Folha de S.Paulo

CORREDORDA­VIDA 50 ANOS

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Inaugurada em 1972, a UTI do Einstein inovou ao formar equipes multiprofi­ssionais e humanizar o cuidado com o paciente; em 2008, sua expertise foi estendida aos usuários do SUS, por meio da administra­ção de hospitais públicos

Meio século atrás, pacientes que sofriam um infarto grave recebiam os primeiros cuidados e ficavam internados em quartos de hospital. Muitos apresentav­am arritmias e não sobrevivia­m. Para mudar esse quadro, surgiram no Brasil as primeiras unidades coronarian­as, que monitorava­m os pacientes para reverter as arritmias e outras intercorrê­ncias. Foram as precursora­s da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no país.

As UTIs, já com esse nome, surgiram no início dos anos 1970 e logo passaram a receber também pacientes submetidos a grandes cirurgias e aqueles com doenças graves, que demandavam mais assistênci­a. Contavam com vigilância integral de médicos e enfermeiro­s à beira do leito.

Com o passar dos anos, as UTIs foram evoluindo e ajudaram a disseminar para outras partes dos hospitais condutas de cuidado e segurança dos pacientes, governança clínica e protocolos rígidos.

Uma das pioneiras no país, a Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein foi inaugurada em 1972, um ano após a abertura do hospital no Morumbi, um bairro ainda rural de São Paulo. Nesses 50 anos, comemorado­s neste mês, a UTI do Einstein inovou ao formar equipes multiprofi­ssionais, humanizar o cuidado como paciente, criar inúmeros protocolos e condutas e investir em tecnologia.

Em 2008, toda a experiênci­a adquirida na Unidade Morumbi foi estendida aos pacientes do SUS, por meio de contratos com o setor público. Hoje, o Einstein administra 100 leitos de UTI nos dois hospitais públicos que gerencia em São Paulo. A partir de junho, serão mais 40 no HMAP (hospital público de Goiânia) . No total, entre públicos e privados, são 290 leitos de UTI e semi-intensiva.

O hospital tem ainda um programa de Tele-UTI que permite visitas remotas de médicos intensivis­tas e a disseminaç­ão de conhecimen­to para vários hospitais pelo país. Em 2019, criou a Rede Einstein de Pacientes Graves, plataforma que leva padrões de qualidade do Einstein às UTIs do sistema público, ao permitir o acesso aos protocolos de cuidados para pacientes de alta complexida­de.

“Quando assumi amissão de montara nossa U TI, em ma iode 1972, não existiam ecocardiog­rama nem ultrassom, o Einstein tinha só quatro andares e ficava praticamen­te fora de São Paulo”, afirma o cardiologi­sta Elias Knobel, 78, que chefiou a unidade por 32 anos. Knobel era um médico recém-formado de 28 anos quando estruturou a primeira UTI do Einstein e vivenciou toda a transforma­ção por que passou a terapia intensiva no país. Escreveu o livro “Condutas no Paciente Grave”, referência mundial e título indispensá­vel para alunos residentes e médicos interessad­os em terapia intensiva, além de outros mais de 20 títulos de diferentes estilos literários.

“A criação de uma UTI moderna, com protocolos rígidos e equipament­os de ponta, permitiu ao Einstein conquistar o protagonis­mo que tem hoje no tratamento de alta complexida­de”, afirma Sidney Klajner, presidente da Sociedade Beneficent­e Israelita Brasileira Albert Einstein.

Para Claudio Lottenberg, que foi presidente do Einstein entre 2001 e 2016 e hoje preside o Conselho Deliberati­vo da organizaçã­o, a trajetória da UTI do hospital foi marcada por dois fatores: o humano e o tecnológic­o. “Há 50 anos, não era fácil sensibiliz­ar médicos para que direcionas­sem suas carreiras para um hospital novo, numa região distante da cidade, e o convite a médicos jovens e promissore­s foi um passo importante. Com o tempo, a UTI se transformo­u em geradora de lideranças”, afirma Lottenberg. “O segundo acerto foi criar e investir em uma infraestru­tura tecnológic­a, em um tempo em que tecnologia não era um grande diferencia­l.”

HUMANIZAÇíO

No seu início, a unidade de terapia intensiva do Morumbi mandava para casa, saudáveis, 35% dos pacientes graves. Um feito para a época. Hoje, 95% dos pacientes têm alta de sua UTI, e a média de tempo de internação gira em torno de três dias.

“A UTI era chamada de corredor da morte”, afirma Knobel. “Fizemos todo um trabalho para quebrar esse tabu e transforma­r a UTI em corredor da vida.” Uma das iniciativa­s foi a criação de um processo de humanizaçã­o da UTI. Os leitos passara mater portas e janelas, para receber luz natural, do Sol, como forma de gerar conforto ao paciente e remeter à vida.

No Einstein, há mais de 15 anos não existe horário de visita na UTI, e o paciente pode ter a companhia de familiares 24 horas por dia .“Hoje, agente entende que quando o paciente está no seu momento mais frágil não pode ser separado da família”, afirma Claudia Laselva, diretora da unidade hospitalar Morumbi e de práticas assistenci­ais. “Além de contribuir para a melhora, a presença da família dá suporte às equipes de enfermagem e possibilit­a uma melhor interação.” EQUIPE MULTIDISCI­PLINAR E CONTROLE DE QUALIDADE

A formação de equipes multiprofi­ssionais de cuidado intensivoé outro ponto de destaque. Foi a primeira U TI ater psicólogos, farmacêuti­cos clínicos e fisioterap­eutas dedicados. “Com reabilitaç­ão cardiopulm­onar e motora precoces, a fisioterap­ia ajuda o paciente ater qualidade devida e ase torna romais independen­te possível quando deixa a UTI”, afirma Raquel Caserta Eid, coordenado­ra de fisioterap­ia do Einstein.

Foram muitas as inovações em gestão, pessoas e equipament­os. M ascomo medira qualidade da U TI? Para encontrara resposta, o Einstein passou a estudar programas de qualidade adotados por outras indústrias. E assim a unidade paulistana tornou-se a primeira UT Ino mundo a conquistar, em 1997, a certificaç­ão ISO 9002.

Em 1999, o Einstein foi o primeiro hospital fora dos EUA a obter a acreditaçã­o da Joint Commission Internatio­nal, órgão que atesta a qualidade hospitalar. “Os profission­ais da UTI ajudaram o hospital a melhorar seus processos e isso foi muito importante para o Einstein ser o que é hoje”, afirma Miguel Cendoroglo Neto, diretor superinten­dente médico e de serviços hospitalar­es.

“Um dos resultados da implementa­ção dessas rotinas e protocolos assistenci­ais rígidos éa redução drástica de infecções adquiridas no ambiente de terapia intensiva, contribuin­do para a segurança do paciente”, explica Cendoroglo.

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ATUAÇÃO INTEGRADA O trabalho da equipe multidisci­plinar transformo­u o cuidado com o paciente grave, contribuin­do com sua qualidade de vida e autonomia após a alta
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ONTEM E HOJE Quarto da UTI do Einstein, quando da inauguraçã­o, em 1972, e hoje, com equipament­os de última geração
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