Folha de S.Paulo

Emicida e Djonga elevam voltagem política do festival João Rock com coros contra Bolsonaro

- Pedro Martins O jornalista viajou a convite do festival

RIBEIRÃO PRETO Ribeirão Preto foi tomada por coros de ataques contra Jair Bolsonaro no último sábado. A 312 quilômetro­s de São Paulo, a cidade do noroeste paulista é o satélite de uma região que detém uma das maiores programaçõ­es do país de shows sertanejos, gênero que ficou associado aos eleitores do presidente. Neste fim de semana, porém, as arenas de montaria foram substituíd­as por pistas de skate, e as violas, por guittaras, com a volta do João Rock.

O festival, considerad­o o maior do país dedicado ao rock nacional, tem uma trajetória marcada por manifestaç­ões políticas. O mesmo público que não poupou a ex-presidenta Dilma Roussef em 2014 e 2015, contudo, agora gritou a plenos pulmões “fora, Bolsonaro”, “ei, Bolsonaro, vai tomar no cu” e “olê, olê, olá, Lula, Lula” —a mesma tônica do Lollapaloo­za e da Virada Cultural, que ocorreram em março e maio na capital paulista.

Boa parte das manifestaç­ões partiram da plateia, composta por 70 mil pessoas. Enquanto alguns cantores preferiram se abster, dizendo apenas que “este ano só está tocando hit no João Rock” e emendando o coro político a qualquer outra canção —caso da maioria dos representa­ntes do rock e do pop rock, como Pitty e Nando Reis—, outros levantaram suas vozes contra o presidente às vésperas do pleito que deve ser marcado pela oposição entre Lula e Bolsonaro.

Entre eles estava Emicida. Ao fim do segundo ato do show-manifesto que lançou no festival —“Amor, Ordem e Progresso”, em parceria com Criolo e Céu—, o rapper interrompe­u o coro anti-Bolsonaro e fez um pedido ao público.

“Faz um favor para mim? Quando chegar outubro, mandem este lixo de volta para o esgoto de onde ele nunca deveria ter saído”, gritou.

As manifestaç­ões atravessar­am toda a apresentaç­ão, que tomou o palco com projeções das faces de ícones do movimento negro como a escritora Sueli Carneiro e o ator Milton Gonçalves, que morreu à espera de um presidente negro.

Houve também projeções de fotografia­s emblemátic­as da ditadura militar, como a de Evandro Teixeira, tirada no centro do Rio de Janeiro, que retrata um homem indo ao chão ao ser perseguido por dois policiais em 1968 durante a manifestaç­ão estudantil que ficou conhecida nos livros como “Sexta-Feira Sangrenta”.

É uma lembrança, afirmou Emicida à reportagem, de que, mesmo “em momento de autoritari­smo mais agudo”, “a arte brasileira soube se colocar como um bastião da liberdade”. “Tem uma inseguranç­a pairando no ar, porque a gente tem assistido a uma escalada antidemocr­ática nos últimos anos, mas o Brasil tem capacidade de produzir uma resposta à altura.”

Antes de Emicida subir ao palco, houve ainda Djonga, que elevou a voltagem política do João Rock à sua máxima potência. Primeiro, o rapper pediu que o público levantasse as mãos, erguesse bem os dedos do meio e pensasse em alguém que “odeiam muito e não respeitam”.

Foi a deixa para que o recinto fosse dominado por ataques contra Bolsonaro, que se repetiram por pelo menos mais três vezes até que, a 15 minutos de o show com duração de uma hora ser encerrado, Djonga pediu que a plateia formasse uma roda para bater as cabeças, prática conhecida como “mosh”.

Foi o prelúdio para o ápice de sua apresentaç­ão —e também um dos pontos mais catárticos do festival—, que se deu quando Djonga improvisou com a boca batidas de funk e pôs os seus bailarinos para dançar em sincronia ao som do coro de “ei, Bolsonaro, vai tomar no cu”, que ele arrematou cantando “Olho de Tigre”, música responsáve­l por ter alçado sua carreira ao estrelato e em que pede nada menos do que “fogo nos racistas”, }uma “sensação sensaciona­l”.

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Divulgação O músico Beto Lee em fotografia de Angelo Pastorello

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