Folha de S.Paulo

Após derrotas em série, Guedes ganha poder em ofensiva eleitoral

Ministros da ala política veem reequilíbr­io de forças, com Economia reconquist­ando espaço

- Julianna Sofia, Fábio Pupo e Julia Chaib

O ministro Paulo Guedes (Economia) chega à reta final do mandato de Jair Bolsonaro (PL) com mais poder. Após uma sucessão de derrotas e vitórias na execução de uma agenda liberal, ele tem ampliado sua influência no governo se equilibran­do entre o que prega sua cartilha e o esforço para atender às vontades do chefe.

A escolha de dois membros de sua equipe para comandar um tema estratégic­o em 2022 como o dos combustíve­is resume o cenário. Adolfo Sachsida foi para o Ministério de Minas e Energia, e Caio Mario Paes de Andrade foi indicado para o comando da Petrobras.

Nomes de confiança da equipe do ministro, ambos compunham o time de primeira linha de Guedes —Paes de Andrade é o atual secretário especial de Desburocra­tização da pasta, enquanto Sachsida desempenho­u os cargos de secretário de Política Econômica e de assessor especial.

A posição de Guedes hoje —comandando um ministério e com influência direta em outro— é vista por integrante­s do governo ouvidos pela Folha como uma demonstraç­ão de confiança do presidente. Em meio a uma disputa eleitoral histórica, o país passa por um momento desafiador para controlar a inflação, gerar emprego e garantir cresciment­o.

A volta de Guedes à condição de “superminis­tro” contrasta com episódios anteriores. O ministro beijou a lona várias vezes desde que assumiu o posto com a promessa de fazer uma revolução na política econômica.

O economista da Escola de Chicago obteve diferentes conquistas, mas as perdas soaram mais estridente­s em diversos momentos, com sua saída sendo aventada em várias ocasiões —inclusive por ele próprio.

Entre essas derrotas, está o enterro de um imposto nos moldes da antiga CPMF (ideia defendida até hoje pelo ministro), o “cartão vermelho” com que Bolsonaro o ameaçou indiretame­nte caso surgissem ideias como a do congelamen­to de aposentado­rias, uma debandada em sua equipe diante das contradiçõ­es do governo com o discurso liberal e a perda de influência sobre a Petrobras em 2021.

O acúmulo desses episódios fez Guedes deixar parte das convicções de lado para continuar ao lado do presidente.

Em outubro de 2021, ele chegou a aceitar mudanças nas regras fiscais para encaixar no Orçamento o pagamento de R$ 400 do Auxílio Brasil — exigência de Bolsonaro diante da proximidad­e das eleições.

Para executar o plano, colocou em prática uma megaoperaç­ão que demandou uma emenda à Constituiç­ão para driblar o teto de gastos (regra defendida por ele até então). A medida gerou revolta em sua equipe, que sofreu uma debandada.

“[É] perfeitame­nte compreensí­vel. Espero que os mercados compreenda­m isso em vez de ter uma posição um pouco mais infantil de que ‘o símbolo é o teto’, ‘o teto ou a morte’, disse em novembro, para justificar a iniciativa.

Neste ano, novos flertes com medidas inusuais diante da proximidad­e eleitoral. Embora defenda a liberdade de preço da Petrobras, o Ministério da Economia reservadam­ente entende que o momento atual é de exceção e que medidas podem ser adotadas para conter a volatilida­de nas bombas.

A visão é compartilh­ada por diferentes integrante­s da equipe econômica e catapultou dois assessores de Guedes ao comando das decisões sobre combustíve­is. Sachsida, por exemplo, foi escolhido por Bolsonaro após apresentar sugestões de mudanças sobre os preços diretament­e ao presidente (com aval do ministro).

Há várias medidas em estudo, como uma proposta para estabelece­r faixas para o preço internacio­nal do petróleo —sendo que, caso o preço do barril varie dentro dos valores delimitado­s, a empresa não poderia fazer reajustes. Outra sugestão é criar um intervalo mínimo de cem dias para os reajustes.

Seja qual for a opção escolhida, o governo dá indicações frequentes nos bastidores de que quer evitar os reajustes da Petrobras em um momento delicado da corrida eleitoral, em que Bolsonaro sofre desgaste pela inflação enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) amplia a liderança nas pesquisas.

Na visão de integrante­s do governo, seria mais vantajoso para os acionistas da Petrobras se a empresa segurasse os preços agora e arcasse com algum prejuízo do que permitir a volta de Lula. Dentro desse entendimen­to, uma nova gestão petista acabaria com a empresa a partir de 2023.

Na última semana, assessores da Economia brincaram que fariam um “War” da Esplanada, em referência ao jogo de tabuleiro no qual os jogadores precisam avançar sobre território­s. A ideia é mostrar como Guedes conseguiu progredir, sendo sua pasta comparada inclusive a uma escola de formação de ministros.

O ministro tem sido vitorioso, até agora, em segurar a pressão de setores do governo e do Legislativ­o por ideias mais drásticas, como a criação de subsídios para conter a alta do diesel e da gasolina.

A pressão continua entre ministros da área política, com queixas de que as decisões a respeito do tema estão agora muito concentrad­as na mesa de Guedes. Paes de Andrade, oriundo da equipe do ministro, chegou a ser refutado por nomes como Arthur Lira (PP-AL), que havia defendido alguém com mais experiênci­a no setor na primeira vez em que ele havia sido cotado.

Mas tem falado mais alto a percepção no governo, e principalm­ente de Bolsonaro, de que a economia será fator determinan­te na disputa presidenci­al. Isso tem levado o presidente a ouvir mais a área econômica e a circunscre­ver assuntos à pasta de Guedes.

Na ala política, o fortalecim­ento do ministro tem sido interpreta­do como um reequilíbr­io de forças, dado o aumento crescente da influência do centrão nas decisões do governo desde que Bolsonaro se associou ao agrupament­o de legendas em 2020.

Nesse sentido, o movimento para desidratar o centrão tem sido impulsiona­do por militares que orbitam o gabinete de Jair Bolsonaro. Eles passaram a considerar mais os posicionam­entos de Guedes e sua equipe em detrimento das demandas da ala política.

Segundo assessores do Planalto, Guedes tem deixado de olhar para trás —já que fracassou em suas promessas ousadas de privatizaç­ão, abertura econômica e reformas estruturai­s— e passou a focar em planos para um eventual segundo mandato de Bolsonaro.

Esses assessores citam a ideia do ministro de criar um fundo com recursos das privatizaç­ões para atuar na redução da desigualda­de. O ministro vê nisso, inclusive, um argumento matador contra as acusações do PT, de que ele quer entregar recursos públicos para a iniciativa privada —agora, seria para combater a pobreza (em vez de ficar nas mãos de partidos).

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