Bahia afrouxa normas para irrigação de área agrícola
Poços artesianos poderão captar água em menor distância; especialistas alertam para riscos
O governo da Bahia deve publicar, nos próximos dias, em meio à crise climática, uma portaria que flexibiliza as normas para captação de água para irrigação de áreas agrícolas no oeste do estado.
O anúncio foi feito pelo governador Rui Costa (PT), durante visita à Bahia Farm Show, uma das principais feiras do agronegócio no Brasil, realizada entre os dias 1º e 4.
As alterações no volume de captação de água e na distância entre poços artesianos têm como base estudo feito por universidades do Brasil e dos EUA, durante quase cinco anos, com custo de R$ 5 milhões, financiado pelos agricultores.
Será permitido, por exemplo, abrir poços artesianos para captação de água em menor distância uns dos outros —dos atuais 2.500 metros para 1.000 metros.
Também haverá alterações nas outorgas para captação, cujos volumes vão variar conforme a época do ano ou a disponibilidade de água superficial (volume dos rios) e subterrânea.
“Ficou comprovado que algum nível de flexibilidade pode ser feito, sem prejudicar o ambiente e a reposição do manancial hídrico da região”, disse Costa.
A irrigação no oeste do estado é feita em parte com águas do aquífero Urucuia. A outra parte da captação é dos rios Grande e Corrente, afluentes do rio São Francisco.
Segundo a Aiba (Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia), a flexibilização permitirá ampliar em mais 500 mil hectares a área irrigada, a depender ainda do aumento da oferta de energia.
O oeste da Bahia tem atualmente 2,3 milhões de hectares de área plantada, sendo 200 mil hectares irrigados. As principais culturas são soja, milho e algodão.
Para o geógrafo Valvey Dias Rigonato, da Universidade Federal do Oeste da Bahia, a medida “é um desastre anunciado com aval do governo” do estado.
“Ao menos 500 famílias, de oito comunidades, somente da área que realizo pesquisas há mais de dez anos, passam por problemas sérios de falta de água, e a que tem é de baixa qualidade, para consumo humano ou animal.”
Para ele, o estado está mais preocupado “com marketing ambiental e político” do que com uma gestão ambiental.
O agrometeorologista Marcos Heil Costa, por sua vez, alerta para o fato de que as vazões dos rios vem caindo e que a região apresenta queda de 12% nos índices pluviais desde os anos de 1980, devido às mudanças climáticas. Para os próximos anos, a previsão é de escassez de chuvas.
“É preciso muita cautela com o uso da água na irrigação. Desde que feita de forma racional, a irrigação pode ser uma ótima opção para uma agricultura mais resiliente às mudanças climáticas.”
Procurado, o governo baiano não se manifestou sobre as críticas de ambientalistas.
Odacil Ranzi, presidente da Aiba, afirma que estão sendo feitos investimentos em projetos de reflorestamento.
“Esse estudo provou que a água pode ser retirada ainda por muito tempo, e que boa parte dela pode ser devolvida pelas chuvas”, diz.
A Aiba afirma que a ampliação da irrigação será acompanhada pelo lançamento do Sima (Sistema Integrado de Monitoramento Agrícola), que vai coletar dados sobre índices de pluviosidade, umidade do solo e nível do aquífero Urucuia, entre outros.