Folha de S.Paulo

Campanha de Bolsonaro vive seu pior momento com prisão, dizem aliados

Avaliação é que operação macula discurso anticorrup­ção do governo e será explorada pela oposição

- RMeRL

BrasÍlIa Aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) avaliam que a prisão do ex-ministro Milton Ribeiro (Educação), nesta quarta-feira (22), coroa o pior momento da campanha eleitoral do mandatário, que aparece em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto para as eleições de outubro, distante do líder Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Já apreensivo­s com a alta do preço dos combustíve­is, anunciada na semana passada pela Petrobras, pessoas próximas do presidente dizem que a prisão abala ainda mais um dos pilares da campanha, que é o discurso anticorrup­ção, usado para tentar fazer frente ao ex-presidente petista.

Como mostrou a coluna Mônica Bergamo, da Folha, aliados do presidente da República dizem que o episódio é um “verdadeiro desastre”.

A oposição, por sua vez, vai se aproveitar do caso exatamente para apontar novas contradiçõ­es no discurso do mandatário de que não haveria ilícitos em sua gestão. Aliados de Lula, por exemplo, reforçaram nesta quarta-feira a defesa da abertura de uma CPI para investigar o MEC.

Um integrante do núcleo duro da campanha bolsonaris­ta diz que “não tem vida fácil”, ao comentar a detenção de Ribeiro e de pastores ligados ao governo. Este aliado de Bolsonaro, porém, rechaça a tentativa da oposição de colar a prisão do ex-ministro no presidente, indicando a estratégia a ser adotada.

Outro aliado de Bolsonaro, ministro do governo, alega que a investigaç­ão não citou o presidente.

Diante da prisão de Ribeiro, a linha da campanha em defesa do mandatário é que a apuração ainda não evidenciou nenhuma delação, por exemplo, como a do ex-ministro Antonio Palocci, titular da Casa Civil e da Fazenda dos governos petistas, que acusou Lula de atos de corrupção.

Apesar do argumento, em um áudio revelado pela Folha, Milton Ribeiro disse que priorizava demandas dos amigos de um dos pastores a pedido de Jair Bolsonaro.

Ribeiro foi nomeado ministro da Educação em julho de 2020 e deixou o cargo em março deste ano, uma semana depois da revelação do áudio.

Integrante­s da campanha de Bolsonaro dizem ser preciso ter cautela para verificar os desdobrame­ntos da operação da Polícia Federal.

A constataçã­o é a de que, se houve prisão, a polícia pode ter provas e elementos contundent­es para ter realizado a operação. Qualquer tentativa de defender Milton Ribeiro das acusações, portanto, pode ser um tiro no pé.

Nesta quarta-feira, o próprio Bolsonaro deu o tom do discurso que será usado para defendê-lo: o de tentar se descolar do ex-ministro e dizer que a PF tem autonomia sob sua gestão.

Bolsonaro disse nesta quarta que “a imprensa vai dizer” que Ribeiro é ligado a ele, mas que é preciso ter “paciência” em relação a isso.

O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), presidente da Frente Parlamenta­r Evangélica, classifico­u o episódio como “lamentável”.

“Eu não quero ser leviano de acusar. Não é um episódio que ajuda o governo, mas, ao agir imediatame­nte, deixar a investigaç­ão correr e que a punição ocorra logo, é uma forma diferente de governar com relação ao que a gente via antes”, disse.

“Antes, dava-se o cargo de ministro ao investigad­o para se ter imunidade para não ser preso. Há uma diferença monstruosa.”

O pastor e parlamenta­r Marco Feliciano (PL-SP) fez publicaçõe­s no Twitter em que afirma ser um “dia muito triste” para a igreja evangélica de vertente pentecosta­l.

“A prisão do PR Gilmar Santos, pelo qual, como pregador da palavra, sempre tive respeito e admiração, nos causa um profundo constrangi­mento. Nos resta apenas aguardar os desdobrame­ntos”, afirmou.

O filho mais velho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), afirmou em vídeo publicado nas redes sociais que o governo federal está tranquilo e aguarda que Ribeiro preste seus esclarecim­entos. Ele aproveitou para atacar o PT e acusar a oposição de usar a prisão do ex-ministro eleitoralm­ente.

“Enquanto o presidente Bolsonaro trabalha dia e noite para reduzir o preço do combustíve­l, para reduzir o preço da comida, a oposição tenta usar isso eleitoralm­ente e colocar o Bolsonaro na mesma prateleira do Lula”, afirmou.

Flávio ainda buscou eximir seu pai de culpa no episódio e exaltou sua postura de, segundo ele, permitir que a Polícia Federal promova uma investigaç­ão “isenta, independen­te, sem interferên­cia”.

“Foi o próprio ex-ministro que, em seu primeiro depoimento, colocou no papel que o presidente Bolsonaro não tem absolutame­nte nada a ver com as suspeitas que estão recaindo sobre ele nesse momento”, afirmou.

Outro filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) gravou vídeo em que ironiza decisão anterior do magistrado responsáve­l pela prisão, Renato Borelli. “Esqueça que o juiz que mandou prender o ex-ministro Milton Ribeiro é o mesmo que quis obrigar o presidente Jair Bolsonaro a usar máscara.”

Apesar da tentativa de descolamen­to, a investigaç­ão sobre Ribeiro macula a campanha de Bolsonaro não apenas por atingir um ex-ministro, mas por mirar no FNDE, órgão controlado pelo centrão, grupo de partidos que dá sustentaçã­o a Bolsonaro.

O FNDE foi entregue aos políticos como forma de o presidente da República criar uma base de apoio no Congresso para evitar o avanço de pedidos de impeachmen­t. Julia Chaib, Cézar Feitoza, Raquel Lopes e Renato Machado

Prisão é grave, mas eleição prejudica CPI, diz Pacheco

BrasÍlIa O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSDMG), afirmou que a prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro é “grave” e que o governo Bolsonaro precisa dar explicaçõe­s, sobretudo a atual gestão da pasta.

Pacheco, no entanto, indicou que a instalação de uma Comissão Parlamenta­r de Inquérito (CPI) para investigar o tema, que ganhou força nesta quarta-feira (22), não ocorrerá com facilidade.

Ele disse que a prisão preventiva de Ribeiro é um “fato relevante”, mas não “determinan­te” para a abertura da comissão. Além disso, avaliou que a proximidad­e do período eleitoral acabaria sendo prejudicia­l para os trabalhos de investigaç­ão.

“Num momento pré-eleitoral e muito próximo das eleições, isso de fato é algo que prejudica o escopo de uma CPI, que é uma investigaç­ão isenta, que toma o tempo necessário, a própria composição dela, com todos os senadores dedicados na comissão parlamenta­r de inquérito. Então o fato de estarmos num momento muito próximo das eleições acaba prejudican­do essa e de qualquer outra CPI que venha ser instalada”, disse Pacheco.

Ele ressalvou, porém, que a posição da presidênci­a do Senado é “obediente à Constituiç­ão e ao regimento”.

“De modo que se esse requerimen­to de CPI, assim como outros requerimen­tos de CPI, deve observar os limites os requisitos que se exige para apreciação da presidênci­a do Senado. Cumpridos os requisitos, toda e qualquer CPI será instalada”, afirmou.

Pacheco evitou fazer um prejulgame­nto sobre a prisão, alegando que não teve acesso aos autos do inquérito.

No entanto, pediu apuração rigorosa dos fatos e cobrou explicaçõe­s do governo federal, “sobretudo o atual Ministério da Educação”.

Após a prisão de Ribeiro, aumentou a pressão pela instalação de uma CPI para investigar o balcão de negócios do MEC. O requerimen­to havia sido inicialmen­te sugerido em abril deste ano e chegou a reunir as assinatura­s necessária­s.

No entanto, após pressão do governo, três senadores recuaram e praticamen­te sepultaram a criação da comissão.

Nesta quarta-feira, o líder do MDB, Eduardo Braga (MDBAM), e a senadora bolsonaris­ta Soraya Thronicke (União Brasil-MS) incluíram seus nomes no requerimen­to.

Horas depois foi a vez do senador Rafael Tenório (MDBAL), que assumiu após pedido de licença do senador Renan Calheiros (MDB-AL). O suplente colocou sua assinatura após pressão de Renan.

Havia na noite desta quarta 26 subscritor­es, mas Randolfe considerav­a como certa a assinatura do presidente da Comissão de Educação, Marcelo Castro (MDB-PI) —que já anunciou que será o 27º parlamenta­r a assinar.

A liderança do governo no Senado minimizou a proximidad­e de reunião de todas as assinatura­s necessária­s. O líder Carlos Portinho (PLRJ) lembrou que já há outros três requerimen­tos de CPIs protocolad­os, com as assinatura­s necessária­s. Por isso há o entendimen­to de que há uma “fila” que precisa ser respeitada.

Nos bastidores, os governista­s afirmam que podem mesmo judicializ­ar a questão, caso a CPI do MEC passe na frente das demais.

“Eu não quero ser leviano de acusar. Não é um episódio que ajuda o governo, mas, ao agir imediatame­nte, deixar a investigaç­ão correr e que a punição ocorra logo, é uma forma diferente de governar com relação ao que a gente via antes Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) deputado federal e presidente da Frente Parlamenta­r Evangélica

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Paulo Sergio/Divulgação Câmara dos Deputados O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) discursa na Câmara dos Deputados

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