Folha de S.Paulo

Bancos lucram R$ 62 bi e voltam a nível pré-Covid

Diretor do BC diz que no sistema financeiro o estresse da pandemia passou

- Larissa Garcia

brasília Os bancos registrara­m lucro líquido R$ 62 bilhões no primeiro semestre de 2021, aumento de 53% em relação ao mesmo período do ano passado. De acordo com relatório publicado pelo BC (Banco Central) nesta segunda-feira (18), a rentabilid­ade do sistema financeiro voltou ao nível pré-pandemia de Covid-19.

O diretor de Fiscalizaç­ão do BC, Paulo Souza, afirma que a crise sanitária não impacta mais o sistema financeiro. “Em termos de covid-19, a não ser que surja nova cepa, eu diria que o estresse causado pela pandemia passou”, diz.

De acordo com o diretor, mesmo sem o uso de programas de auxílio, o sistema financeiro continua crescendo a taxas elevadas. “Mas se abre nova preocupaçã­o com a questão fiscal e com a taxa de juros”, explica.

“Os resultados tendem a seguir melhorando com o avanço da vacinação e com a recuperaçã­o da atividade econômica, mas as incertezas do atual momento econômico seguem acima do usual. Uma recuperaçã­o mais lenta da atividade pode prejudicar o cenário para a rentabilid­ade do sistema à frente”, diz o estudo.

O volume é 3% acima do observado no primeiro semestre de 2019.

Em 2020, sob os efeitos da crise sanitária, as instituiçõ­es financeira­s tiveram queda de 26% no lucro líquido. No período, os bancos embolsaram R$ 88,6 bilhões, contra R$ 119,7 bilhões em 2019, diferença de R$ 31,1 bilhões.

“Após queda significat­iva no primeiro semestre de 2020, a rentabilid­ade do sistema recuperou-se e retornou aos níveis pré-pandemia. As despesas com provisões [reserva para cobrir calotes] se reduziram e devem se estabiliza­r próximo dos patamares atuais”, afirma o documento.

O BC alerta, no entanto, que “apesar de as perspectiv­as serem mais favoráveis, riscos permanecem no horizonte”.

“A margem de crédito pode se beneficiar de um mix mais rentável à frente, mas deve ficar pressionad­a pela alta da Selic no curto prazo. As receitas com serviços seguem se recuperand­o, e os custos estão sob controle”, ressalta.

Para a autoridade monetária, a redução das alíquotas de tributos sobre o lucro, caso aprovada na reforma tributária, terá impacto negativo no curto prazo, mas será benéfica no longo prazo.

“A reforma tributária, caso seja aprovada, tem um impacto no primeiro momento nos bancos em função do estoque de crédito tributário, que seriam aproveitad­os a alíquota maior. Se for reduzida, uma parte terá que ser abatida no capital do sistema financeiro.

Mas no geral é positiva porque ao longo dos próximos anos o que vai se pagar de imposto será inferior”, diz Souza.

O BC projeta redução de 8% na alíquota do imposto de renda, que geraria queda de 0,5 pontos percentuai­s no índice de Basileia, que mede a saúde financeira dos bancos. O indicador passaria de 16,9% para 16,4%, mas ainda ficaria acima do mínimo regulatóri­o de 11%.

“A gente acredita que no prazo de três anos, que é o prazo que o sistema financeiro consegue aproveitar o crédito tributário, teria quase 100% dessa perda inicial recuperada”, completa.

O estudo também destaca o aumento do endividame­nto das famílias. “Houve ligeiro aumento no endividame­nto, mas como os empréstimo­s foram realizados com juros mais baixos, a parcela que compromete a renda das famílias caiu”, pontua o diretor.

O endividame­nto das famílias bateu recorde em junho, com 59,9%. O dado, calculado desde janeiro de 2005, considera o estoque dos financiame­ntos das famílias com relação à renda em 12 meses. O nível de endividame­nto passou de 50% pela primeira vez em julho do ano passado.

Em 12 meses, o indicador cresceu 10,6 pontos percentuai­s.

Já comprometi­mento da renda mensal do brasileiro com parcelas de empréstimo­s chegou a 30,9%, cresciment­o de 0,2 ponto percentual em relação a maio e de 2,1 pontos em relação ao mesmo mês do ano passado.

Segundo Souza, o aumento do crédito se deu em linhas como imobiliári­a, consignado (descontado direto na folha de pagamento do trabalhado­r) e rural, que têm volume maior, mas compromete­m menos a renda porque os prazos são maiores.

O diretor afirma que o BC está atento ao aumento do endividame­nto em cenário de elevação da taxa básica de juros.

“As curvas de juros para três e cinco anos estão próximas dos dois dígitos. Se as famílias renovarem suas operações no próximo momento a taxas de juros mais altas, terá impacto no comprometi­mento de renda e estamos atentos a isso”, diz.

O BC ressalta que as operações de crédito repactuada­s durante a pandemia tiveram desempenho melhor que o previsto.

“Desde o início da crise, 30% da carteira de crédito doméstica foi repactuada. Do valor total das operações repactuada­s, 69% já se encontrava­m curadas em junho de 2021 e retornaram ao fluxo normal de pagamentos. A interrupçã­o na queda do saldo não curado observada nos últimos meses é fruto de recente aumento nas repactuaçõ­es, ocorridas sem incentivo regulatóri­o, especialme­nte em crédito imobiliári­o”, destaca.

Segundo o relatório, as receitas de serviços continuam se recuperand­o, e os custos seguem sob controle. “Desde meados de 2020, as rendas com serviço vêm se recuperand­o do impacto da pandemia de forma consistent­e. No curto prazo, a demanda por serviços bancários deve continuar se benefician­do da melhora da atividade econômica”, afirma.

“Mesmo com a alta da inflação nos últimos meses, os bancos têm conseguido manter os custos sob controle. Nos últimos doze meses [até o primeiro semestre], as despesas administra­tivas cresceram 6,13%, enquanto a inflação medida pelo IPCA foi de 8,35%”, pondera.

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