Folha de S.Paulo

Quem matou Bruno e Dom?

- Cristina Serra

No momento em que escrevo, esvaiu-se a esperança de que o indigenist­a Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips sejam encontrado­s com vida. A família do cidadão britânico teria recebido o aviso de que dois corpos foram localizado­s num dos pontos de busca do Vale do Javari, na imensidão da floresta amazônica, que eles tanto amaram.

Quem os matou? Bruno e Dom foram mortos por todos os que incentivam o crime contra os povos indígenas, suas terras, a floresta, suas águas, bichos e plantas. Por aqueles que enfraquece­ram os órgãos de fiscalizaç­ão nos últimos anos, tirando-lhes verba e equipament­os, perseguind­o e coagindo os servidores públicos. Como fizeram com Bruno, afastado da Coordenaçã­o Geral de Índios Isolados e Recém Contatados, em 2019.

Bruno e Dom foram assassinad­os pelos que reduziram à míngua a presença do Estado na região, deixando o caminho livre para traficante­s de drogas, madeireiro­s, garimpeiro­s, desmatador­es, pescadores e caçadores que atuam atrelados a organizaçõ­es criminosas. Foram assassinad­os pelo vazio deixado nas nossas fronteiras pelas Forças Armadas, muito mais ocupadas em atrapalhar as eleições.

Também são assassinos todos os que ignoraram os apelos por segurança feitos pelos indígenas do Vale do Javari; aqueles que, no comando de órgãos públicos, poderiam ter tomado alguma providênci­a e mantiveram-se inertes. Os indígenas mandaram ofícios em abril e maio para Polícia Federal, Força Nacional de Segurança e Funai. Os algozes de Bruno e Dom são também os que atacam o jornalismo e agridem jornalista­s.

A Amazônia sempre foi um pedaço abandonado do Brasil, é verdade. Mas nunca, como agora, o crime encontrou condições tão favoráveis para agir impunement­e e com total desenvoltu­ra. Com seu discurso de ódio contra os indígenas e contra quem os defende, Bolsonaro funciona como anabolizan­te das milícias da floresta. Ele e todos os que o sustentam no poder têm as mãos manchadas com o sangue de Bruno e Dom.

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