Folha de S.Paulo

Sabe aquela da Dorothy Parker?

- Ruy Castro

Dorothy Parker estava com seu poodle Troy num saguão de hotel em Nova York, esperando um amigo. O homem demorou a descer e Troy, impaciente, fez xixi numa pilastra. O gerente ouviu o esguicho, viu a poça e marchou em direção a Troy. Dorothy, sentindo o perigo, sussurrou, como que envergonha­da: “Fui eu...”.

Essa era uma tirada típica de Dorothy Parker (1893-1967), o nome mais famoso da Mesa Redonda do Algonquin Hotel, uma turma de cerca de 20 intelectua­is criativos e debochados que, espontanea­mente, sem pedantismo­s teóricos, marcou a cena cultural americana dos anos 20. Pior para Dorothy —suas frases, desfechada­s de primeira, abafaram para a posteridad­e a contista, poeta, roteirista de cinema e crítica de teatro e de literatura que ela foi. Mas quem a mandou ser tão rápida?

Perguntara­m-lhe qual era o seu tipo de homem. Ela disse: “Burro, grosso e bonito”. Mas depois se queixou de seu ex-marido Eddie Parker: “Era tão burro que conseguiu quebrar o braço fazendo ponta no lápis”. Sobre um bonitão que a esnobou: “O corpo lhe subiu à cabeça”. E sobre uma escritora pretensios­a cuja carreira se dava principalm­ente na horizontal: “Ela fala 18 línguas e não sabe dizer ‘Não’ em nenhuma”. Dorothy foi também a autora do célebre epitáfio “Desculpe o meu pó”.

Uma amiga lhe confidenci­ou: “Já decidi. Só quero envelhecer com dignidade”. Dorothy perguntou: “E você conseguiu?”. Dorothy foi presentead­a com um papagaio e deu-lhe o nome de Onan —“porque ele despeja suas sementes no chão”. Sua crítica sobre a estreante atriz Katharine Hepburn: “Ela domina todo o leque de emoções, de A a B”. E sobre um livro recém-lançado: “Este não é um livro a ser deixado casualment­e de lado. É para ser atirado longe”.

Dorothy era alcoólatra e tentou três vezes o suicídio. Sem sucesso. Até que se conformou num poema: “Armas são ilegais/ Nós afrouxam/ Gás fede/ É melhor viver”.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil