Mulheres na política hesitam sobre serem alvo de violência
Mona Lena Krook diz que diferentes formas de agressão, como ameaças e abusos, muitas vezes são negligenciadas
RIO DE JANEIRO Ao conversar com mulheres na política, Mona Lena Krook perguntava se elas já haviam sofrido violência —e muitas vezes ouvia “não”. Porém, quando insistia e descrevia determinados tipos de violência — abusos, intimidação e ameaças—, frequentemente as mesmas mulheres diziam: “Ah, sim, foi o que eu sofri”.
Por videoconferência, a cientista política afirma que esse reconhecimento costuma esbarrar na linguagem, já que agressões psicológicas muitas vezes não são consideradas um tipo de violência.
Professora da Universidade Rutgers (EUA), Krook participou em maio do webinar “Formação Política para Mulheres”, promovido pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) em parceria com o consulado dos EUA.
A violência contra as mulheres na política é uma resposta negativa ao aumento da participação delas nestes espaços? É uma resistência antiga e duradoura, mas maior agora porque há mais mulheres nessas posições. Minha primeira área de estudo foram as cotas para mulheres na política. Quando fiz perguntas sobre o seu impacto, pensei que fossem responder “as cotas deixaram todos mais receptivos a líderes mulheres” ou “as cotas mudaram as ideias sobre quem pode tomar decisões”. As pessoas confirmaram essas transformações, mas disseram que houve resistência, com violência, assédio, intimidação.
Quais as formas mais comuns de violência contra mulheres na política? Física, psicológica, sexual, econômica. Essas são quatro formas muito reconhecidas nas leis internacionais. No meu livro adiciono um quinto tipo, que chamo de violência semiótica: usar imagens e palavras muito degradantes para tratar de mulheres na vida pública. Sei que há muito disso com [a expresidente] Dilma [Rousseff ].
Muitas mulheres, ao menos em um primeiro momento, não se reconhecem como vítimas dessa violência, certo? Frequentemente pensamos na política como um espaço violento, de conflito. Então talvez não pareça surpreendente que, quando as mulheres ingressam nesses espaços, elas encontram violência. Uma coisa com a qual fiquei muito intrigada é que, uma vez que você explica os diversos tipos de violência, elas dizem “ah, sim, foi exatamente o que eu sofri”. Uma das maiores barreiras é que a palavra violência remete a violência física, que, sabemos, é uma das formas menos comuns. Há uma tendência a achar que os outros tipos não são importantes. A palavra violência é difícil, mas se você pergunta “você já foi ameaçada?”, “você já recebeu uma mensagem online abusiva?”, elas respondem
“sim”. Se você pergunta “você já sofreu violência?”, elas dizem “não, mas já sofri intimidação, ameaças e abuso”.
Como diferenciar a violência comum nos espaços políticos e aquela que tem como fundamento o preconceito de gênero? A violência na política é contra seu oponente, homens e mulheres podem passar por isso. Já a violência contra mulheres na política é baseada na identidade. É sobre quem pode participar da política. Tem como raiz a ideia de que a mulher não deveria estar na política, então você usa a violência para expulsá-la.
O caso de Marielle Franco parece ser um exemplo. Ela foi assassinada por ser uma mulher negra na política ou porque atingiu os interesses das milícias? Podem ser os dois, não devemos negligenciar o aspecto identitário. Ela tinha ideias ameaçadoras para pessoas no poder, mas havia também o fato de que era uma mulher negra, lésbica, da favela. Um dos critérios é identificar se a comunidade sentiu que esse foi um ataque baseado na identidade.
Quais são as soluções a curto prazo para a violência contra as mulheres na política? Temos declarações regionais e internacionais, leis internacionais, especialmente na América Latina. Temos parlamentos adotando códigos de conduta, aumentando a segurança para os políticos. Mas a solução na base de tudo é o aumento da conscientização. Falar sobre o problema, nomeálo, dizer que não é aceitável.
“A violência contra mulheres na política é baseada na identidade. É sobre quem pode participar da política. Tem como raiz a ideia de que a mulher não deveria estar na política, então você usa a violência para expulsá-la