TCU veta sigilo de estoques e produtos vencidos da Saúde
O TCU (Tribunal de Contas da União) determinou a suspensão dos sigilos de estoques do Ministério da Saúde.
A decisão cita reportagens da Folha que revelaram que o governo Jair Bolsonaro (PL) acumulava, no ano passado, R$ 243 milhões em produtos vencidos, e que o diretor de Logística da Saúde, o general Ridauto Ribeiro, decidiu, em abril de 2022, ampliar o sigilo sobre os estoque.
O relator do processo, ministro Vital do Rêgo, afirmou na decisão que o sigilo “configura prejuízo ao controle social, à transparência dos atos da administração pública e ao direito à informação”.
“As informações do estoque de medicamentos e insumos de saúde, com a identificação daqueles cujo prazo de validade já se expirou, em princípio, por serem de interesse público e essenciais ao controle social, não deveriam ser consideradas sigilosas, a menos que se configurasse alguma causa justa que impedisse o seu amplo acesso”, disse Rêgo, relator do processo.
A suspensão foi feita de forma cautelar, assinada no último dia 3, e deve ser chancelada pelo restante da corte na sessão desta quarta-feira (8). A determinação atende a uma demanda feita pelo senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) e pelos deputados Felipe Rigoni (União Brasil-ES) e Tabata Amaral (PSB-SP).
O ministro também determinou que a Saúde envie mensalmente ao TCU dados sobre todos os produtos que foram incinerados por ultrapassarem a validade.
Ele ainda cobrou que a empresa VTCLog, que administra o centro de distribuição da Saúde, localizado em Guarulhos, na Grande São Paulo, envie dados sobre os produtos incinerados desde 2019.
Procurada, a VTClog disse que “não tem qualquer ingerência sobre a incineração de medicamentos, uma vez que este procedimento é determinado único e exclusivamente pelo Ministério da Saúde”.
O ministério se manifestou sobre a decisão do tribunal até a conclusão desta edição.
Como revelou a Folha ,osigilo de todo o estoque da Saúde cairia no próximo ano, mas o general da reserva Ridauto Fernandes assinou novo termo de classificação da informação no dia 20 de abril.
Com isso, não haveria mais uma data para todo o estoque ser revelado. As informações serão protegidas por dois anos a partir de quando forem produzidas.
Fernandes disse à Folha que uma das ideias é evitar que a indústria use os dados sobre o estoque para cobrar mais caro. “Se a pessoa que vai me vender sabe que estou desesperado para comprar, por exemplo, porque está acabando o produto, o preço vai lá na nuvem”, disse.
A área técnica do TCU disse que “falta plausibilidade” no argumento de Fernandes.
O relator do processo ainda afirmou que a Saúde não conseguiu justificar o sigilo ao tribunal.
No termo de classificação, a Saúde cita trechos de artigo da Lei de Acesso à Informação (12.527/2011) sobre dados “imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado” para justificar o sigilo.
Os pontos citados afirmam que os dados sobre estoque podem pôr em risco a vida, a segurança ou a saúde da população; oferecer elevado risco à estabilidade financeira, econômica ou monetária do país; e pôr em risco a segurança de instituições ou de altas autoridades nacionais ou estrangeiras e seus familiares.
O ministro também determinou que gestores da Saúde expliquem os “alegados riscos que fundamentaram a decisão de impor sigilo aos dados de estoque de insumos estratégicos em saúde”.
O relator afirma que análise de auditores já verificou que é “ineficiente” a gestão dos estoques da Saúde, “o que tem contribuído para o vencimento do prazo de validade de produtos em saúde”.
O Ministério da Saúde usou esse novo termo de classificação em 11 de abril para rejeitar um pedido feito pela Folha via Lei de Acesso à Informação sobre o estoque total vencido da pasta.
Os dados sobre esses produtos são facilmente obtidos em sistemas internos do Ministério da Saúde, usado apenas por servidores autorizados.
A Saúde guardava 3,7 milhões de itens sem validade em 2021. O dado foi obtido a partir de relatórios internos.
A lista de produtos vencidos incluía, por exemplo, 820 mil canetas de insulina, compradas por R$ 10 milhões e suficientes para 235 mil pacientes com diabetes durante um mês.