Folha de S.Paulo

Estados têm espaço para reduzir tributos sem prejudicar políticas públicas, diz Economia

- Idiana Tomazelli

Em meio à queda de braço entre União e estados pela redução de tributos sobre combustíve­is, o Ministério da Economia elaborou um estudo para mostrar que os governador­es têm espaço para cortar impostos sem prejudicar políticas públicas.

No biênio 2020-2021, o cresciment­o médio anual de receitas de estados e municípios com impostos foi de 6,2%, já descontado o efeito da inflação. Os gastos com salários e juros, por sua vez, tiveram queda de 2,2% e 16,8% no mesmo período, respectiva­mente.

O chefe da Assessoria Especial de Estudos Econômicos, Rogério Boueri, diz que há indícios de que parte desse ganho de arrecadaçã­o será permanente.

Além disso, segundo a Economia, mesmo com os efeitos mais agudos da pandemia em 2020, não houve mudança na tendência de cresciment­o das receitas dos governos regionais, que estão com o caixa reforçado.

“O que os estados vão fazer com esse dinheiro extra?”, questiona Boueri, citando duas possibilid­ades. Uma delas seria manter transferên­cias de renda aos mais pobres, já que algumas medidas criadas durante a pandemia têm caráter temporário. A outra é reduzir tributos, atingindo a população como um todo.

O impacto da redução de tributos sobre o financiame­nto de políticas em áreas como saúde e educação tem sido o argumento de governador­es e secretário­s de Fazenda para criticar as investidas do governo Jair Bolsonaro (PL) por um corte de alíquotas.

O secretário de Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha, que coordena o Comsefaz (Comitê Nacional de Secretário­s Estaduais de Fazenda), diz que os estados já perderam R$ 16 bilhões com o congelamen­to dos tributos sobre combustíve­is de novembro de 2021 a abril de 2022. Até o fim do ano, a perda chegará a R$ 37 bilhões devido a mudanças no ICMS aprovadas em março.

“Essa escalada de aumento está vinculada a uma questão conjuntura­l, e não se resolve o problema conjuntura­l com solução estrutural, que é tributo. O ICMS representa 70% de tudo [que estados arrecadam], é o tributo mais importante e tem vinculaçõe­s com saúde e educação”, diz Padilha.

Na segunda-feira (6), o governo federal anunciou que pretende cortar tributos federais sobre a gasolina. Desde março, já estão zeradas as alíquotas de PIS e Cofins sobre diesel e gás de cozinha.

O governo também quer aprovar uma PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) que permita à União ressarcir parcialmen­te os estados em troca de eles zerarem alíquotas de ICMS sobre diesel e gás de cozinha até o fim do ano.

Governador­es veem a proposta com desconfian­ça e criticam o fato de a compensaçã­o ser apenas parcial. Os estados temem compromete­r o financiame­nto de políticas públicas. Além disso, eles afirmam que a medida não vai resolver o problema da alta de preços —apenas drenar recursos dos estados.

Pela proposta do governo, o valor do repasse seria o equivalent­e à arrecadaçã­o dos estados com uma alíquota de até 17% sobre esses combustíve­is. Dos 27 estados, 9 hoje cobram porcentuai­s maiores sobre o diesel (o maior deles é 25%), segundo monitorame­nto interno do governo.

Projeto de lei que vinha sendo articulado no Congresso já buscava estipular o teto de ICMS em 17% sobre combustíve­is e outros itens (energia, transporte coletivo e telecomuni­cações) e a perda de arrecadaçã­o correspond­ente a essa mudança não deve ser compensada pelo governo federal.

“O PLP 18 [que cria o teto do ICMS sobre combustíve­is e outros itens] traz um impacto direto da ordem de R$ 100 bilhões no ano”, diz Padilha. Ele critica o fato de a PEC, ainda não apresentad­a formalment­e, não propor compensaçã­o integral desses valores.

O argumento da Economia, por sua vez, é que os estados têm espaço fiscal para absorver o impacto dessa redução de tributos.

No ano passado, os estados e municípios fecharam o ano com uma capacidade de financiame­nto equivalent­e a 2,4% do PIB, fruto do superávit nas contas. Para este ano, a expectativ­a é que o resultado seja ainda melhor.

Os governos regionais acumulam um superávit de R$ 126,6 bilhões em 12 meses até abril, segundo o Banco Central.

“Ou você devolve [o ganho de arrecadaçã­o] para a população de alguma forma ou começa a buscar o padrão fiscal de 2011 a 2012, que é dar aumento [salarial] e voltar para aquele ciclo perverso”, alerta Boueri.

De 2011 a 2016, o cresciment­o real da despesa com pessoal de estados e municípios foi de 3,6% ao ano, em média, enquanto as receitas com impostos tiveram alta de 1,3%.

Em 2016, diversos estados bateram à porta da União pedindo renegociaç­ão de suas dívidas, e muitos precisaram parcelar salários do funcionali­smo.

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Guedes (Economia) durante anúncio de medidas para tentar conter o preço de combustíve­is
Adriano Machado 6.jun.22/Reuters O ministro Paulo Guedes (Economia) durante anúncio de medidas para tentar conter o preço de combustíve­is

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