TSE faz acordo com líderes religiosos sob ataques de Malafaia
BRASÍLIA Sob ataques do pastor Silas Malafaia, aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL), o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) assinou, nesta segunda (6), termo de cooperação para combate a fake news com entidades e representantes de diversas religiões.
O texto prevê que lideranças religiosas promovam a “exclusão da violência durante as pregações, sermões e homilias, ou ainda em declarações públicas ou publicações que venham a fazer”, segundo nota divulgada pela corte.
Horas antes do evento, Malafaia publicou vídeo nas redes sociais chamando o presidente do tribunal, Edson Fachin, de “esquerdopata de carteirinha” e cobrou boicote ao acordo.
No vídeo, o pastor afirmou que a liderança religiosa que assinar o documento é alienada, está “por fora dos fatos” ou é “esquerdopata”. “Líder religioso que sabe das coisas não vai cair nesse jogo”, disse Malafaia.
A ideia do TSE é reduzir a resistência ao sistema de voto para as eleições deste ano, no momento em que o presidente Bolsonaro realiza ataques às urnas eletrônicas e faz ameaças golpistas.
As entidades, porém, não se comprometeram a apoiar a posição do tribunal em defesa das urnas eletrônicas.
Na semana passada, o pastor Eduardo Bravo, presidente da Unigrejas, disse que a entidade participaria do evento e assinaria o documento, o que não aconteceu.
Em nota, a Unigrejas afirmou que recebeu com alegria o convite do TSE para o evento, mas que resolveu não participar do acordo. “Neste momento, na busca de temperança e na representação de mais de 50 mil pastores e igrejas, resolvemos ficar como observadores do evento, posto que há temas sensíveis em pauta, como o chamado combate à desinformação.”
O deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), presidente da bancada evangélica, foi convidado para a cerimônia, mas disse à Folha que não participou por razões pessoais. Ele é aliado de Malafaia.
Segundo o TSE, assinaram o documento 15 entidades ou representantes de grupos de religiões de matriz africana, budista, católicos, espíritas, evangélicos, judeus e muçulmanos.
William Douglas, juiz do TRF (Tribunal Regional Federal) da 2ª Região, também está entre os signatários do termo de cooperação.
Douglas era um dos nomes avaliados por Bolsonaro para preencher a vaga de “terrivelmente evangélico” no Supremo, que ficou com o ministro André Mendonça.
“Democracia, ordem jurídica e religião partilham, para além do caráter necessário e vital, o fato de que pressupõem, em conexão com a busca incessante por justiça, a consolidação de um estado firme e indeclinável de aceitação e respeito”, disse Fachin durante o evento.
O presidente do tribunal disse que a proposta é defender a “natureza pacífica das eleições” e que a Justiça Eleitoral enfrenta “dificuldades inusuais”.
“Como decorrência da crescente intolerância, do progressivo esgarçamento de laços e, sobretudo, do evidente processo de degradação de valores decorrente da expansão irrefreada do fenômeno da desinformação”, disse o magistrado.
Bolsonaro tem usado eventos com lideranças religiosas para levantar dúvidas sobre as eleições e atacar adversários.
“Foi um fiasco. Uma das maiores religiões do país não tem os representantes legais. Ele [Fachin] fez isso com interesses políticos para isolar o presidente”, afirmou Malafaia à Folha
Presidente da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos), Edna Zilli disse que o documento do TSE apresenta valores “caros” às religiões cristãs. Afirmou ainda que a iniciativa pode fortalecer a democracia brasileira.
O secretário-geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom João Portella Amado disse que o trabalho do TSE é “condição indispensável para a democracia”.
Já Mãe Nilce Naira, coordenadora da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde, disse que culturas de raiz africana têm sido atacadas “pelas mãos da intolerância e do preconceito” ao defender o pacto com o tribunal.