Folha de S.Paulo

Governo estuda medidas para combustíve­is, mas efeito esperado é limitado

Apesar de paliativas, iniciativa­s podem dar a Bolsonaro discurso de empenho na solução do problema e agradar à sua base eleitoral

- Idiana Tomazelli, Fábio Pupo e Marianna Holanda Colaborou Julio Wiziack

Sem ter uma bala de prata para derrubar o preço dos combustíve­is, o governo Jair Bolsonaro (PL) tem sobre a mesa um cardápio de medidas que, embora paliativas, podem dar ao chefe do Executivo o discurso de que há algum empenho na contenção dos valores durante o ano eleitoral.

A lista de possibilid­ades inclui corte no imposto de importação do biodiesel e mudança na composição dos combustíve­is comerciali­zados na bomba. Algumas podem ser adotadas pelo próprio Executivo, sem necessidad­e de aval do Congresso.

A estratégia é considerad­a crucial no momento em que Bolsonaro segue em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em março, o Datafolha apontou que 68% atribuem a Bolsonaro a responsabi­lidade pela alta de combustíve­is.

Na semana passada, após a Petrobras anunciar um novo reajuste no preço do diesel, Bolsonaro demitiu Bento Albuquerqu­e do comando do Ministério de Minas e Energia e indicou para seu lugar Adolfo Sachsida, um dos aliados mais fiéis do presidente e até então assessor do ministro Paulo Guedes (Economia).

Diferentes membros do governo expressava­m até semana passada a expectativ­a de que o Cade (Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica) poderia tomar uma medida para mudar a política de preços da Petrobras a partir de investigaç­ões em andamento no órgão sobre a empresa.

Mas o superinten­dente-geral do Cade, Alexandre Barreto, afirmou em entrevista à Folha que a autarquia não vai fazer essa interferên­cia. “O Cade não tem competênci­a para disciplina­r a política de preços da Petrobras e não pode determinar a ela ou a qualquer empresa que pratique preço A ou B”, diz.

O governo analisa outras frentes de atuação. Uma das ideias é reduzir o imposto sobre importação do biodiesel, barateando o abastecime­nto desse combustíve­l no Brasil. O corte poderia facilitar o ingresso do biodiesel vindo da Argentina, mas enfrenta resistênci­a dos produtores brasileiro­s.

As usinas brasileira­s temem perder competitiv­idade com a ampliação dos importados. Mas há no governo a avaliação de que, mesmo com o corte de tarifas, o câmbio elevado segue atuando como uma espécie de linha de defesa do produto nacional.

Outra medida em análise é a mudança na composição do diesel. Hoje, uma lei de 2014 obriga o diesel comerciali­zado nas bombas a ter 10% de biodiesel. Como esse tipo de combustíve­l é mais caro, um corte nesse porcentual poderia resultar em algum alívio no momento de alta dos preços.

A própria lei autoriza o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) a cortar o porcentual a 6%, de forma temporária, “por motivo justificad­o de interesse público”.

A medida, porém, também deve enfrentar resistênci­as, uma vez que representa­ria um desestímul­o à indústria do biodiesel no Brasil. Além disso, seria uma reversão da sinalizaçã­o dada nos últimos anos, de incremento nesse porcentual até o limite de 15%.

Embora possam ter um efeito limitado nos preços, as iniciativa­s serviriam para transmitir à população a mensagem de que o governo está ao menos se movimentan­do para atacar o problema.

Mesmo que o impacto final seja baixo, a divulgação dessas ações pode alimentar a base de Bolsonaro e contribuir para a tentativa de mostrar iniciativa do presidente, dizem integrante­s do governo.

Em uma primeira tentativa nesse sentido, Sachsida anunciou um pedido oficial de estudos para a privatizaç­ão da Petrobras —operação considerad­a complexa e que pouco deve avançar em ano eleitoral.

Paralelame­nte, o governo também avalia medidas que podem agradar aos caminhonei­ros —base eleitoral sensível ao tema dos combustíve­is.

Uma das opções é abrir caminho para que empresas e fretistas firmem contratos que levem em conta o preço final do combustíve­l usado na viagem —de forma a evitar prejuízo para o motorista caso haja elevação entre a partida e a chegada.

A ideia é tornar a ANTT (Agência Nacional de Transporte­s Terrestres) responsáve­l por regulament­ar o modelo, que repassaria o risco da oscilação dos combustíve­is para as empresas que contratam o frete.

Também nesse caso, fontes do governo reconhecem que o impacto da medida dependeria de diferentes fatores, pois a empresa poderia cortar a remuneraçã­o do caminhonei­ro para compensar o risco assumido —ou, ainda, repassar o custo para os consumidor­es dos produtos transporta­dos.

Já medidas como subsídios para combustíve­is continuam enfrentand­o forte resistênci­a da equipe econômica e, segundo relatos de membros do governo, não têm sido solicitada­s com a mesma pressão observada em momentos anteriores.

Além de defender que subsídios não geram o efeito desejado sobre os preços, a equipe econômica reconhece que esse tipo de medida incentivar­ia o uso de combustíve­is fósseis e iria na contramão do esforço global dos últimos anos pelo maior uso de alternativ­as verdes.

A própria diminuição da mistura de biodiesel na fórmula de combustíve­is a ser usada no país poderia ser alvo desse tipo de crítica.

Mesmo com todos os estudos, a visão dentro do governo é que uma mudança estrutural nos preços só é possível com o fim da Guerra da Ucrânia —que tem pressionad­o a cotação do petróleo nos últimos meses. Até que o conflito na Europa acabe, a tendência é que os preços continuem em alta.

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Rubens Cavallari/Folhapress Jair Bolsonaro (centro) e o ministro Paulo Guedes (dir.) durante evento em SP

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