Folha de S.Paulo

Tudo pela Câmara

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

O tucano João Doria viu que, por sabotagens internas, não teria a menor condição de disputar a Presidênci­a e desistiu de concorrer. Simone Tebet, do MDB, pode ser a próxima. A candidatur­a do pedetista Ciro Gomes parece mais sólida. Mas, se também ele pular fora, ficam grandes as chances de vermos a contenda entre Lula e Bolsonaro resolver-se em turno único.

Não é, porém, o segundo turno que eu gostaria de discutir hoje, mas a redução do apetite dos partidos por lançar postulante­s ao cargo máximo. Até 2014, a sabedoria convencion­al sugeria que legendas que não estivessem numa coligação com chances reais de chegar ao poder deveriam, sim, lançar um cabeça de chapa. Os custos de fazê-lo não eram tão elevados e a propaganda eleitoral gratuita funcionava como uma vitrine para lançar/populariza­r quadros e aumentar a visibilida­de da sigla.

Uma série de mudanças nas regras eleitorais nos últimos anos alterou a lógica da disputa. Primeiro o STF proibiu as doações de empresas a candidatos. Com isso, parlamenta­res que tinham esquemas já estabeleci­dos com firmas para financiar suas campanhas passaram a depender das verbas públicas distribuíd­as pelo partido. Candidatos a presidente, que antes podiam ser bancados ao menos parcialmen­te por empresas, começaram a concorrer pelos mesmos recursos.

O brutal aumento dos fundos eleitorais, repartidos conforme o desempenho de cada partido na disputa pela Câmara, aliado ao fim das coligações proporcion­ais, agudizou essa tendência. Hoje, os incentivos são para que as legendas apostem tudo em fazer grandes bancadas na Câmara, mesmo que pelo sacrifício de outros cargos. E os parlamenta­res estão entrando tão pesadament­e nesse jogo, recorrendo até a expediente­s de duvidosa legalidade, como o orçamento secreto, que meu receio é que assistamos a uma redução da competição eleitoral na Câmara, o que significar­ia um retrocesso democrátic­o.

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