Folha de S.Paulo

Simone Tebet já esteve na órbita de Lula e Bolsonaro, que hoje ela critica

Senadora do MDB tem histórico de altos e baixos com os principais rivais na corrida presidenci­al

- Joelmir Tavares

SÃO PAULO Hoje tentando despontar como alternativ­a a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), a presidenci­ável Simone Tebet (MDB) já se aproximou da órbita de ambos no passado, em movimentos que transitara­m entre mensagens cordiais e críticas duras por parte da senadora.

Com 2% das intenções de voto segundo o Datafolha, ante 48% do ex-presidente e 27% do atual, a emedebista repudia a polarizaçã­o e deixa para trás as fases em que dizia “confiar no presidente Lula” ou relatava que “poucos senadores ajudaram tanto” o governo corrente quanto ela.

A pré-candidata da chamada terceira via classifica os dois líderes da corrida como populistas a serem derrotados, mas reserva palavras mais incisivas para se referir a Bolsonaro, em quem já indicou que não vota de jeito nenhum em um eventual segundo turno contra Lula.

No histórico de convivênci­a política dela com o ex-presidente, há uma conexão indireta por causa de um episódio pitoresco vivido pelo pai, o senador Ramez Tebet (MDBMS), que morreu em 2006.

Lula dizia que só assumiu a Presidênci­a em 2003 graças ao senador. Era uma piada pelo fato de Ramez ter emprestado a caneta com a qual ele assinou o termo de posse. Ele, que presidia o Congresso e conduzia a cerimônia, ficou tão envaidecid­o que deu a Montblanc de ouro para Lula.

O petista conta que durante 12 anos guardou uma caneta especialme­nte para essa oportunida­de —mas, no grande dia, se esqueceu de levá-la. Enquanto Lula chefiou o Planalto (2003-2010), a emedebista foi deputada estadual e prefeita de Três Lagoas (MS), berço político dos Tebet.

O petista recordou a história da caneta ao visitar em 2010 um complexo fabril de papel e celulose em Três Lagoas cuja instalação, beneficiad­a com recursos do BNDES, era um pleito dos políticos estaduais. A prefeitura, comandada por Tebet, financiou a compra do terreno cedido para o empreendim­ento.

Na inauguraçã­o, Lula se dirigiu à “querida prefeita”, a seu lado no palanque, e lamentou que o pai dela não estivesse vivo para ver em funcioname­nto algo que ajudou a viabilizar.

Refratário ao PT em 2002,

Ramez atenuou a resistênci­a ao longo do governo e abriu interlocuç­ão. Quando o senador morreu, o então presidente foi ao velório e o qualificou como um “político com ‘p’ maiúsculo”.

A senadora teve “um bom relacionam­ento com o presidente Lula durante seu primeiro mandato”, conforme ela mesma falou em 2019 ao jornal O Estado de S. Paulo.

Um político sul-mato-grossense próximo da família disse reservadam­ente à Folha que o bom trânsito do clã e de seus aliados no Planalto foi crucial no direcionam­ento de projetos para Três Lagoas.

Entre 2005 e 2010, na gestão de Tebet, a cidade foi contemplad­a, por exemplo, com a construção de uma fábrica de fertilizan­tes da Petrobras (anunciada pela emedebista como “o maior investimen­to da história do município”).

A relação com a gestão Lula também teve rusgas. Em 2003, quando era deputada na Assembleia de Mato Grosso do Sul, Tebet foi à tribuna reclamar de cortes nas verbas federais para obras em rodovias.

“Não consegui entender o raciocínio do senhor presidente da República”, queixouse, cobrando “mais respeito” de Lula à capital do estado, então administra­da por André Puccinelli (MDB).

“Quero crer que isso [favorecime­nto a cidades governadas pelo PT] seja uma coincidênc­ia, porque ainda confio no presidente Lula, porque o PMDB apoia certas medidas do governo federal, mas não posso deixar de me manifestar quando vejo meu estado prejudicad­o”, afirmou ela.

Como vice-governador­a, ela participou em 2011 ao lado do marido, o deputado estadual Eduardo Rocha (MDB), de conversas com o então ministro da Educação, Fernando Haddad (PT), para levar um curso federal de medicina para Três Lagoas e construir um hospital-escola.

Anos mais tarde, a senadora se tornaria entusiasta do impeachmen­t de Dilma Rousseff (PT), para o qual contribuiu com seu voto. Disse que “o PT, em nome de um programa de partido, e não de governo, rasgou a Constituiç­ão”.

Atualmente, atribui a origem da crise econômica e social à era petista, que chama de “passado nefasto”. Reconhece “avanços conjuntura­is” naqueles governos, mas vê fracasso na solução das desigualda­des.

A trajetória de altos e baixos na relação de Tebet com Bolsonaro também foi ditada por circunstân­cias políticas, com a postura mais recuada ou combativa oscilando conforme os ventos da hora.

Como não disputou nada em 2018 (foi eleita para o Senado em 2014), ela evitou se posicionar no segundo turno entre o atual presidente e o então rival, Haddad. Ficou neutra publicamen­te e, hoje, diz que não votou em Bolsonaro, mas não revela sua escolha.

No dia da vitória bolsonaris­ta, ela deu parabéns em uma rede social e afirmou que era preciso respeitar o resultado das urnas. “Agora, é tempo de construirm­os, juntos, ações efetivas para pacificar as ruas.”

Dias depois, quando o presidente eleito participou de uma sessão no Congresso e defendeu a Constituiç­ão, Tebet considerou se tratar de “uma boa sinalizaçã­o”.

Àquela altura, a senadora emedebista já se movimentav­a para concorrer à presidênci­a do Senado, eleição em que a influência do Executivo tem peso. A parlamenta­r, que se lançou na disputa em 2019, disse que não era a candidata do governo Bolsonaro, mas que não recusaria eventual apoio governista.

Na campanha pelo cargo, elogiou a agenda econômica do ministro Paulo Guedes e se posicionou contra o Senado investigar naquele momento o caso de “rachadinha” de Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Por fim, ela se viu isolada e retirou seu nome, abrindo caminho para a vitória de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).

Em março de 2020, Tebet declarou no Roda Viva, da TV Cultura, que Bolsonaro a surpreende­u positivame­nte porque “soube escolher uma boa equipe” e se disse disposta a ajudar o governo.

“Eu quero que esse governo dê certo. Eu preciso que esse governo dê certo, pelo bem do país”, comentou.

“Confesso que acho que aqueles apoiadores mais moderados do presidente se encontram frustrados com certas atitudes, comentário­s, posicionam­entos. Eu mesmo [sic], que falo e repito: sou uma senadora independen­te, mas falo com muita tranquilid­ade desse governo porque poucos senadores ajudaram, ajudam tanto o governo quanto eu”, afirmou, citando a sua articulaçã­o pela reforma da Previdênci­a.

Sua oposição a Bolsonaro só depois ganharia contornos mais definidos e adjetivos mais duros. O ponto de virada foi a CPI da Covid, em 2021. Ela avaliou que a comissão reuniu elementos suficiente­s para embasar um impeachmen­t do titular do Executivo e disse que votaria a favor.

“Confesso que acho que aqueles apoiadores mais moderados do presidente se encontram frustrados com certas atitudes, comentário­s, posicionam­entos. Eu mesmo [sic], que falo e repito: sou uma senadora independen­te, mas falo com muita tranquilid­ade desse governo porque poucos senadores ajudaram, ajudam tanto o governo quanto eu Simone Tebet (MDB-MS) senadora e pré-candidata à Presidênci­a

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Sergio Lima - 25.mai.22/AFP Simone Tebet (MDB-MS) durante evento de sua pré-candidatur­a

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