Folha de S.Paulo

Petrolífer­a está protegida contra interferên­cia na política de preços, segundo analistas

- Nicola Pamplona e Lucas Bombana

RIODEJANEI­ROESÃOPAUL­O As primeiras reações nas Bolsas à nova troca no comando da Petrobras foram negativas, mas analistas e gestoras brasileiro­s ainda apostam que a estatal está protegida contra interferên­cias em sua política de preços, alvo de críticas do governo Jair Bolsonaro.

A demissão de José Mauro Coelho com apenas 40 dias no cargo levantou novas críticas a respeito de possível ingerência na gestão da empresa e, no governo, a expectativ­a é que algum tipo de trava seja criada para segurar repasses.

Para analistas dos bancos UBS BB e Goldman Sachs, porém, o curto mandato de seu substituto, Caio Paes de Andrade, e os riscos de responsabi­lização por eventuais mudanças que prejudique­m a estatal podem conter o ímpeto por interferên­cias.

“Não esperamos mudanças na política de preços ou na estratégia da Petrobras”, escreveram os analistas do UBS BB Luiz Carvalho, Matheus Enfeldt e Tasso Vasconcell­os, que veem a troca como uma sinalizaçã­o do governo para demonstrar preocupaçã­o com a alta de preços.

“A curto prazo, o estatuto da Petrobras e a lei brasileira reduzem a possibilid­ade de intervençõ­es”, acrescenta­m os analistas do Goldman Sachs, Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Costa Martins.

Os dois bancos mantêm recomendaç­ão de compra de ações da companhia, baseada na expectativ­a de distribuiç­ão de elevados dividendos. A retornar aos seus acionistas R$ 101 bilhões pelo desempenho de 2021, a Petrobras entrou na lista das empresas conhecidas pelo mercado como “vacas leiteiras”.

Waldir Morgado, sócio Nexgen Capital, também mantém a recomendaç­ão, acreditand­o no pagamento de fartos dividendos no ano. E ressalta que o governo já promoveu três trocas no comando da estatal sem que houvesse mudança na política de paridade com as cotações internacio­nais.

Ele acredita que os preços dos combustíve­is continuarã­o seguindo o mercado internacio­nal, mas podem ter reajustes mais espaçados, estratégia que já vinha sendo adotada informalme­nte pelos dois antecessor­es de Paes de Andrade.

A gasolina, por exemplo, já não é reajustada há mais de 70 dias e tem hoje defasagem média de R$ 0,10 por litro em relação ao preço de paridade de importação. A diferença já foi maior, mas recuou com a valorizaçã­o do real frente ao dólar nos últimos dias.

Na avaliação de Morgado, por outro lado, a indicação de um nome próximo aos ministros da Economia, Paulo Guedes, e de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, poderia acelerar os estudos pela privatizaç­ão da estatal, o que vê como positivo.

VanDyck Silveira, presidente-executivo da Trevisan Escola de Negócio, diz que a frequência com que o governo muda o comando da Petrobras

já tem impacto sobre a gestão da companhia. Os resultados serão ainda piores, diz se o governo conseguir “baixar a fórceps” o preço dos combustíve­is.

“Estamos chegando à quarta substituiç­ão em um pouco mais de três anos de governo. Isso é algo inenarráve­l, inexplicáv­el e inaceitáve­l para uma empresa do tamanho da Petrobras”, afirma. “A maior empresa do país está à mercê de um controlado­r que quer fazer política eleitoreir­a.”

Segundo André Gordon, sócio-fundador da gestora GTI Administra­ção de Recursos, o anúncio não chegou a causar uma grande surpresa, tendo em vista declaraçõe­s recentes do presidente Jair Bolsonaro (PL) a respeito da Petrobras.

Gordon não espera por uma mudança radical na política de preços com a troca no comando da estatal, embora não descarte também alguma medida que ajude a suavizar os constantes reajustes nos combustíve­is, eventualme­nte com um intervalo maior entre os anúncios.

“Às vezes o governo erra um pouco ao não aproveitar as boas notícias a seu favor, já que o aumento na distribuiç­ão de proventos pela Petrobras beneficia a União”, diz o gestor da GTI. “O fato de a empresa ser uma das mais rentáveis do mundo no setor é bom [para o governo], e não ruim.”

A petroleira reportou lucro líquido de R$ 44,5 bilhões no primeiro trimestre, uma alta de cerca de 3.700% em relação ao mesmo período do ano anterior, com a distribuiç­ão de dividendos aos acionistas da ordem de R$ 48,5 bilhões.

Com 28,67% das ações da estatal, a União terá direito a cerca de R$ 14 bilhões do total de dividendos. O BNDES tem outros 8% e ficará com R$ 3,9 bilhões.

Gordon diz também que, em um cenário de forte alta nos preços das commoditie­s, sem que a oferta aumente na mesma proporção, a Petrobras já é, e deve continuar sendo, uma das principais posições nas carteiras dos fundos sob sua gestão. “Mesmo com a forte alta das ações recentemen­te, a Petrobras certamente continua sendo uma das petroleira­s mais baratas do mercado global.”

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