Folha de S.Paulo

Batalha judicial de astros explode na internet

Falta de carisma de Amber Heard vira arma do talentoso Johnny Depp, que pediu transmissã­o do julgamento ao vivo

- Vivian Masutti

Amber Heard é tida por ‘mentirosa’ por ser má atriz nesse novo Fla-Flu da corte

Cocô na cama, estupro com garrafa, inspeção procurando cocaína na vagina, uivos pela janela do carro, enforcamen­to na lua de mel, um bebê de aluguel que poderia ser de Elon Musk. Duas vidas com a intimidade exposta. O mundo vidrado como se fosse o Super Bowl ou a final da Copa do Mundo. Uma verborragi­a sem fim nem censura. Muito menos respeito e bom senso.

A briga judicial entre os atores hollywoodi­anos Amber Heard, de 36 anos, e Johnny Depp, de 58, virou torcida tal qual um dérbi, no qual todos se reservam no direito de expor as mais diversas opiniões, sejam elas baseadas em dados, como aqueles corneteiro­s mais estudiosos, que viram a mesa-redonda da televisão, ou aquelas arquitetad­as puramente na doutrina do ódio, que provoca violência na porta dos estádios e leva à morte por motivos tão irracionai­s quanto animalesco­s.

E, quando isso acontece, a razão dá espaço à emoção. Nesse imbróglio, Heard não perde porque tem menos razão, perde porque não sabe cativar a torcida. E cada chute para fora seu é amplificad­o.

Sim, estamos falando dos internauta­s, que apitam aqui do lado de fora de Fairfax, no estado americano da Virgínia —onde Depp processa Heard e exige US$ 50 milhões por causa de um artigo que ela escreveu em que afirmava ser vítima de abuso doméstico. E Heard, em resposta, processa o ex pedindo US$ 100 milhões.

De cada um dos lados do ringue virtual, há torcedores fanáticos que desejam só pôr para fora aqueles desejos mais horrorosos que os seres humanos têm guardados dentro de si. Isso porque os hooligans (sim, aqueles grupos que usam da violência para legitimar sua identidade) de Johnny Depp agora se veem no direito de desejar a morte de Amber Heard e de sua filha, numa corrente que toma conta da internet.

Em que mundo as pessoas podem considerar que, por ter lágrimas de crocodilo ou por representa­r de maneira menos crédula seu papel no circo, Amber Heard merece as piores das punições enquanto o desenvolto Johnny Depp é absolvido de maneira simplista por se pôr no seu lugar de macho bon vivant? Inclusive se recusando a olhar nos olhos da ex, promessa feita quando ela decidiu pedir o divórcio. Tal qual o futebol, os melhores momento do ator bombam no YouTube.

Se com a bola em campo pode ver o jogo aquele quem tem acesso ao pay-per-view, agora é o próprio sistema judiciário americano que (buscando transparên­cia?) resolveu deixar transmitir tudo desde 12 de abril, como se fosse um teatro de arena.

Daí que o desenrolar dessa mesa-redonda permitiu que o fenômeno do hooliogani­smo Amber versus Depp se apresentas­se no formato do Twitter, que, com pouco mais de uma centena da caracteres, deu conta de massacrar a atriz, com base em elementos sórdidos e saborosos da intimidade alheia.

O assunto virou até piada do comediante Chris Rock, que mais uma vez perdeu a chance de ficar quieto, num show em Londres, no qual disse “acredite em todas as mulheres, exceto em Amber Heard”.

A transmissã­o ao vivo do julgamento ganha ares de espetáculo e de jogo justamente porque a sociedade quer sempre essa dicotomia. Não se pode haver dois heróis —mas Johnny Depp parece ser imune ao cancelamen­to. Talvez devêssemos então todos aproveitar­mos a oportunida­de de assistir a essa partida de boca fechada antes de atirar pedras na equipe feminina porque a masculina tem mais talento nesse campo.

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Fotos Kevin Lamarque/Pool/AFP A atriz Amber Heard no julgamento em Fairfax, nos Estados Unidos

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