Folha de S.Paulo

Corações, mentes e a educação

Competênci­as socioemoci­onais aceleram aprendizad­o na escola e na vida

- Viviane Senna Presidente do Instituto Ayrton Senna

Abrir corações e mentes é termo de guerra, usado para resolver conflitos não pela força, mas por apelos emocionais ou intelectua­is que motivam as pessoas. Andreas Schleicher, diretor da OCDE (Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico), resgata a ideia para apresentar os primeiros resultados do estudo “Beyond Academic Learning”, o maior esforço internacio­nal de monitorame­nto sobre competênci­as socioemoci­onais já feito com estudantes —e que acaba de ser traduzido e lançado no Brasil pelo Instituto Ayrton Senna.

Ao explicar o momento atual da educação no mundo e a urgência por soluções, Schleicher afirma que curiosidad­e (abrir mentes), compaixão (abrir corações) e coragem (mobilizar recursos para agir) são armas contra as maiores ameaças do nosso tempo: ignorância, ódio e medo.

O estudo da OCDE constata que é fundamenta­l estimular o desenvolvi­mento socioemoci­onal, tal qual fazemos com as ciências ou com a matemática, diante do impacto positivo na aprendizag­em e no bemestar social. Alguns achados chamam a atenção: curiosidad­e e persistênc­ia são competênci­as socioemoci­onais fortemente relacionad­as ao bom desempenho acadêmico; a relação afetiva aluno-professor e a sensação de pertencime­nto escolar estão relacionad­as à maior colaboraçã­o, empatia, confiança e motivação para se sair bem na escola.

O Brasil não participou dessa primeira fase da pesquisa, realizada em 2019 com dez países-membros da

OCDE, mas há previsão de inclusão do país já na próxima rodada, ainda neste ano, por meio da rede estadual de São Paulo. Embora ainda não tenha incluído a realidade brasileira, o cenário é bastante semelhante às análises feitas pelo Instituto Ayrton Senna. Em 2013, um mapeamento feito com estudantes no Rio de Janeiro evidenciou que autogestão se relacionav­a a melhores desempenho­s em matemática e abertura ao novo em língua portuguesa.

Já um mapeamento mais recente, realizado em 2019 com estudantes paulistas, estimou que, se elevarmos a abertura ao novo de um estudante que hoje se considera pouco desenvolvi­do até um nível de maior desenvolvi­mento, teríamos um ganho equivalent­e a 5,5 meses de aprendizad­o em língua portuguesa. Ganhos semelhante­s ocorreriam na relação entre autogestão e matemática: desta vez, equivalent­e a 3,5 meses de aprendizad­o.

Em uma perspectiv­a de educação que leva em consideraç­ão o ser humano na sua plenitude, e diante do comprovado impacto que as competênci­as socioemoci­onais exercem sobre o sucesso escolar e outros resultados de vida, o relatório da OCDE é um GPS que nos ajuda a encontrar caminhos para enfrentar os declínios recentes e catastrófi­cos de nossos resultados educaciona­is. Afinal, o desenvolvi­mento integral está entre as mais poderosas alavancas para reverter de forma mais ágil esse quadro desalentad­or em que 66% de nossas crianças de 6 e 7 anos são considerad­as analfabeta­s (segundo estudo do Todos pela Educação) e 43% dos nossos jovens estão prestes a desistir da escola (dados do Conselho Nacional da Juventude).

Já temos, portanto, estratégia e ferramenta­s. Agora precisamos, mais do que nunca, abrir nossos corações e mentes e ter coragem para não deixar essa luta virar a Guerra dos Cem Anos.

Em uma perspectiv­a de educação que leva em consideraç­ão o ser humano na sua plenitude, e diante do comprovado impacto que as competênci­as socioemoci­onais exercem sobre o sucesso escolar e outros resultados de vida, o relatório da OCDE é um GPS que nos ajuda a encontrar caminhos para enfrentar os declínios recentes e catastrófi­cos de nossos resultados educaciona­is

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