O segundo órgão mais burro
Você pensa demais, conversa com o cérebro, vai ser mais produtivo
“Queria trocar uma ideia com você, Coração.”
“Não posso parar agora. Até porque, se fizer isso, você morre.”
“É que você anda meio acelerado.”
“Não é tomando três garrafas de café por dia que isso vai mudar.”
“Eu sei, mas eu estive pensando e…”
“Esse é o problema. Você pensa demais. Conversa com o Cérebro, vai ser mais produtivo.”
“Já tentei. Escrevi até uma coluna sobre isso.”
“Podia ter escrito uma poesia. Rascunhei uns caminhos, se quiser ouvir.”
“Com todo o respeito, mas sempre que eu te escuto acabo me metendo em situações muito desagradáveis.”
“Se essa conversa for sobre escolher pessoas erradas, reclama no andar de baixo, no setor reprodutivo. Sei que inteligência não é o meu forte, mas basta aquela maluca ver um boné de aba reta pra torturar todo mundo.”
“Ela se perdeu no discurso pussy power, virou ditadora.”
“Você pode escrever sobre isso e expor ainda mais sua intimidade para suas leitoras, que tal?”
“Posso tentar, mas se depender de você vou passar a tarde ouvindo músicas tristes e chorar até parecer um cosplay do Fofão.”
“Amo isso.”
“Você ama qualquer merda. Intensamente. Dá a impressão de que o roteirista da minha vida é o Manoel Carlos. E o feminismo, onde entra nessa história?” “Aqui não, com certeza.” “Agora virou seletivo? Na hora de deixar a torcida Jovem Fla se esparramar no sofá com os pés na mesa de centro, tem espaço de sobra.”
“Se você está insatisfeita com meu trabalho, faz um transplante, amore.”
“Não quero brigar com você.” “Tanta gente com cardiopatia e você reclamando de um coração saudável, amplo, arejado, com área de lazer, salão de jogos, suíte master.”
“Queria ter um pouco desse amor próprio. Só isso.” “Terapia ajuda.”
“Já faço, mas você insiste em me sabotar. E as minhas prioridades?”
“Se o problema é escrever a coluna, pode falar mal de mim, eu não ligo. Uma mágoa a mais, uma a menos, não vai fazer diferença.”
“Mas aí seria muito cafona.” “O amor pode até ser cafona, mas um boné de aba reta é mais.”
“Nossa. Nunca imaginei que você seria capaz de dizer uma coisa sensata.”
“Digo duas: melhor não se acostumar com isso.”