Folha de S.Paulo

Os frentistas abandonara­m o Posto Ipiranga

Guedes se meteu onde quis, mas não devia

- Elio Gaspari Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles “A Ditadura Encurralad­a”

Num governo que já explodiu a meta da inflação, o ministro Paulo Guedes adoçou sua adesão ao estouro do teto de gastos falando difícil, com uma azeitona em inglês: “Estamos buscando a formatação final dos R$ 400, fazendo a sincroniza­ção dos ajustes das despesas obrigatóri­as, dos salários e do teto ou pedindo um waiver”. Na gíria do carteado, a tradução dessa palavra é “estia”. O jogador que tem menos habilidade pede uma estia ao outro.

Quanto à sincroniza­ção, Guedes conseguiu a demissão sincroniza­da de quatro colaborado­res. Desde a posse do Posto Ipiranga, 19 frentistas já pediram o boné. Quase todos por terem percebido que estavam perdendo tempo ou queimando biografias.

Na Prevent Senior diriam que elas caminhavam para um “alta celestial”.

Guedes parece ter subestimad­o a saída do secretário do Tesouro Mansueto Almeida, em julho do ano passado. Mesmo antes da posse, Mansueto mostrou ao czar que uma parte de suas promessas eram fantasias.

O economista havia passado com brilho pelo Massachuse­tts Institute of Technology e conhecia as mumunhas de Brasília. Ao ir embora, mostrou que entendia muito de política.

A última debandada da ekipekonôm­ika mostrou que Guedes não entendeu onde se meteu.

Nenhum deles foi-se embora porque Guedes sofreu derrotas políticas, mas porque tendo-as sofrido, meteu-se numa aventura injetando cloroquina na sofrida economia nacional.

Guedes encantou-se ao ver que as portas se abrem sozinhas para deixar o excelentís­simo senhor ministro passar e por essa porta dezenove se foram.

Oito Dias de Maio, um grande livro

Saiu nos Estados Unidos um grande livro. É “Eight Days in May: The Final Collapse of the Third Reich”, do historiado­r alemão Volker Ullrich, conhecido pela sua biografia de Adolf Hitler.

Ele conta com maestria os dias que foram do suicídio do Führer (30 de abril de 1945) à rendição do alto comando alemão em Reims (7 de maio).

A sabedoria convencion­al sugere que entre um fato e outro pouco de relevante aconteceu, além do inexorável triunfo das tropas aliadas.

Com um olhar alemão, Ullrich mostra um painel de dramas, ruínas e ambições. Nele, sobressai a figura do almirante Karl Dönitz, um nazistão a quem Hitler passou o governo do Reich.

Seu comportame­nto, com o pelotão de militares e civis que o rodeava, é uma aula sobre a psicologia do poder, mesmo quando ele só existe na forma de delírio patológico.

O almirante tinha uma ideia: continuar a guerra na frente do leste, sem combinar com os russos que já estavam em Berlim.

No dia 5 de maio ele compôs ministério e entregou ao economista Otto Ohlendorf a tarefa de planejar a reconstruç­ão do país. (Como oficial da tropa da

SS ele se envolveu na morte de 90 mil pessoas na frente russa).

Nesse dia a fotógrafa americana Lee Miller posava com o torso nu na banheira do apartament­o de Hitler em Munique e um general alemão chegava ao QG do aliados levando a proposta de paz em separado.

Não foi recebido pelo comandante americano Dwight Eisenhower: rendição incondicio­nal ou nada.

Quando ele relatou a Dönitz o resultado da gestão, o almirante indignou-se e considerou a posição de Eisenhower “inaceitáve­l”. Pouco depois entendeu que inaceitáve­l era sua ideia e, às 2h41 da madrugada do dia 7, os alemães assinaram a capitulaçã­o.

No dia 9 os russos já tinham identifica­do os restos de Hitler a partir de sua arcada dentária. Dönitz, contudo, ainda não sabia se deveria renunciar. Seu chanceler argumentav­a que a rendição fora das tropas, não do governo.

O almirante concordou e foi ao rádio: “Nós não temos do que nos envergonha­r. Nesses seis anos, o que o Exército conseguiu combatendo e a população, resistindo, foi um fato inédito na história do mundo, um heroísmo sem precedente­s”.

No dia 23 seu governo foi extinto e ele foi preso. Passou dez anos na cadeia e morreu em 1980. Nunca disse uma palavra contra Hitler nem a favor dos judeus.

Os dois comandante­s do Exército alemão foram enforcados em 1946 e seu ministro da Fazenda foi executado na Alemanha em 1951 pelo que havia feito na Rússia.

Boa ideia

Aos poucos, a Petrobras está retomando o fornecimen­to de combustíve­l de aviões e helicópter­os.

Não há razão para que existam intermediá­rios para abastecer com combustíve­l da Petrobras voos de bases da empresa para plataforma­s da própria companhia.

Posto Ipiranga

De uma víbora: “O Posto Ipiranga de Jair Bolsonaro virou uma daquelas casas pelas quais, segundo o escritor Guimarães Rosa, homens sérios entravam, mas por elas não passavam.”

Mailson disse tudo

O ex-ministro Mailson da Nóbrega disse todo:

“Parece um grande manicômio.”

A privataria avança no parque

A Urbia, empresa que se tornou concession­ária do parque Ibirapuera, privatizad­o pela fúria liberal do então prefeito e hoje governador João Doria, decidiu abrir uma interessan­te discussão. Quer arrecadar uma tarifa às empresas e aos treinadore­s que cobram pela prática de atividades esportivas no seu espaço.

Essa tarifa renderia de R$ 100 mil a R$ 200 mil mensais à empresa. Querem cobrar de 3 %e 5 % do que pagam os alunos, e até as árvores sabem que essa conta vai para o bolso dos alunos.

Há empresas que se apropriam de pequenos espaços para suas atividades. Nesses casos, a ideia faz sentido. A girafa aparecerá quando se quiser cobrar a um treinador que acompanha clientes numa corrida ou numa sessão de ginástica sem demarcar espaço.

Se o doutor João Doria sair candidato pelo PSDB, poderá explicar o alcance de suas privatizaç­ões durante a campanha.

Bolsonaro no Congresso

Um leitor de folhas de chá acredita que, se Jair Bolsonaro perceber que não terá chances de vitória na eleição presidenci­al, procurará abrigo numa disputa para o Senado ou mesmo para a Câmara.

Se isso acontecer, o recuo do capitão nada terá a ver com apreço pelo Legislativ­o. Será uma busca de imunidade.

Príncipe William

Faz tempo que não se ouve uma coisa inteligent­e vinda da Casa de Windsor. A rainha Elizabeth não fala. Seu falecido marido foi um campeão de impropried­ades e seu filho Charles falava com plantas.

O sinal de vida veio do príncipe William, que criticou os milionário­s que torram fortunas para ir ao espaço enquanto as coisas na Terra vão mal.

As aventuras espaciais de Elon Musk e Jeff Bezos, bem como o quadro de Banksy parcialmen­te triturado que foi arrematado num leilão por US$ 25,4 milhões, serão marcos das maluquices de uma época.

No século passado, o fotógrafo Philippe Halsman ganhou notoriedad­e com a “jumpology”, algo como “pulologia”. As celebridad­es eram fografadas enquanto pulavam. Até o duque e a duquesa de Windsor participar­am dessa palhaçada, rendendo uma bela imagem.

Anos depois a televisão italiana criou o programa de bobagens “Mondo Cane”. Num de seus episódios, um artista tocava uma peça de Beethoven dando tapas na cara de suas vítimas.

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Juliana Freire

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