De olho nos EUA, China vai lançar seu terceiro porta-aviões
Após atrasos devido ao impacto da Covid-19 na força de trabalho e com o acirramento na disputa geopolítica de Washington com Pequim, a China acelerou a construção de seu terceiro porta-aviões e prepara o lançamento para testes no mar.
O Jiangsu, nome de batismo presumido já que seus irmãos o foram em homenagem às províncias costeiras chinesas, poderá sair da doca em Xangai já na próxima sexta (3), segundo sinais captados pela imprensa local.
O estaleiro Jiangnan, na ilha de Chagnxing, fez um bloqueio de tráfego marítimo no ponto em que o navio está sendo construído, segundo o jornal honconguês South China Morning Post. Três rebocadores e dois navios de salvamento já estão destacados para operar na área, o que sugere mesmo o lançamento.
O novo navio difere bastante dos seus dois antecessores.
O primeiro porta-aviões chinês, o Liaoning, foi lançado em 2012. Ele é um navio soviético que estava encostado na Ucrânia e foi completado na China, servindo de tubo de ensaio para a adaptação chinesa a esse tipo de embarcação.
O segundo, o Shandong, já é um projeto chinês, copiando o desenho soviético famoso por sua rampa de lançamento de aeronaves. Ele foi ao mar em 2019, num momento já de acirrada competição com os EUA e seus aliados no escopo da Guerra Fria 2.0 entre Washington e Pequim, que hoje abarca da tentativa chinesa de fazer bases no Pacífico Sul ao trato da Guerra da Ucrânia.
Mas o Jiangsu, se o nome do chamado Tipo 3 for esse mesmo, traz soluções só vistas em modelos ocidentais, como catapultas eletromagnéticas e um convés plano, sem rampa para auxiliar decolagem.
Não há especificações técnicas disponíveis, mas o navio deve ter porte semelhante ao dos seus antecessores.
Ou seja, deslocando cerca de 60 mil toneladas e com cerca de 50 aeronaves. Os gigantes que dominam o ramo, os dez navios da classe Nimitz americana e o primeiro da sucessora Gerald Ford, deslocam 100 mil toneladas e carregam mais de 90 aviões e helicópteros.
Segundo o South China Morning Post, militares afirmam que está tudo pronto para o deslizamento para o mar e o início de testes na sexta. A data não é casual, é o tradicional Festival do Barco do Dragão, quando embarcações típicas com a cabeça do bicho mitológico disputam provas em rios e no mar para, entre outras coisas, espantar o azar associado ao quinto mês do calendário lunar chinês.
Uma vez no mar, o Jiangsu será testado até o chamado comissionamento, quando entrará em capacidade operacional inicial na Marinha. Para atingir o status pleno, seu antecessor imediato levou um ano e o primeiro navio do tipo da China, seis.
Pequim planeja montar uma frota com talvez sete porta-aviões, visando proteger seu quintal estratégico, vital por incluir as rotas marítimas que garantem sua posição como segunda economia do mundo. No futuro, quem sabe, projetar ainda mais poder além desse perímetro mais próximo, que inclui o disputado mar do Sul da China.
A evolução chinesa no mar é um dos motores por trás do aumento progressivo da assertividade americana no IndoPacífico, e estabelecendo um pacto militar com Austrália e Reino Unido e reinventando o grupo Quad, com japoneses, indianos e australianos, com uma aliança visando conter estrategicamente Pequim.
O clima está tenso. Desde que o maior aliado da China, a Rússia de Vladimir Putin, invadiu a Ucrânia, EUA e aliados do Quad vêm alertando Pequim a não se animar a fazer o mesmo com Taiwan.
A resposta chinesa foi dada durante visita de Joe Biden.
O presidente americano esteve no Japão e na Coreia do Sul, na semana passada. Pequim fez uma patrulha conjunta com bombardeiros nucleares russos, um exercício de mobilização próximo à ilha que a ditadura considera uma província rebelde e uma megaincursão com 30 aviões contra suas defesas aéreas.
Os EUA têm investido fortemente nos laços com o Japão, que agora apoiam abertamente a política americana de defender Taiwan em caso de invasão chinesa, e com a Austrália —com quem vai desenvolver submarinos nucleares e mísseis hipersônicos.
Um aliado mais tradicional, o Reino Unido, já vinha dando sinais claros contra a China. Apelando a seu passado de grande potência marítima, colocou de 2019 para cá dois porta-aviões moderníssimos em operação, para o ceticismo sobre a sustentabilidade da pretensão. O estreante Queen Elizabeth navegou pelo mar do Sul da China.
Com tudo isso, a China tem pressa. Os seus três modelos são convencionais, alimentados por turbinas a vapor. Mas analistas militares dizem que um quarto porta-aviões já está em construção sob segredo, e com propulsão nuclear —o que colocaria o país no clube que hoje só tem EUA e França.
A vantagem desses modelos é a autonomia quase infinita, podendo ficar 50 anos no mar com apenas uma recarga de combustível nuclear para os seus reatores. Apenas dez países operam porta-aviões, não considerando aí os porta-helicópteros, que crescentemente são vistos como plataformas para caças americanos F-35B, de decolagem vertical.
Após anos lutando para manter seus obsoletos modelos na água, o Brasil, que já teve dois porta-aviões, desistiu por enquanto do modelo e agora tem um mais eficaz porta-helicópteros britânico, o Atlântico, como nau-capitânia. O foco maior da Marinha é no submarino nuclear.