Folha de S.Paulo

Modelo explica por que Urano e Netuno têm azuis diferentes

- Salvador Nogueira folha.com/mensageiro­sideral

Se fosse um filme ou romance de gosto duvidoso, poderia se chamar “50 Tons de Azul”. Felizmente, contudo, é só um estudo científico, um que pode finalmente elucidar por que Urano e Netuno têm cores ligeiramen­te diferentes.

O sétimo e oitavo planetas do Sistema Solar são o mais perto que chegamos por essas bandas de ter mundos gêmeos. Os dois são classifica­dos como gigantes gelados, planetas numa categoria intermediá­ria entre os rochosos, como a Terra, e os gigantes gasosos, como Júpiter e Saturno.

Na prática, por sinal, eles também são gigantes gasosos, mas que reuniram menor quantidade de gás e têm presença proporcion­almente maior de gelos, como metano e sulfeto de hidrogênio. Ambos têm cerca de 50 mil km de diâmetro (Urano um pouco mais, Netuno um pouco menos). E, sendo tão parecidos, sempre foi um pouco surpreende­nte que tivessem personalid­ades distintas, um com um aspecto azul pálido, quase verde, outro com um azul mais intenso.

A aparência genérica da cor é a parte fácil de entender: isso se dá pelo mesmo motivo que o céu na Terra é azul. O espalhamen­to da luz pelas moléculas na atmosfera é mais eficiente nessa faixa do espectro. A novidade aqui foi entender a diferença entre os tons e o aspecto geral dos dois mundos distantes.

A chave veio com a criação de um modelo computacio­nal de três camadas de aerossóis distribuíd­as a diferentes alturas na atmosfera dos planetas. O trabalho só foi possível graças à análise de dados de arquivo do Telescópio Espacial Hubble, bem como a realização de novas observaçõe­s com o telescópio Gemini Norte, no Havaí.

Desenvolvi­do pela equipe de Patrick Irwin, da Universida­de de Oxford, no Reino Unido, e apresentad­o em artigo publicado no periódico Journal of Geophysica­l Research: Planets, o modelo desfez o mistério: uma camada de névoa concentrad­a que existe na atmosfera dos dois planetas é mais espessa em Urano, o que o empalidece.

A presença da névoa, de acordo com os pesquisado­res, representa a formação de cristais de metano que então caem como flocos de neve. Se essa camada intermediá­ria não existisse em nenhum dos dois planetas, ambos seriam igualmente azuis, refletindo apenas o espalhamen­to da cor na atmosfera.

O trabalho também ajudou a esclarecer de onde vêm as manchas escuras que vez por outra aparecem, principalm­ente, em Netuno: são fruto de um escurecime­nto de aerossóis na camada mais profunda do modelo, onde ocorre a condensaçã­o do sulfeto de hidrogênio presente na atmosfera.

As três camadas se distribuem por uma faixa de 200 km de altura, na região imediatame­nte inferior à estratosfe­ra dos dois planetas, com pressões que variam entre 1 e 10 vezes a encontrada na Terra ao nível do mar. E um grande avanço é que o modelo reflete observaçõe­s feitas dos dois planetas em vários compriment­os de onda: não só luz visível, mas também em ultraviole­ta e infraverme­lho.

 ?? Nasa/ESA/A. Simon ?? Composição de imagens do Telescópio Espacial Hubble em 2021 mostra Urano (esq.) e Netuno (dir.)
Nasa/ESA/A. Simon Composição de imagens do Telescópio Espacial Hubble em 2021 mostra Urano (esq.) e Netuno (dir.)

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