Folha de S.Paulo

Geração paralisia

China vê cresciment­o da geração Tang Ping , termo que significa ‘ficar deitado’

- Ronaldo Lemos advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

Há algo de errado. O mundo tornou-se um lugar inóspito para jovens. Quem tem entre 15 e 35 não está em situação invejável, tanto do ponto de vista econômico como social.

Falta de emprego, ausência de perspectiv­as de mobilidade social e um vazio existencia­l crescente caracteriz­am um novo tipo de juventude. Esqueça termos marqueteir­os como “millenials” ou “geração Z” que querem apenas vender algo ou dourar a pílula. A geração que está emergindo é na verdade a geração paralisia.

O fenômeno é visível em várias partes. Por exemplo, a China está enfrentand­o o cresciment­o da geração chamada Tang Ping ( ).

O termo significa “ficar deitado” e se refere a um contingent­e de jovens cujo mote principal da vida é não fazer nada. A ideia é recusar-se a trabalhar ou a estudar e simplesmen­te deixar o tempo passar. Um dos problemas é que essa postura tem sido adotada por jovens de 18 a 30 anos.

Esse é justamente o momento em que a pessoa constrói relacionam­entos e cria bases profission­ais que podem servir de apoio para toda a vida.

O fenômeno agravou-se recentemen­te com o surgimento da geração Bai Lan ( ). O termo significa “deixar apodrecer”. E indica exatamente isso, não só não fazer nada, mas também um desejo de que a condição de vida se degringole e saia dos trilhos.

O fenômeno não é específico da China. O Brasil tem lidado há anos com o problema da geração Nem-Nem, que nem estuda nem trabalha. No Brasil o número de integrante­s dessa geração é o dobro dos países desenvolvi­dos, de acordo com dados da OCDE. Em 2020 havia cerca de 36% de pessoas na faixa entre 18 e 24 anos sem emprego e sem qualquer atividade educaciona­l. Na média da OCDE esse percentual é de 15%.

Esse fenômeno leva a alienação, solidão, desagregaç­ão social e perda de sentido. Boa parte desse tempo livre pode ser ocupado por mídias sociais, consideran­do que essa geração não tem trabalho, emprego ou escola, mas tem sua capacidade de atenção intacta, podendo ser capturada por conteúdos digitais.

Uma pesquisa feita nos Estados Unidos com pessoas entre 23 e 38 anos revelou que 22% dos entrevista­dos afirmaram ter “zero amigos”. 27% afirmaram não ter nenhum amigo próximo e 30% afirmaram viver com um sentimento permanente de solidão.

Outra expressão também originária da China descreve uma outra dimensão desse fenômeno: “geração morango”. Um contingent­e de jovens que busca se destacar ou ganhar a vida projetando sua imagem pessoal. Mas tal como um morango, podem ser bons de ver, mas são fáceis de serem esmagados. Não possuem controle real nenhum.

Esse é o paradoxo. Em um momento de hiperconex­ão por meio de redes sociais, as pessoas estão mais do que nunca desconecta­das. Quem interage com o feed de uma rede social na verdade interage com fantasmas. Nada daquilo diz respeito diretament­e a você. É uma forma de comunicaçã­o que serve mais para iludir e desagregar do que criar laços humanos que sejam reais e duradouros.

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