Folha de S.Paulo

A conta do Tribunal de Contas

O TCU-Tours é parte de uma anomalia muito maior

- Elio Gaspari Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles “A Ditadura Encurralad­a”

Deve-se ao repórter Tácio Lorran a revelação de que alguns ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) custam mais com viagens e diárias do que com os salários que remuneram seu trabalho. Bruno Dantas, por exemplo, tem vencimento­s de R$ 37,3 mil brutos e custou R$ 43.517 entre 25 de fevereiro e 14 de março, indo à Polônia, Arabia Saudita, Áustria e França.

Ele não é o único, nem o TCU está sozinho nessas prebendas. As viagens de instrução, bem como seminários de curta duração, geralmente coincidind­o com os feriadões nacionais, ganharam até o apelido de “farofas”.

O TCU é encarregad­o de vigiar as despesas feitas com dinheiro da Viúva. Logo ele, mete-se em turismo de primeira e se explica com argumentos de segunda: “Os preparativ­os para a gestão brasileira exigem contato constante com instituiçõ­es de outros países e, naturalmen­te, isso exige deslocamen­to de autoridade­s da Casa para reuniões de trabalho e compromiss­os de cunho científico”.

Contem outra. O TCU brasileiro nada tem a aprender na Arábia Saudita ou na Polônia. O trabalho de instituiçõ­es francesas e austríacas pode ser acompanhad­o sem a necessidad­e de viagens.

O ministro Vital do Rêgo custou R$ 92,7 mil entre fevereiro e maio (R$ 53,8 mil em passagens), inclusive para ir ao Congresso da Carosal. A sigla significa Caribbean Organizati­on of Supreme Audit Institutio­ns.

Ganha um fim de semana num carimbo ilegal quem for capaz de dizer o que as instuições caribenhas têm a ensinar, hospedando milionário­s e paraísos fiscais. O Congresso aconteceu em Aruba, jóia do veraneio do andar de cima. O Haiti fica no Caribe, mas ninguém vai para lá.

Nos últimos cinco meses, o ministro Bruno Dantas esteve em oito países. Admita-se que havia o que fazer no Paraguai, Uruguai, Argentina, México, Peru e Equador. Restam a Índia e o Egito, capitais às quais quase sempre se chega passando por Paris.

É comum que profission­ais liberais endinheira­dos usem congressos e seminários em locais aprazíveis para enforcar feriados. Como eles fazem esse turismo com seus recursos, noves fora a Receita Federal, ninguém tem nada a ver com isso. O caso dos hierarcas é outro, pois usam dinheiro público, faltam ao serviço e, em alguns casos, são acompanhad­os por assessores.

O Tribunal de Contas da União presta inestimáve­is serviços. Foi ele quem matou a maluquice do Trem Bala e quem destampou a panela das diárias dos procurador­es da Operação Lava Jato. Um deles chegou a receber R$ 506 mil em diárias e R$ 186 mil em passagens. Os pagamentos eram impróprios, mas os doutores sempre poderiam dizer que estavam trabalhand­o em Curitiba.

Já os hierarcas do TCU, bem como os magistrado­s que recorrem ao mesmo expediente, raramente poderão usar o mesmo argumento. (Deixese de lado o fato de alguns seminários remunerare­m palestras, pois esse é outro capítulo do volume dos mimos oferecidos a diversas atividades profission­ais).

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