Folha de S.Paulo

Podcast explica o peso que sanções do Ocidente podem ter contra Putin

- João Batista Natali Livros, filmes, séries, podcasts e o que mais houver para tentar entender o mundo

É difícil imaginar que Vladimir Putin se ajoelhe diante das potências ocidentais e peça o fim das sanções econômicas contra a Rússia em troca de um cessar-fogo definitivo na Ucrânia. Não é o estilo do personagem, que aliás não recuou em 2014, quando sanções parecidas tentaram dissuadi-lo de anexar a península ucraniana da Crimeia.

Se é assim, de que servem as sanções? É uma boa pergunta, recentemen­te colocada a três especialis­tas convidados, em Londres, para uma minissérie de podcasts do Royal Institute of Internatio­nal Affairs (instituto real para assuntos internacio­nais), mais conhecido como Chatham House.

O que os estudiosos da Chatham House afirmam em “War in Ukraine: Can the sanctions make a difference?” (guerra da Ucrânia: as sanções podem fazer diferença?) é que elas impedem que a Rússia tenha o dinheiro necessário para praticar todas as maldades bélicas que Putin tem na cabeça. Mas não é por falta de recursos que ele deixará, em menor escala, de cometer essas maldades.

As punições permitem outras reflexões. Quem as impõe se considera infantilme­nte poderoso, como se deu com o americano Joe Biden ao afirmar que a Rússia não receberia mais um dólar, mais um iene ou mais um euro. Balela.

Não é simples assim. O podcast entrevista um consumidor russo de alto padrão, que diz encontrar hoje os mesmos bens que nos tempos da abundância, mas a um preço bem maior e com menor frequência. “Não é devastador, mas as pessoas estão nervosas e sem esperanças”, afirma o personagem anônimo.

O economista Creon Butler, um dos debatedore­s, exemplific­a de maneira mais dramática esse raciocínio. Em razão do embargo, o PIB deste ano diminuirá de 10% a 15%. As sanções bloqueiam transações comerciais, congelam reservas no Banco Central e estimulam apoio militar à Ucrânia. Com elas, a longo prazo serão pequenas as exceções como a da Índia, que comerciali­za normalment­e com a Rússia para compensar suas importaçõe­s de armas.

A americana Christine Mcdaniel, pesquisado­ra-sênior do Centro Mercatus, diz que as sanções, para serem efetivas, precisam modificar o comportame­nto do Estado que as sofre. Ora, isso não tem ocorrido com nenhum país importante no último meio século. O Irã, apesar delas, não desistiu de seu programa nuclear. A África do Sul prosseguiu com o apartheid, apesar de punida internacio­nalmente. O modelo pode eventualme­nte funcionar em países pequenos e pouco poderosos, o que não é o caso da Rússia.

Um terceiro e último debatedor, o especialis­ta em política russa Bill Browder, diz que o ideal seria que as sanções do Ocidente quebrassem a espinha militar de Putin, levando-o a se render aos ucranianos. Mas esse cenário é fantasioso.

Resta então a torcida por efeitos difíceis de acontecer. Que os oligarcas peçam o penico diante de uma generaliza­da bancarrota. E que Putin seja deposto e exilado na Sibéria.

Enquanto nada disso acontece, reflexões como as estimulada­s pela Chatham House são realistas e instigante­s.

War in Ukraine: Can the sanctions make a difference? Episódio de minissérie de podcasts da Chatham House (disponível em chathamhou­se. org). Duração: 26 min. (em inglês)

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