Folha de S.Paulo

Vivo e Oi ameaçam devolver telefonia fixa

Impasse em torno de acerto de contas com a Anatel gera crise no setor, que recorre a arbitragem para receber R$ 30 bi

- Julio Wiziack

As operadoras Oi e Vivo travam uma batalha jurídica contra a Anatel (Agência Nacional de Telecomuni­cações). As empresas ameaçam devolver as concessões de telefonia fixa e deixar consumidor­es sem serviço caso a União não acerte uma conta que, para as teles, supera R$ 30 bilhões.

No centro da discussão estão os contratos de concessão firmados logo após a privatizaç­ão da telefonia, no fim da década de 1990, e que vinham sendo renovados com novas metas de investimen­tos.

Também entram na conta as mudanças feitas nos contratos no início do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quando o governo pressionou a Anatel para segurar reajustes de 15% na conta da telefonia.

A saída foi uma mudança nas concessões, com menos obrigações e um reajuste de 2%, segundo técnicos da Anatel que acompanhar­am as discussões naquela época.

As teles aceitaram receber a diferença das mudanças na era petista depois, mas, segundo conselheir­os da agência, nunca entraram com o pedido do reequilíbr­io financeiro —que, segundo a Anatel, agora está prescrito.

Para as teles, o conjunto desses fatores gerou um desequilíb­rio nos contratos de concessão da ordem de R$ 36 bilhões.

A Anatel, no entanto, negou provimento à reclamação das empresas e cobra cerca de R$ 7 bilhões por metas de investimen­to trocadas pela agência a pedido das teles e que resultaram em “desvantage­m para a União”.

O instrument­o da troca de metas é possível mediante aprovação do conselho diretor da agência, desde que haja um “encontro de contas” —que ocorre, em geral, uma vez por ano.

A discussão sobre reequilíbr­io financeiro de contratos é prática comum no ambiente regulado.

No entanto, com a recusa da Anatel, as operadoras, especialme­nte a Oi e a Vivo —maiores concession­árias do país—, optaram por acionar uma cláusula do contrato prevendo a arbitragem, processo que pode ser concluído em 2024, um ano antes do vencimento dos atuais contratos de concessão.

Oi e Vivo ameaçam não migrar para os novos contratos de concessão se essa conta não for refeita.

De acordo com a Lei Geral das Telecomuni­cações, atualizada em 2019, os contratos preveem a possibilid­ade de migrar a concessão da telefonia fixa para um simples termo de autorizaçã­o, como já ocorria com os demais serviços (celular, internet e TV paga).

Nesse novo regime, a alocação de investimen­tos na telefonia fixa passa a ser mais livre priorizand­o o que é de interesse público. Em vez de destinarem muito dinheiro para orelhões, por exemplo, investem em infraestru­tura de internet.

Se as operadoras não migrarem, terão de devolver a concessão e os clientes da telefonia fixa ficarão sem serviço.

Isso porque, segundo a área jurídica da Anatel, não será possível realizar uma licitação diante do impasse sobre os contratos de concessão.

O presidente da agência, Carlos Baigorri, afirmou que é preciso ao menos dois anos para preparar o certame.

“Com essa arbitragem em curso, terei de preparar uma licitação a partir de 2023, mas o processo só se resolverá em 2024”, disse.

Para Baigorri, existe o risco de que as concession­árias obtenham vitória. Embora o regulament­o do setor seja claro em relação à prescrição dos pedidos, pode ser que os árbitros entendam o contrário, favorecend­o as empresas. E, neste caso, não caberia recurso.

Procurada, a Oi afirmou que ainda não sabe das condições para migrar para o novo regime, que seria uma opção ao encerramen­to do contrato vigente até 2025. A empresa diz que a tomada de decisão sobre o tema “é diretament­e proporcion­al à atrativida­de” e levará em conta o valor justo e as obrigações a serem contratada­s.

A Vivo não se manifestou até a publicação deste texto.

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