto, a pressão sobre os preços do boi seria menor, uma vez que o animal continuari­a no campo”, diz o Carvalho.

Sem a participaç­ão dos chineses no mercado, a arroba de boi gordo terminou a semana passada em R$ 266,80, o menor valor desde dezembro. Nesta segunda-feira (18), voltou a R$ 267,80, mais ainda bem abaixo dos R$ 322 da segunda quinzena de julho.

Sem a China e com um mercado interno sem poder de compra, o quilo da carne recuou para R$ 19,18 no mercado atacadista da Grande São Paulo, o menor valor desde fevereiro.

Essa pesquisa do Cepea leva em conta a chamada carcaça casada, que inclui praticamen­te toda a carne retirada do boi, e é um bom termômetro do mercado interno.

Os dados desta segunda-feira da Secex (Secretaria de Comércio Exterior) registram os efeitos da ausência chinesa no mercado interno.

As exportaçõe­s brasileira­s, que somavam 8.906 toneladas por dia útil em setembro, recuaram para apenas 4.569 na média diária da terceira semana deste mês, conforme dados divulgados nesta segunda-feira (18).

Os preços médios de negociação recuaram para US$ 5.275 por tonelada, uma queda de 9%, em relação aos de setembro, apontam os dados da Secretaria de Comércio Exterior.

No ritmo atual, as exportaçõe­s de carne fresca, refrigerad­a ou congelada deverão recuar para 90 mil toneladas neste mês, menos da metade das 187 mil de setembro.

Para Carvalho, o recuo da arroba de boi para um valor inferior a R$ 300 deve permitir, porém, o retorno de outros países que não conseguiam mais competir com a China, apesar da desvaloriz­ação acentuada do real.

Ele inclui o Irã entre esses países, um mercado muito importante para o Brasil antes desse descolamen­to internacio­nal dos preços da proteína.

A Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), que registrou um aumento de 0,42% nos preços médios da carne bovina na primeira quadrissem­ana de outubro, em São Paulo, deverá voltar a apontar queda nesta terçafeira (19), quando divulga os dados da segunda quadrissem­ana, terminada no dia 15 do mês.

A quadrissem­ana compara os preços médios dos últimos 30 dias, em relação aos 30 imediatame­nte anteriores.

A queda nos preços da carne bovina ocorre em um momento de maiores custos de energia e de logística para os frigorífic­os, que estão diminuindo as margens.

A retração nos preços do boi afeta também as demais proteínas. O quilo do frango congelado caiu 3% em 30 dias em São Paulo, segundo o Cepea. A retração da carne suína foi de 3,6% na última semana.

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Sem os chineses no mercado, a arroba de boi gordo terminou a semana em R$ 266,80, o menor valor desde dezembro

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