País tem mais influenciadores que dentistas
Profissão, que não é regulamentada, soma 500 mil em todo o país, com pelo menos 10 mil seguidores cada um
Gente desenvolta em frente às câmeras, na maioria das vezes carismática, que tem pelo menos 10 mil seguidores nas redes sociais. Eles são os influenciadores, que já somam mais de 500 mil só no Brasil, segundo a multinacional de pesquisas Nielsen.
Apesar não ser uma profissão regulamentada, o contingente de influenciadores já supera o de dentistas formados no país: 374 mil, segundo o CFO (Conselho Federal de Odontologia). Também são mais que o dobro do número de arquitetos (212 mil), ultrapassam o total de engenheiros civis (455 mil) e empatam com o de médicos (502 mil).
Por trás dos influenciadores, existe um mercado de agências que desenvolvem esses profissionais e associam sua imagem a marcas de produtos e serviços.
O valor das campanhas nas redes sociais —especialmente no Instagram, mas também no Youtube e no Tiktok— varia infinitamente de acordo com o número de seguidores, o nível de engajamento do público e até a região onde mora o influenciador. Mas, segundo agências e profissionais, vai de R$ 1.000 a R$ 600 mil. A média por campanha de um influencer já reconhecido é de R$ 18 mil. A agência fica com cerca de 20% desse valor.
Longe do glamour de quem já acumula milhões de seguidores após ter conquistado fama na TV, como atores e atrizes globais, apresentadores ou ex-participantes de realities como o BBB, a imensa maioria é feita de gente comum falando para gente comum, sobre assuntos específicos ou contando sua rotina.
O sucesso está nisto: criar empatia em questão de segundos, a ponto de fazer você acreditar que está batendo papo com uma amiga de infância, um colega de trabalho ou primo querido. É alguém que entra, literalmente, na sua rede de relacionamentos, mas de forma virtual. Daí fica fácil associar sua imagem à marca de um produto ou serviço que faça sentido dentro da realidade do influenciador.
“O público quer ver pessoas reais nas redes sociais, que enfrentam problemas, dilemas, perrengues, assim como cada um de nós”, diz Ana Beatriz, gerente de marketing de influência na Méliuz, fintech especializada em cupons de desconto e cashbacks.
A empresa criou um setor dentro do seu departamento de marketing apenas para cuidar da relação com influenciadores. “Já fizemos campanha para a Méliuz usando 300 influenciadores de uma só vez, no mesmo dia, no mesmo horário, para mexer com o algoritmo do Instagram”, diz Mariana Hargreaves, principal executiva de marketing da M4S (Media For Stars), agência de marketing de influência.
Segundo pesquisa do CENP (Conselho Executivo das Normas-padrão), que reúne anunciantes, agências de propaganda e veículos de comunicação, as redes sociais receberam R$ 1,43 bilhão em investimento publicitário em 2021.
Isso é mais do que o investimento em rádio, jornal, revista e cinema somados no ano passado. Nesse total, estão os posts das próprias empresas nas redes sociais e a contratação de influenciadores via agências de propaganda.
Ana Paula Passarelli criou em 2019 uma agência de marketing de influência, a Brunch, para atender influenciadores em busca de profissionalização e patrocínio. Na sequência, criou a Toast, para assessorar marcas que procuram influenciadores —que podem ou não estar no casting da Brunch.
“O importante é que haja coerência no trabalho do influenciador, não pode ser forçado, ele realmente precisa acreditar no produto ou serviço que apresenta na sua rede.”
Ana Paula é contra seleção só por número de seguidores. “Existem as fazendas de cliques, que podem inflar esse número”, diz ela. “O que vale é a autenticidade da mensagem do influenciador e o nível de engajamento que ele conquista, que vão além dos likes e incluem comentários e compartilhamentos.”
Para que o sucesso de um influencer não seja efêmero, é preciso que ele seja relevante para a comunidade na qual está inserido. “O influenciador não se sustenta se não tiver conteúdo relevante”, diz. Para selecionar influenciadores, a Brunch acompanha a trajetória do profissional e analisa o quanto seus posts, reels, stories e vídeos conquistaram de fato o público.
A BR Media Group, agência de marketing de influência, criou há sete meses a Farol, que reúne casting de influenciadores. “É comum que em uma campanha a gente mescle influenciadores com alcances diferentes, desde o ‘hero’, que tem mais de 2 milhões de seguidores, até o microinfluencer, que soma até 100 mil seguidores”, diz Luiz Jerônimo Stamboni, sócio da BR Media.
Segundo Alexandra Avelar, diretora no Brasil da Emplifi, plataforma que faz a gestão da experiência do cliente nas redes sociais, alguns anunciantes trabalham com nano influenciadores—com menos de 10 mil seguidores, para atingir públicos específicos.
O caminho inverso também ocorre: muitos influenciadores criam conteúdo e marcam as empresas nosposts ou vídeos, afim de serem percebidos por elas, diz. “É uma prática comum inclusive entre grandes influencers: se gostam de uma marca, deixam a hashtag ou arroba no post. Em algum momento, aquele anunciante pode entrar em contato.”
Segundo Stamboni, da BR Media, uma agênciaéimport antepara ajudar o influenciadora manter o seu conteúdo relevante na rede, tendo em vista as constantes mudanças de algoritmo. “Sozinhos, muitos não conseguem acompanhar as mudanças. A assessoria ajuda a avaliar se o conteúdo que ele está criando é relevante para a audiência daquela rede social.”
As agências destacam que é comum que influenciadores se sintam pressionados por criar conteúdos virais e enfrentem um bloqueio criativo.
“O influenciador quer falar de A, mas só viraliza B, ele precisa lidar com a pressão que vem do algoritmo”, diz Mariana Hargreaves, da M4S. “Nosso trabalho é ajudar o influenciador a entender o algoritmo, usamos ferramentas para mapear o que está dando audiência, mas ao mesmo tempo incentivá-lo para que ele produza o conteúdo do jeito dele.”
Mariana dá como exemplo uma influenciadora cristã, que não quis fazer a dancinha do funk que bomba nas redes por ir contra aos seus valores. “Mas ela pode adaptar a melodia para uma mensagem dela. O algoritmo vai entender que ela está usando uma música que está em alta.”
Pesquisa da Nielsen entre fevereiro e março deste ano revela que, embora populares, especialmente no público feminino, os influenciadores não são determinantes de vendas. De acordo com o levantamento, feito com mil pessoas, 45% das mulheres acompanham sempre influenciadores, ante 24% dos homens. Mas 58% delas e 76% deles nunca compraram produtos ou serviços anunciados por influencers. A maioria (66%) informou que não comprou por não sentir confiança no que foi apresentado.