Folha de S.Paulo

Jacarandás de Lisboa foram levados do Brasil e viraram símbolo local

- Leonardo Rodrigues

MENSAGEM DE LISBOA Há quem afirme que a melhor vista para o azul lilás com que os jacarandás pintam Lisboa nesta altura do ano se alcança do Tejo. Pode ser, até porque a cidade e a sua abertura ao mar têm tudo a ver com a história dessas árvores na cidade.

Foi com o embalo dos ventos que traziam as embarcaçõe­s vindas de volta ao Tejo que também vieram as sementes dos jacarandás, no início do século 19. Vieram do Brasil. Primeiro, para integrar a coleção do Jardim Botânico da Ajuda. Depois, para serem espalhadas pela cidade.

O jacarandá-mimoso é uma espécie arbórea que, em Lisboa, se faz notar no período que antecede o verão, anunciando-o. Dispensa as folhas no fim de abril para que, de maio a junho, pincele a capital com manchas azul lilás, abraçando praças e ruas. É uma árvore exótica, nativa da Argentina, Bolívia e Paraguai, e que se adaptou ao clima.

Porque o homem gosta de assumir a função de pássaro, dispersand­o sementes desde que começou a viajar pelo mundo, reza-se que este feito de trazer os jacarandás para Lisboa teve a mão de Felix Avelar Brotero, ninguém menos do que o pai da botânica em Portugal, tendo dirigido o Jardim Botânico da Ajuda de 1811 a 1826. Como boa prática, que herdou dos tempos em Paris, à semelhança do que fez com outras espécies, oferecia as sementes desta árvore a quem quisesse cultivar pela cidade.

Quem o afirma é Dalila Espírito Santo, a engenheira que também dirigiu este Jardim Botânico de 2002 a 2019, confirmand­o que Brotero, para incentivar a plantação, propagande­ava: “É uma belíssima árvore para Lisboa”. Algo que, para a ex-diretora, serve de prova para o seu papel na difusão da espécie que está um pouco por toda a cidade.

Curiosamen­te, a introdução da planta antecede o regresso da corte do Brasil, numa altura em que os pigmentos do espectro azul eram valiosíssi­mos. Para a realeza, esta planta, pelo seu exotismo, tinha um valor não comerciali­zável: era uma forma de demonstrar o poder real.

Não é por acaso que o rei d. João 6º, quando regressa a Portugal, decide que o Jardim Botânico deve abrir todas as quintas-feiras ao público.

As duas árvores do Jardim Botânico, talvez por serem as primeiras a ser aclimatada­s a Lisboa, são as últimas a florir na cidade.

O jacarandá-mimoso parece estar em contracicl­o pela sua postura, quer na caducidade da folha, quer na floração. Mas o jardineiro Nuno Prates clarifica que “a árvore está a ser coerente com o seu ciclo, tendo um período fugaz sem folhas”. A floração desperta com a temperatur­a que teria o mesmo efeito na América Latina, e que só é atingida cá no anúncio de verão de uma primavera tardia.

Esta necessidad­e de temperatur­as elevadas impede que a árvore seja uma boa escolha para zonas a norte do Tejo — por isso fica aqui, por Lisboa.

Embora Lisboa tenha uma grande fama pelos seus jacarandás, a verdadeira capital mundial dos jacarandás é Pretória, na África do Sul — também longe das suas origens. Alguns livros de botânica afirmam que os portuguese­s foram responsáve­is por aí disseminar esta espécie, assim como noutros países e continente­s.

 ?? Câmara Municipal de Lisboa/Divulgação ?? Avenida da Torre de Belém é um dos lugares para apreciar os jacarandás em Lisboa
Câmara Municipal de Lisboa/Divulgação Avenida da Torre de Belém é um dos lugares para apreciar os jacarandás em Lisboa

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil