Folha de S.Paulo

O fósforo e o incêndio

- Bruno Boghossian

Jair Bolsonaro organizou uma blitz judicial contra Alexandre de Moraes. O presidente inaugurou a sequência de investidas no início da semana, ao acionar o STF para acusar o ministro de abuso de autoridade. Derrotado, pediu uma investigaç­ão a seus camaradas da Procurador­iaGeral da República e preparou uma ofensiva em cortes internacio­nais.

Não deve haver um único bolsonaris­ta na órbita do Palácio do Planalto que acredite no sucesso da operação. O presidente tentou acender um fósforo dentro dos tribunais, mas seu objetivo principal é causar um incêndio do lado de fora.

Bolsonaro trabalha há tempos para agitar suas bases contra Moraes. O ministro, afinal, personific­a os dois principais receios do presidente nesta reta final de mandato: perder a eleição e ver seu grupo político na mira da polícia. Ao fazer um lance judicial com uma perspectiv­a quase certa de derrota, ele busca passar a mensagem de que será preciso levar a briga para outro foro.

Quem deu voz à formulação bolsonaris­ta foi o filho mais velho do presidente. Em entrevista ao SBT, Flávio Bolsonaro indicou que o clã não tem muito interesse em buscar os tribunais em seu plano para contestar o resultado da eleição. “Você judicializ­a para quem? Para eles próprios?”, questionou.

Tradiciona­lmente vendido como o integrante moderado da família, Flávio mostrou que conta com um certo tumulto a favor do presidente. “O que vai acontecer eu não sei. Mas é óbvio que isso está gerando uma revolta numa parcela consideráv­el da população”, disse. “É possível, sim, que haja uma instabilid­ade política no país. Não estou pedindo isso, tá? Não estou incentivan­do isso.”

De acordo com essa lógica, perder nos tribunais pode ser um ótimo negócio. Além de reforçar a impressão de que há um inimigo com nome e sobrenome, Bolsonaro também lança para seus apoiadores a ideia de que há uma má vontade quase conspirató­ria contra ele nos tribunais, impossível de ser superada seguindo as regras do jogo.

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