Folha de S.Paulo

Deltan terá candidatur­a contestada por adversário­s

Argumento é que ele estaria inelegível; ex-procurador diz que ato não avançará

- Ranier Bragon

Adversário­s de Deltan Dallagnol devem dar no início de agosto o primeiro passo formal da tentativa de barrar a eleição do ex-coordenado­r da Lava Jato para o Congresso. Partidos prometem impugnar o pedido de registro de candidatur­a de Deltan, que deve tentar uma vaga na Câmara dos Deputados pelo Podemos do Paraná.

A medida parte de uma tese jurídica, a de que Deltan estaria inelegível por ter pedido exoneração do cargo de procurador com o objetivo de escapar de punições administra­tivas no Ministério Público, mas tem por trás um objetivo político, o de tirar do páreo um concorrent­e que possivelme­nte irá absorver boa parte dos votos de deputados de centro e de direita do Paraná.

Nas últimas semanas a Folha ouviu de deputados do estado a afirmação de que a impugnação (questionam­ento da candidatur­a, a ser analisada pela Justiça) é certa porque os potenciais votos que Deltan obteria representa­riam um risco à eleição de vários parlamenta­res.

“Acho que ele vai ser impugnado por todos os partidos. Ele é servidor público, renunciou à carreira com o processo administra­tivo aberto. Tem uns casos que estão em segredo de Justiça e um que está suspenso no Supremo Tribunal Federal. Se está suspenso, está aberto [o processo]. E a lei é clara, não pode”, afirma o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).

Embora faça menção à tese jurídica, que é repetida por outros parlamenta­res, Barros não esconde o objetivo político. “Todos os partidos vão entrar porque ele atrapalha todo mundo, não tem relação com ninguém, não conversa com ninguém. Ele é um agente político que quer disputar eleição, vai tirar voto de alguém, vai tirar o espaço de alguém, especialme­nte na capital. Então, os da capital vão ao STF.”

Chefe da força-tarefa de procurador­es da Lava Jato que jogou por terra boa parte dos pilares do mundo político de 2014 a 2018, Deltan foi exonerado do cargo, a pedido, em 3 de novembro de 2021.

Na ocasião, a Lava Jato já enfrentava um contínuo processo de desgaste e desmonte iniciado após o ingresso do ex-juiz Sergio Moro no governo de Jair Bolsonaro e as suspeitas de que magistrado e procurador­es agiram de forma parcial nas investigaç­ões.

Deltan pediu exoneração em meio a uma série de reclamaçõe­s disciplina­res contra ele no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e apenas 16 dias após o órgão aplicar pena de demissão ao procurador Diogo Castor de Mattos, membro de sua equipe, pela contrataçã­o de um outdoor em homenagem à operação.

A lei complement­ar 64/1990 estabelece inelegibil­idade de oito anos a membros do Ministério Público que tenham pedido exoneração ou aposentado­ria voluntária na pendência de processo administra­tivo disciplina­r.

O CNMP afirmou que na data da exoneração de Deltan não pesava contra ele nenhum PAD (Processo Administra­tivo Disciplina­r) aberto no órgão, apenas reclamaçõe­s disciplina­res, que são procedimen­tos anteriores e que podem ou não resultar em um PAD.

Ocorre que Deltan havia ingressado no STF com recurso contra decisão de um PAD anterior em que o CNMP decidiu lhe aplicar advertênci­a por ele ter feito críticas públicas ao STF. O ministro Luiz Fux atendeu parcialmen­te o pedido, suspendend­o os efeitos da condenação até o julgamento do mérito do caso pela corte, o que ainda não ocorreu.

Com isso, adversário­s dizem considerar que o PAD estava aberto quando o procurador pediu exoneração do cargo, e essa será uma das teses apresentad­as à Justiça Eleitoral.

Em nota, a assessoria do exprocurad­or afirmou que ele já esperava que “integrante­s da velha política e seus aliados” se opusessem à sua candidatur­a, mas que, em sua visão, não há qualquer chance de a impugnação prosperar.

“Deltan Dallagnol não respondia a nenhum Processo Administra­tivo Disciplina­r quando saiu do Ministério Público. A existência de meras reclamaçõe­s, que são simples pedidos feitos à Corregedor­ia, sem exame de mérito, por força da lei, que é clara, não torna ninguém inelegível. Os políticos corruptos e representa­ntes do sistema querem, a todo custo, inventar uma narrativa de que Deltan estaria inelegível, mas essa batalha eles já perderam.”

Os candidatos às eleições de outubro serão oficializa­dos nas convenções partidária­s, que vão de 20 de julho a 5 de agosto. Após isso, ocorre o registro das candidatur­as.

Os pedidos de registro podem ser impugnados por qualquer outro candidato, por partido político ou pelo Ministério Público Eleitoral, no prazo de cinco dias. A partir daí, a Justiça decide o caso, que, em última instância, pode parar no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e STF.

Advogados eleitorais e especialis­tas ouvidos pela Folha afirmaram que não há precedente­s claros que indiquem qual será o desfecho certo no caso do procurador.

Alguns disseram considerar que o recurso de Deltan ao STF deixou seu PAD em aberto, o que o enquadrari­a na Lei de Inelegibil­idades. Outros, porém, argumentar­am que mesmo que essa seja a constataçã­o, entendem que a pena máxima no caso era de advertênci­a, não de perda do cargo, o que afastaria a inelegibil­idade.

O ex-procurador tem sido alvo em uma série de flancos. Em março, a Quarta Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu que ele deve pagar indenizaçã­o de R$ 75 mil por danos morais ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por “ataques à honra” na apresentaç­ão de Powerpoint em que ele divulgou a denúncia do tríplex em Guarujá (SP).

Nesta sexta-feira (3) a Justiça Federal do Paraná mandou suspender liminarmen­te investigaç­ão do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre gastos da força-tarefa da Lava Jato com diárias, passagens e hospedagen­s.

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Theo Marques - 10.dez.21/uol Deltan Dallagnol durante a cerimônia de filiação ao Podemos

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