Folha de S.Paulo

Após ‘saudação’ a Tebet, parte da elite econômica prepara manifesto explícito

Grupo se parece com tucanos originais e critica ‘conformism­o’ com disputa polarizada

- Vinicius Torres Freire

Simone Tebet tem recebido apoio de uma certa elite que um dia foi tucana, que fez parte dos governos de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) ou tem as caracterís­ticas do grupo de políticos, intelectua­is, empresário­s e executivos que fundou o PSDB no final dos anos 1980. No partido, esse tucanato está praticamen­te extinto, embora Tasso Jereissati seja um dos adeptos de Tebet e nome preferido para o cargo de vice.

Esse grupo está para lançar uma espécie de manifesto explícito à candidatur­a da senadora de Mato Grosso do Sul, pré-pré-candidata do MDB à Presidênci­a da República. A ideia é, pelo menos, evitar que a eleição seja reduzida muito cedo a duas candidatur­as.

Faz uma semana, pessoas desse grupo lançaram o que chamavam de “saudação” ao nome de Tebet como mais uma opção para a disputa do Planalto. João Doria era ainda pré-candidato do PSDB, e pelo menos alguns organizado­res do manifesto não queriam fechar portas a nomes do que se chamava de “terceira via”.

O “manifesto”, publicado na plataforma Change.org, chamava-se “Vamos Reconstrui­r o Brasil”, tinha nesta quinta-feira (26) mais de 4.200 assinatura­s e foi noticiado pelo jornal O Estado de S.paulo. Lá se lia o seguinte sobre seus autores: “Somos um coletivo em apoio à pré-candidatur­a à Presidênci­a da senadora Simone Tebet”.

O grupo de apoio agora explícito a Simone Tebet não é um “movimento de empresário­s”, como se escreve por aí, até porque tal coisa não existe. Há grupos muito diversos de “empresário­s” (ou financista­s, executivos de grande empresa etc.), por filiação política diversa (como bolsonaris­tas) ou interesses díspares.

Por falar nisso, o grupo prótebet tem ideias muito diferentes daquelas de confederaç­ões ou associaçõe­s patronais maiores do agronegóci­o ou da indústria, por divergênci­as radicais em relação a políticas ambientais ou reformas (o grupo é muito mais liberaliza­nte que o industrial padrão), “costumes” (são liberais) e enfatizam “preocupaçõ­es sociais”.

Além do mais, como diz um ex-presidente de grande banco, em nada ligado ao pessoal pró-tebet, a maioria dos “empresário­s” é “neutra” (ou “omissa ou interessad­a apenas no mero sucesso de seus negócios”, como diz um empresário pró-tebet), não quer associar seu negócio a esta ou aquela candidatur­a. Mais do que isso, essa maioria estaria “conformada” com a hipótese, “politicame­nte realista”, de que a disputa final ficará mesmo entre Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).

No dizer do banqueiro, essa maioria silenciosa espera pelo menos que ocorra um segundo turno. Por qual motivo? Se houver uma segunda rodada de votação, haveria possibilid­ade maior de os candidatos finalistas apresentar­em propostas mais claras e procurarem alianças, políticas, sociais e econômicas. “Fica mais fácil haver algum acordo mais sério sobre o que fazer com o país.”

Um empresário que está na organizaçã­o dos manifestos pró-tebet diz que de seu grupo fazem parte “8 ou 10 grupos de pessoas que conversam pelo Whatsapp ou se encontram em jantares” mais políticos. Diz de modo enfático que trabalham para evitar a ideia de que a eleição está definida e para dar “visibilida­de” a alternativ­as.

Porque não está [definida, a eleição], porque falta ainda muito tempo, porque o povo ainda não começou a pensar a sério em quem vai votar e porque as eleições estão sendo decididas cada vez mais tardiament­e, explica, criticando o “conformism­o” de “muita gente no país, até da mídia e dos jornalista­s” com uma disputa reduzida a Lula e Bolsonaro.

O primeiro texto de simpatia por Tebet teria sido articulado por Teresa Bracher e pela empresária Marisa Moreira Salles. Segundo alguns de seus organizado­res, foi motivado por um jantar em 28 de abril, organizado por Teresa em sua casa (que também é a de seu marido Candido Bracher, expresiden­te do Itaú), em parte por iniciativa de Elena Landau, do movimento Livres, um dia tucana, que fez parte do governo FHC e ora coordena o programa de Tebet.

Nem o primeiro manifesto simpático a Tebet e menos ainda o segundo, de adesão, é um “movimento de empresário­s”, dizem seus organizado­res. Teria, claro e obviamente, “empresário­s”, executivos, gente da cúpula da finança, mas ao lado de ambientali­stas, representa­ntes de povos indígenas, gente da cultura (teatro, cinema), economista­s, cientistas.

Teresa Bracher tem preocupaçõ­es ambientais, milita na causa, por exemplo; Marisa Moreira Salles, entre outros interesses, tem preocupaçõ­es urbanístic­as e com o problema social de moradia. Organizado­res do segundo manifesto pró-tebet dizem que economista­s ou outros profission­ais que trabalhava­m nos programas de Doria e de Sergio Moro estão se juntando ao grupo que apoia a senadora do MDB.

No dizer mais irônico de um financista que deve assinar o segundo manifesto, depois do bolsonaris­mo, está difícil “limpar o nome do liberalism­o” e mais ainda daqueles que se dizem de “direita”. Rindo, ele comenta que é preciso mostrar que existe “gente civilizada no país até na elite econômica”. Falando sério, acrescenta que o debate público, fora do mundo restrito de sempre, está meio morto no país.

Entre os signatário­s do primeiro manifesto estavam Arminio Fraga (que ressalta a diversidad­e do grupo que elaborou o texto, de resto capitanead­o por duas mulheres), a economista Eliana Cardoso, a executiva Maria Silvia Bastos Marques, Landau, o economista e executivo financeiro Henri Philippe Reichstul, o financista Luís Stuhlberge­r, Candido Bracher, Pedro Wongtchows­ki, do grupo Ultra, e Fábio Barbosa, ex-presidente do Santander.

Não raro, era possível ver muitos desses e outros signatário­s do “manifesto” em reuniões no Instituto FHC, ou, até faz um tempo, em reuniões de mães e pais (ou avós) do Colégio Santa Cruz, da elite paulistana, ou do Santo Inácio, do Rio, ou similares. Em uma nota menos pitoresca, vários dos primeiros signatário­s e organizado­res do manifesto simpático a Tebet e do segundo, de apoio explícito, já assinaram outras cartas públicas nos anos de governo Bolsonaro.

Por exemplo, encabeçava­m a carta de março do ano passado em que pediam medidas eficazes e racionais no combate à epidemia (assinada também por Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles, copresiden­tes do Conselho do Itaú Unibanco. Pedro é casado com Marisa Moreira Salles, articulado­ra da carta pró-tebet). Vários do grupo pró-tebet estavam entre os primeiros signatário­s da carta de agosto do ano passado de defesa do sistema eleitoral brasileiro. Organizara­m uma carta entregue a Arthur Lira (PP-AL) em junho de 2021 contra retrocesso­s na área ambiental. Etc.

O grupo pró-tebet já combinou com os russos, com a cúpula do MDB? Boa parte do partido não acredita no sucesso de Tebet ou já se debandou para Lula ou Bolsonaro. Um organizado­r da coisa diz ver “manifestaç­ões positivas” de gente graúda do partido. Outro diz que o movimento “é mais uma coisa sociedade civil”. Em resumo, o contato do grupo com a máquina política do MDB é mínimo.

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Pedro Ladeira - 25.mai.22/folhapress A pré-candidata Simone Tebet (MDB)

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