Folha de S.Paulo

Presidente da UNE recebe apoios em série após ataques nas redes

Bruna Brelaz recebeu mensagens racistas e machistas após defender frente ampla e apontar rede de ódio da esquerda

- Carolina Linhares

são paulo A presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Bruna Brelaz (PC do B), 26, tornou-se alvo de uma nova série de ataques nas redes sociais após apontar justamente a existência de uma rede de ódio na esquerda em entrevista à Folha. Por outro lado, recebeu também mensagens e notas de apoio de diversos políticos e entidades.

Primeira mulher negra e do Norte do país a ser eleita para presidir a UNE, Brelaz foi vítima de ameaças e ataques racistas e machistas.

Na entrevista, Brelaz falou sobre seu diálogo com representa­ntes da direita, como FHC (PSDB) e MBL (Movimento Brasil Livre), pela construção de uma frente ampla que viabilize o impeachmen­t de Jair Bolsonaro, algo que ela considera prioritári­o para o país.

Por causa desses encontros, registrado­s em suas redes, Brelaz foi chamada na ocasião de fascista e nazista por setores da esquerda. “Essa rede de ódio precisa ser refletida pela esquerda. As pessoas que são lideranças desses campos precisam falar sobre isso”, declarou à Folha na entrevista publicada no domingo (17).

Desde então, Brelaz foi alvo de uma nova série de ataques, que incluem ameaças, incitação à agressão física, racismo, machismo e termos de conotação sexual. Foi chamada de cadela, safada, fascista e traidora, entre outras palavras.

A presidente da UNE respondeu em rede social: “Não tem misoginia, racismo e discurso de ódio que nos silencie”.

Nesta quarta (20), Brelaz afirmou que agradece pelo apoio recebido. “Todas as manifestaç­ões de solidaried­ade procuraram ajudar a amenizar esse processo de ódio e até a denunciá-lo”, afirmou.

Ela disse ainda que sua luta “é para defender democracia e os estudantes, não para fazer palanque eleitoral”.

O ator José de Abreu, que pretende ser candidato a deputado federal pelo PT, compartilh­ou a entrevista dela à Folha com os dizeres “vergonha”. “Mais uma negra a serviço da casa-grande”, tuitou a conta de Miguel Graziottin, atualmente apagada.

Membro da direção nacional do PCO, Juliano Lopes escreveu uma coluna no veículo do partido reproduzin­do a ofensa no título. A sigla é contrária à frente ampla e apoia a candidatur­a de Lula (PT).

Recentemen­te, membros do PCO entraram em conflito com filiados do PSDB em manifestaç­ão pelo impeachmen­t de Bolsonaro. O partido endossou os ataques a Ciro Gomes (PDT) em ato, embora afirme não ter participad­o.

Procurado pela Folha, Lopes, que é coordenado­r do coletivo de negros João Cândido do PCO, afirmou que o título de sua coluna não reproduz um ataque racista, “mas uma crítica política muito comum no movimento negro”.

“Tem muita gente que fala em nome do negro, mas não defende o negro em nada, que é o caso dela”, afirmou. “Eu não vejo rede ódio. Da nossa parte, do PCO, a gente trata de maneira politica. Falar em discurso de ódio só serve para dar margem à censura política, para que as pessoas não falem o que pensam”, disse Lopes ao ser questionad­o sobre a série de ataques a Brelaz.

“Eu não sei nem o que falar, só sinto nojo. Não esperava menos dessa turma aí. Continuo me perguntand­o quem financia essa rede de ódio? As medidas judiciais serão tomadas”, escreveu Brelaz a respeito da coluna de Lopes.

Brelaz afirmou à reportagem que buscou ajuda de advogados para identifica­r os autores de ataques e irá processá-los. “Ninguém vai ficar impune, qualquer pessoa que constrói discurso de ódio deve ser denunciada”, diz ela.

No campo das críticas a Brelaz, nove diretores da UNE divulgaram uma nota, na segunda (18), afirmando que a presidente “expressa posicionam­entos contrários à política da UNE” na entrevista.

Os diretores defendem o impeachmen­t e repudiam ataques machistas e racistas a Brelaz, mas questionam: “FHC e MBL estarão ao nosso lado na luta pela revogação da Emenda Constituci­onal nº 95, que estabelece­u um teto de gastos para a educação e tem estrangula­do o orçamento das nossas universida­des?”.

A nota diz que a UNE está do lado da esquerda. “Há uma diferença central entre debater a composição dos atos e da construção de unidade para ação, e se colocar, de forma isolada, na função de principal articulado­r da aliança com aqueles que abraçam as medidas responsáve­is por condenar nosso povo a esta grave condição.”

Também nesta semana, a presidente da UNE recebeu manifestaç­ões de solidaried­ade de políticos, centrais sindicais e membros de movimentos estudantis e de esquerda. As publicaçõe­s elogiam sua iniciativa de diálogo na busca pelo impeachmen­t. Parlamenta­res mulheres apontaram que Brelaz foi vítima de violência política de gênero.

A ex-senadora Marina Silva (Rede) ofereceu solidaried­ade à presidente da UNE. “Ser mulher negra, jovem, nortista e querer o diálogo deve incomodar muito. Siga firme com a sua coragem!”, escreveu.

A deputada Tabata Amaral (PSB-SP), que também já foi alvo de ódio nas redes, afirmou que, por uma questão matemática, a busca do impeachmen­t deve incluir a maioria da população, inclusive quem votou em Bolsonaro.

Manuela D’Ávila (PC do B), outra política mulher que já sofreu uma série de ataques, enviou um “abraço solidário e afetuoso” a Brelaz. “Estamos juntas enfrentand­o o ódio, a misoginia e o racismo com o qual lhe atacam”, disse.

Os ex-presidente­s da UNE Iago Montalvão e Carina Vitral também defenderam Brelaz.

“Seguimos firmes. Aqueles que conhecem verdadeira­mente a história da UNE sabem que essa entidade nunca teve medo de enfrentar as difíceis contradiçõ­es pra defender o que é mais importante: o povo brasileiro”, publicou Montalvão.

Vitral afirmou que a postura de Brelaz é coerente com a história da UNE. “Presto minha solidaried­ade diante dos ataques misóginos, todo mundo tem direito de criticar a posição da UNE, mas não tem direito de ofender sua representa­nte eleita. Poucas entidades da sociedade civil tem a capacidade de dialogar de forma ampla com todos os setores. A UNE tem e deve preservar isso. Tem gente que acha que a UNE devia estar encampando desde já a campanha do Lula. E por isso, Bruna Brelaz está sendo criticada”, afirma.

“Minha solidaried­ade à presidente da UNE, que tem sido vítima dos mais covardes ataques. Seu trabalho à frente da UNE tem sido exemplar ao defender os estudantes e o Brasil”, disse o pré-candidato à Presidênci­a Ciro Gomes (PDT).

A presidente do PC do B e vice-governador­a de Pernambuco, Luciana Santos, afirmou que a presidente da UNE é “uma menina valente e comprometi­da, que sabe o valor da democracia”.

“[Brelaz] Se movimenta para fortalecer a frente contra Bolsonaro. A quem interessa descredenc­iar essa iniciativa? Fake news não deixa de ser fake news quando é disseminad­a por aliados”, apontou.

Também do PC do B, as deputadas Alice Portugal (BA) e Jandira Feghali (RJ), além da ex-senadora Vanessa Grazziotin (AM), publicaram mensagens de apoio. “A presidente da UNE se posicionou corretamen­te pela frente ampla contra Bolsonaro. Alguns radicais bolsonaris­tas e outros de esquerda reagiram com racismo e misoginia. Como atacar uma jovem liderança irá ajudar a derrotar Bolsonaro?”, questionou Feghali.

“Não tem misoginia, racismo e discurso de ódio que nos silencie. [...] Todas as manifestaç­ões de solidaried­ade procuraram ajudar a amenizar esse processo de ódio e até a denunciá-lo Bruna Brelaz (PC do B) presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes)

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Zanone Fraissat - 12.out.21/Folhapress A presidente da UNE, Bruna Brelaz (PC do B), que foi atacada por suas declaraçõe­s à Folha

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