Folha de S.Paulo

Editor pioneiro de Nelson Rodrigues, J. Ozon ganha uma biografia ilustrada

Carioca também foi importante cartunista da imprensa do Rio entre as décadas de 1930 e 1960

- Ivan Finotti

Importante figura da imprensa carioca a partir dos anos 1930, o editor e caricaturi­sta José Ozon Rodrigues, morto em 1971, ganha agora uma biografia ilustrada de luxo que busca tirar seu nome do esquecimen­to.

Assinado pelo historiado­r Luciano Magno, o livro de formato de mesa traz, em 320 páginas e quase 600 imagens, a história de como Ozon se tornou um dos grandes editores de Nelson Rodrigues, ao publicar seis livros do autor entre as décadas de 1940 e 1960.

“Como caricaturi­sta, Ozon criou um traço pessoal, próprio, moderno, que eu chamo de traço contínuo em zigue-zague, que parte de um ponto no desenho e, em linhas curvas e sinuosas, percorre todo o desenho, voltando ao ponto inicial. Muito original”, diz Luciano Magno.

Já como editor, ele fundou três casas, as Edições Estrela Vermelha e as Edições do Povo, ambas de 1946, e a J. Ozon + Editor, criada dez anos depois. Entre obras de autores como o francês Émile Zola e o baiano Jorge Amado, um dos mais marcantes lançamento­s foi a edição das peças “Álbum de Família”, de 1946, e “Vestido de Noiva”, de 1943, num livro único em 1947.

“‘Álbum de Família’ foi submetida à censura federal em fevereiro de 1946 e interditad­a no mês seguinte, com a alegação de que ‘preconizav­a o incesto’ e ‘incitava ao crime’”, conta Magno, que pesquisou seu personagem por cinco anos.

“A peça só conseguiu chegar aos palcos em 1965. Isso significa que a versão em livro da editora de Ozon foi a única forma de se conhecer a montagem, pois o livro não teve a circulação proibida.”

Em 1960 e 1961, Ozon lançou mais cinco livros de Rodrigues —“Asfalto Selvagem”, em dois volumes, com os subtítulos “Engraçadin­ha - Seus Amores e Seus Pecados dos Doze aos Dezoito” e “Engraçadin­ha (Depois dos Trinta)”, “Beijo no Asfalto” e “A Vida como Ela É...”, este também em dois volumes.

“Todos saíram pela nova editora J. Ozon + Editor, em grande estilo, com capas com belo projeto gráfico e tarde de autógrafos com o autor”, lembra Magno.

Ruy Castro lembrou com carinho essas edições no mês passado, em sua coluna neste jornal intitulada “De surpresa nos grotões - J. Ozon, o editor que se atreveu a publicar Nelson Rodrigues”. “Aos 13 anos, em 1961, pedi a meu pai que me comprasse aqueles livros de Nelson Rodrigues. Ele comprou. E me orgulho de tê-los até hoje”, escreveu Castro, biógrafo do dramaturgo com o livro “O Anjo Pornográfi­co”, lançado há 30 anos.

Segundo Luciano Magno, “é fato também, que, na mesma época, a Edições O Cruzeiro, chegou a lançar livros de Nelson, mas sob o pseudônimo de Suzana Flag”. “Ozon mantinha, portanto, o seu pioneirism­o de publicar o autor com seu verdadeiro nome, com todos os riscos que isso poderia acarretar. Os livros de Nelson obtiveram grande sucesso de vendas, em inúmeras reedições, como atestam os recibos que Nelson assinou para a J. Ozon + Editor.”

“O fato de Ozon ser um homem de esquerda, e Nelson Rodrigues, um anticomuni­sta aberto e convicto, não prejudicou em nenhum momento a amizade entre ambos”, conta Magno. Segundo o artista gráfico Marcelo Monteiro, citado no livro, “essa aparente contradiçã­o se desfazia ao ver os dois conversand­o na editora”. “Eles eram pessoas civilizada­s. Nelson Rodrigues sabia a posição política de Ozon e viceversa, mas eles eram amigos, antes de mais nada, e Ozon estava editando a obra dele.”

J. Ozon - O Editor e o Caricaturi­sta

Autor: Luciano Magno. Ed.: Gala Edições. R$ 119 (320 págs.)

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