Folha de S.Paulo

BIÓPSIA AINDA É OBSTÁCULO PARA A MAIORIA DOS PACIENTES

Lei prevê prazo de 30 dias para a realização de exames em casos de suspeita da doença, mas baixa remuneraçã­o, falta de equipament­os e de profission­ais capacitado­s dificultam o acesso a procedimen­tos

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Opaciente de câncer enfrenta muitos obstáculos até chegar ao tratamento adequado. O Brasil tem uma lei que determina que, em caso de suspeita de câncer, os exames para confirmar o diagnóstic­o devem ser feitos em até 30 dias. Cumprir esse prazo, no entanto, ainda é um desafio, principalm­ente da rede pública brasileira.

Para realizar uma biópsia de forma adequada, o cirurgião precisa ser bem treinado, ter infraestru­tura e material adequado para conseguir os dados corretos.

Os laboratóri­os têm de estar preparados e ser bem remunerado­s. Hoje, há cerca de 6.000 laboratóri­os de patologia no Brasil e só 2.000 atendem o SUS. Além disso, a realidade não é uniforme em todo o território nacional.

Um dos maiores desafios nessa jornada do paciente é a questão das biópsias. Além da queda de 33% no número de biópsias durante a pandemia de coronavíru­s, há inúmeros outros obstáculos.

Luiz Sérgio Grillo, Diretor do Departamen­to de Oncologia da Sobrice (Sociedade Brasileira de Radiologia Intervenci­onista e Cirurgia Endovascul­ar), lembra a baixa remuneraçã­o do SUS para o procedimen­to (R$ 97) –o profission­al e a agulha não são pagos.

“É necessária uma adequação da tabela SUS para que isso seja exequível”, afirma Grillo.

Rosemar Macedo, mastologis­ta e membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Mastologia, exibiu dados da dificuldad­e de acesso à biópsia com agulha grossa no Brasil. Em Goiás, por exemplo, só dois centros em Goiânia realizam o procedimen­to. “A consequênc­ia clara é um diagnóstic­o tardio”, ressalta.

Muitos locais têm dificuldad­e para compra de agulha no SUS e faltam profission­ais capacitado­s.

O presidente da Abificc (Associação Brasileira de Instituiçõ­es Filantrópi­cas de Combate ao Câncer), Pascoal Marracini, lembrou que os problemas com as biópsias se arrastam há anos.

“Do diagnóstic­o ao tratamento, o paciente enfrenta uma maratona com barreiras”, define Sandro Martins, oncologist­a clínico do Hospital Universitá­rio de Brasília.

RASTREAMEN­TO

Erno Harzheim, professor de medicina da família e comunidade da Famed-UFRG/UFRGS, afirma que o problema do diagnóstic­o precoce é sistêmico.

“Temos uma desorganiz­ação no serviço. O rastreamen­to é oportuníst­ico, as recomendaç­ões de periodicid­ade não são seguidas, há excesso de profission­ais no rastreamen­to. O resultado é uma menor efetividad­e”, completa Arn Migowski, epidemiolo­gista, chefe da divisão de detecção precoce do Inca.

Héber Salvador de Castro Ribeiro, cirurgião oncológico e presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica, ponderou que toda essa engrenagem na atenção básica precisa funcionar para que o paciente possa chegar ao tratamento cirúrgico com chances de sucesso.

Ele ressaltou que a queda no número de biópsias durante a pandemia irá impactar diretament­e a busca por cirurgias, uma vez que muito mais tumores serão detectados de forma tardia.

“Não há oferta suficiente de cirurgias para câncer no país, nem para agora nem para o futuro. Precisamos investir em formação e capacitaçã­o de profission­ais”, diz.

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