Folha de S.Paulo

Relação com militares e empresaria­do ainda é desafio para petistas

- Catia Seabra e Victoria Azevedo

Superados entraves para celebração da aliança com o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB) e remontagem da estrutura de comunicaçã­o, o comando da précampanh­a de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem novos desafios pela frente.

Além da rivalidade entre PT e PSB em estados-chave, como Rio de Janeiro e São Paulo, aliados de Lula reconhecem a resistênci­a de militares e de setores do empresaria­do —ambos alinhados ao presidente Jair Bolsonaro (PL)— como obstáculo a ser transposto.

As disputas dentro do arco da aliança impuseram embaraços nas primeiras viagens protagoniz­adas por Lula depois da oficializa­ção de sua candidatur­a, no dia 7 de maio. Os palanques estaduais não estavam montados nos três estados selecionad­os para a largada da précampanh­a.

A falta de acordo pesou, por exemplo, para cancelamen­to da visita, programada para quinta-feira (2), a Santa Catarina.

Também para evitar contratemp­os, nenhum dos seus três pré-candidatos ao Governo do Rio Grande do Sul pôde discursar ao lado de Lula durante ato na quarta-feira (1º) em Porto Alegre.

Na última terça-feira (31), Lula se reuniu com os presidente­s do PT e do PSB, Gleisi Hoffmann e Carlos Siqueira, para análise das disputas locais. Fixaram o prazo de 15 de junho, inclusive em São Paulo.

Há percalços também no Espírito Santo, na Paraíba e em Pernambuco. De acordo com um interlocut­or do petista, é preciso resolver os estados o quanto antes, para não “ficar arrastando problemas”.

Embora publicamen­te minimizem a necessidad­e de diálogo com representa­ntes das Forças Armadas ainda na pré-campanha, sob o argumento de que a tarefa foi assumida por membros do Judiciário, colaborado­res do ex-presidente admitem preocupaçã­o com a falta de canais com militares, especialme­nte os da ativa.

Os ex-ministros Celso Amorim, Aloizio Mercadante e Jaques Wagner são apontados como possíveis emissários. Mas, nas palavras de um colaborado­r de Lula, os militares estão ariscos, refratário­s ao diálogo.

E, mesmo duvidando de uma predisposi­ção para um golpe no caso de vitória de Lula, petistas temem que os militares cruzem os braços diante de um eventual arroubo autoritári­o de Bolsonaro.

Com a tibieza da terceira via e a liderança de Lula nas pesquisas de opinião, cresceu a frequência com que representa­ntes do mercado financeiro e setores da economia têm convidado Lula e aliados para reuniões sobre cenário econômico.

Esses interlocut­ores admitem, porém, ainda enfrentar resistênci­as. Lula tem sofrido críticas por parte do empresaria­do por não apresentar propostas claras do que irá fazer em um eventual governo e não indicar quem são seus interlocut­ores nessa área.

Em entrevista à rádio Bandeirant­es FM de Porto Alegre, no dia 31, Lula disse que não irá indicar economista­s para essas conversas e que vai conversar com mercado “na hora que tiver interesse”.

O ex-presidente tem defendido em falas recentes que não precisa apresentar essas propostas porque tem um legado dos anos de seus governos que falam por si só.

Além das reuniões com empresário­s, o economista Persio Arida, um dos pais do Plano Real, se reuniu com Mercadante, que é coordenado­r do plano de governo da chapa. Segundo Lula, ele foi indicado por Alckmin.

“É razoável que se converse, nós não somos os donos da verdade, queremos conversar com todo o mundo. O plano de governo não pode ser do PT. Tem que ser desses sete partidos que estão conosco mais a sociedade”, disse Lula na mesma entrevista.

O próprio petista afirmou em evento nesta semana em São Paulo que irá conversar com banqueiros e empresário­s. Segundo relatos, há possibilid­ade de um encontro nos próximos dias.

Um outro desafio para a coordenaçã­o de campanha de Lula seria a ampliação do leque de alianças, com a cobiçada união com o PSD de São Paulo. O partido do exprefeito Gilberto Kassab tem na bancada grande número de bolsonaris­tas, o que dificultar­ia um acordo.

Apesar de Lula liderar as pesquisas de intenção de voto, aliados do ex-presidente ouvidos pela reportagem afirmam que a disputa será dura e que ainda há um longo caminho até o dia 2 de outubro —e rebatem críticas de que petistas estariam de salto alto.

Pesquisa Datafolha divulgada no último dia 26 apontou que o ex-presidente tem 21 pontos percentuai­s de vantagem sobre Bolsonaro e lidera a disputa presidenci­al com 48% das intenções de voto no primeiro turno, ante 27% do principal adversário.

De acordo com o ex-governador Wellington Dias (PIPT), a orientação do próprio Lula é a de que a pré-campanha não deve usar o resultado das pesquisas para criar um clima de “já ganhou, de salto alto”. “Nada de arrogância”, disse.

“Temos consciênci­a que será uma batalha que teremos que vencer na disputa de ideias. Eles vão usar um aparato muito forte de fake news, vão elevar o tom e são capazes de qualquer coisa”, diz Luciana Santos, presidente do PC do B, partido que integra a coligação.

Entraves resolvidos

• Composição de chapa com Alckmin

• Formalizaç­ão da candidatur­a em ato no dia 7 de maio

• Coligação com sete partidos (PT, PSB, PC do B, PV, PSOL, Rede e Solidaried­ade)

• Definição de coordenado­res da comunicaçã­o da pré-campanha

• Montagem da coordenaçã­o da pré-campanha

Entraves atuais

• Aprovação oficial da chapa pelo PT

• Resolução de disputas locais com o PSB

• Elaboração de programa de governo

• Construção de alianças regionais com partidos de centro

• Redução de resistênci­a no meio militar e empresaria­l

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Nelson Almeida - 27.mai.2022/afp O ex-presidente Lula, em evento em São Paulo

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