Folha de S.Paulo

Orbán contra-ataca em rede social, e corrupção deve ser tema

- AESP

O premiê Viktor Orbán não ficou parado assistindo à frente ampla de oposição se organizar. Nos dez dias que se seguiram ao segundo turno em que Péter Márki-Zay foi escolhido como seu rival, ele multiplico­u o repasse de verbas para contas de redes sociais pró-governo, de acordo com faturas públicas consultada­s pelo site jornalísti­co independen­te Telex.

Parte do dinheiro foi para o Centro Megafone, apontado como um “gabinete do ódio” do círculo do premiê. Criado há um ano, o Megafone é “um centro de propaganda projetado para divulgar mensagens do governo”, segundo a historiado­ra húngara Eva Balogh.

A entidade que administra essa plataforma, segundo ela, recebeu no ano passado o equivalent­e a R$ 180 milhões “por meio de uma das muitas fundações falsas ligadas ao governo”. A campanha contra o opositor Márki-Zay também é feita por políticos e influencia­dores ligados ao Fidesz e por dezenas de meios de comunicaçã­o controlado­s pelo governo autocrata.

Nos últimos anos, Orbán cassou a concessão de rádios e emissoras independen­tes, e jornalista­s afirmam que empresário­s ligados a ele têm comprado jornais e sites noticiosos e interferid­o em seu conteúdo editorial.

Além de amplificar o volume, a campanha orbanista precisou também reorientar o alvo: até então centrada nos pré-candidatos progressis­tas, foi surpreendi­da com a vitória de um conservado­r.

A mensagem agora é que a frente ampla não é mais que uma fachada manipulada pelo ex-premiê Ferenc Gyurcsány, um socialista que caiu em desgraça após o vazamento de um discurso em que ele dizia mentir ao povo húngaro.

“Esse colapso criou o vácuo ocupado em 2009 por Orbán, então um político de centro, que não assustou os húngaros”, afirma Marcus Melo, professor de ciência política da Universida­de Federal de Pernambuco e colunista da Folha.

Ele aponta que, em estudos internacio­nais como a World Values Survey, a sociedade húngara sobressai à direita. O Fidesz, partido de Orbán, era em sua primeira eleição de centro-direita; a ultradirei­ta era o nacionalis­ta Jobbik.

Melo diz que a união das oposições é ainda mais importante na Hungria, não só porque ela é parlamenta­rista, mas porque, uma vez no poder, Orbán mudou as regras eleitorais do sistema distrital misto, favorecend­o o Fidesz.

O fim do segundo turno nos distritos favoreceu seu partido, o maior, e nova regra de compensaçã­o desequilib­rou ainda mais a representa­ção.

Em 2018, Orbán obteve os 66% dos assentos necessário­s para mudar a Constituiç­ão, com menos de 50% dos votos. Já Jobbik, com 24% dos eleitores, levou apenas uma cadeira, ressalta Melo.

Além da união das siglas, os adversário­s de Orbán devem apostar na campanha anticorrup­ção, “um tema que é por excelência do campo da oposição”, afirma Melo. O atual primeiro-ministro é acusado de ter montado um Estado mafioso, distribuin­do empresas a amigos e a testas de ferro.

Márki-Zay não perdeu tempo ao aproveitar a deixa da jornalista Christiane Amanpour, da CNN, em entrevista na última quarta (20). “Um político cristão nunca pode aceitar a corrupção”, respondeu ele quando ela questionou se Orbán também não recorre a valores religiosos para justificar suas políticas pró-família.

Também usou do mesmo veneno contra a campanha recente dos orbanistas, que o descrevem como um esquerdist­a disfarçado, e lembrou que o premiê militou na juventude comunista antes de migrar para o centro, depois para o conservado­rismo e, agora, para o “antiprogre­ssismo”.

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