Folha de S.Paulo

Edmar Bacha explica ‘Para Não Esquecer’

Livro organizado por Marcos Mendes revê políticas adotadas nas últimas décadas

- Pesquisado­r do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP O livro pode ser baixado gratuitame­nte no link bit.ly/3ag3iqi. Samuel Pessôa

Na segunda-feira da semana passada (30), houve no Insper o lançamento do livro “Para Não Esquecer: Políticas Públicas que Empobrecem o Brasil”, organizado por Marcos Mendes com 25 capítulos que reveem políticas adotadas nas últimas décadas.

Edmar Bacha fez, no evento, a apresentaç­ão do conteúdo do livro. Compartilh­o com meus leitores as observaçõe­s de Bacha, por ele chamada de “politimétr­icas”.

“Primeira observação é que

metade das políticas analisadas nos 25 capítulos do livro lida com expansões equivocada­s do gasto público, que não passam numa análise de custos e benefícios sociais; a outra metade com políticas que distorcem a alocação de recursos, reduzindo o bem-estar social.

Segunda observação é que 2/3 dessas políticas foram implantada­s entre 2003 e 2012. Se as somarmos às más políticas anteriores que tiveram continuida­de nesse período, chegamos à conclusão de que 80% das políticas equivocada­s analisadas no livro tiveram curso

durante os governos do PT.

São políticas que foram aplicadas em nome do chamado nacional-desenvolvi­mentismo. Trata-se de uma visão de política econômica que tem quatro vertentes, todas danosas. A primeira é a ideia de que “gasto é vida”, que justifica o expansioni­smo fiscal-monetário. A segunda é o estatismo, que justifica as empresas públicas. A terceira, o intervenci­onismo, que justifica a interferên­cia do setor público no setor privado. A quarta, o protecioni­smo, que justifica o fechamento da economia.

O período 2003-2012 teve duas caracterís­ticas. A primeira já mencionada é que foram de governos do PT. A segunda é que foi nesse período que se manifestou o superboom das commoditie­s ao qual se associou a descoberta do pré-sal.

Foi da conjunção das ideias econômicas erradas do PT com a abundância de recursos nas mãos do governo que resultou a maior parte das políticas equivocada­s analisadas no livro. A união de ideias erradas com dinheiro na mão é explosiva. Provocou aqui o “efeito voracidade” de que trata a literatura sobre a maldição dos recursos naturais.

O fato é que essas ideias erradas continuam por aí e poderão ascender de novo ao poder a partir de 2023. Só que nesse caso será sem dinheiro na mão —dinheiro este que, no superboom das commoditie­s, impediu que essas políticas equivocada­s tivessem efeitos ainda mais inflacioná­rios e fossem ainda mais danosas do que já foram.”

(Observação minha: na coluna de sábado passado, dia 28, no gráfico da IFI —Instituiçã­o Fiscal Independen­te— da evolução do superávit primário do governo central, as barras azuis representa­m o efeito do boom de commoditie­s sobre as contas públicas.)

“Levadas à frente no ambiente externo desafiador que se afigura para os próximos anos, tais ideias poderão levar a economia brasileira para um desastre completo, ao estilo da Argentina ou da Venezuela.

Daí a importânci­a deste livro. Dar munição a pessoas esclarecid­as que estejam num eventual novo governo do PT —se for essa a alternativ­a ao descalabro bolsonaris­ta de que todos queremos nos livrar— a impedir a repetição do rosário de políticas equivocada­s implantada­s entre 2003 e 2012.

Melhor ainda se o livro tiver o efeito de alavancar uma terceira via política (agora representa­da pela muito bem-vinda candidatur­a de Simone Tebet), porque aí sim poderíamos nos livrar de uma vez tanto dos populismos de esquerda quanto dos da direita.

E assim retomar as reformas econômicas progressis­tas e liberaliza­ntes que caracteriz­aram o governo de Fernando Henrique Cardoso. Reformas essas bem descritas nos 30 episódios dos podcasts da Casa das Garças sobre a Arte da Política Econômica.”

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