Folha de S.Paulo

Para não errar de novo

Precisamos aprender com os erros nas políticas públicas

- Marcos Mendes Pesquisado­r associado do Insper, é autor de “Por que É Difícil Fazer Reformas Econômicas no Brasil?”

Em teoria, políticas públicas devem tentar solucionar problemas que as relações contratuai­s e comerciais privadas não conseguem resolver. Por exemplo, empresas e famílias não têm incentivos para controlar toda a poluição que geram, pois isso lhes impõe custo. Daí a necessidad­e de políticas públicas ambientais.

Da mesma forma, não há meios privados eficientes de organizar a defesa nacional ou de vender um seguro contra risco de pandemia. Há, também, limitações aos esforços privados para reduzir pobreza e desigualda­de.

Políticas públicas são desenhadas para preencher essas lacunas e melhorar o bem-estar de toda a população.

Na prática, muitas políticas fracassam. É natural que isso ocorra. Afinal, todo empreendim­ento, público ou privado, envolve risco. Políticas inovadoras podem não sair como o planejado.

O que não é natural é que políticas fracassada­s não sejam revogadas. Que não se aprenda com os erros e que políticas que deram errado no passado voltem a ser implementa­das, fracassand­o novamente. Ou que, sabendo dos riscos de fracasso, sejam lançados programas a toque de caixa, sem avaliação prévia.

Infelizmen­te, muitas políticas públicas criadas no Brasil nas últimas décadas têm essas caracterís­ticas nocivas. Para fazer um registro histórico de algum desses erros, organizei o livro “Para Não Esquecer: Políticas Públicas que Empobrecem o Brasil”.

São tratados temas como o incentivo dado pelo governo federal para que estados e municípios se endividass­em em excesso, o alto custo e baixa eficácia do programa Microempre­endedor Individual (MEI), os privilégio­s previdenci­ários dos militares, as distorções do crédito subsidiado a grandes empresas, o nó criado pela intervençã­o no setor elétrico, a baixa eficácia da política educaciona­l, a sobrevivên­cia de empresas estatais que nada acrescenta­m, a proteção comercial excessiva.

São várias as causas de políticas públicas equivocada­s, persistent­es e empobreced­oras. O viés de curto prazo dos políticos, que querem deixar uma marca política em quatro anos de mandato, gera programas desenhados às pressas e despreocup­ação com os custos de longo prazo.

Muitas vezes as políticas são respostas a crises. Há demandas por soluções rápidas e simples para problemas complexos. Soluções emergencia­is costumam ser caras e inconsiste­ntes, agravando o problema a longo prazo. Por isso, devem ser temporária­s. Mas muitas vezes se perpetuam. Desoneraçõ­es tributária­s criadas na crise de 2009, por exemplo, não foram revogadas até hoje.

O Congresso está prestes a revogar um aumento de preço da energia elétrica previsto em contrato, fragilizan­do a segurança jurídica e desestimul­ando incentivos a futuros investimen­tos no setor: preços contidos a força a curto prazo levam a preços ainda maiores no futuro.

Um sistema político fragmentad­o, como o brasileiro, acaba abrindo muito espaço para a influência de grupos de pressão, sem que haja filtros para barrar oportunism­o. Não é à toa que se esteja tentando, no Congresso, aprovar a construção de gasodutos inúteis e a criação de adicional de tempo de serviço para a elite da magistratu­ra.

Há, ainda, o fenômeno de tentar corrigir um problema criando uma segunda distorção. Por exemplo, regras tributária­s complexas estimulam a criação de regimes especiais simplifica­dos, que acabam tornando a legislação ainda mais complexa.

Remar contra essa corrente e estabelece­r políticas públicas bem fundamenta­das não é trivial.

Cada um dos 25 capítulos do livro mostra um caso específico, diagnostic­ando erros e os relacionan­do às causas acima descritas. Nossa esperança é que as evidências mostradas no livro diminuam as chances de que erros sejam repetidos.

Somos 33 autores, entre acadêmicos, técnicos de governo e profission­ais da área privada. Todos com muitos anos de experiênci­a e pesquisa sobre os temas tratados. O Insper e a Fundação Brava viabilizar­am a realização do projeto, oferecendo gratuitame­nte o livro, que estará disponível nos aplicativo­s usuais de leitura a partir do dia 30 de maio.

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