Tom da reação ao caso gera dilema evangélico para rivais
são paulo A prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro completa uma tempestade perfeita na campanha de Jair Bolsonaro (PL) para tentar permanecer na cadeira em outubro, não bastasse a inflação, a Petrobras, as trágicas mortes na Amazônia.
Afinal de contas, é um caso de corrupção bravo, com ligação direta entre os envolvidos e a figura presidencial.
Bolsonaro, como ele mesmo disse quando o auxiliar estava em apuros, botava a “cara no fogo” pelo pastor presbiteriano que ocupou o MEC.
Mas é esta última qualificação que torna o episódio algo distinto do que costumamos ver durante as pré-campanhas eleitorais eivadas por prisões de aliados de protagonistas no Brasil.
Se não é um integrante raiz, por assim dizer, do bolsonarismo evangélico que ascendeu com a eleição de 2018, Ribeiro traz para o foco os pastores acusados de engendrar o esquema no governo.
Assim, ambos os lados das principais trincheiras eleitorais, a de Bolsonaro e a de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), medem suas palavras para evitar que a associação entre “pastores” e “corrupção” se torne numa acusação generalizante.
E, com isso, que aliene o grupo que representa 27% do eleitorado, segundo o Datafolha.
Operadores bolsonaristas correram, na manhã desta quarta (22), para tentar unificar um discurso que isolasse o presidente. Evangélicos muito próximos do Planalto, como o deputado pastor Marco Feliciano (PL-SP), foram às redes lamentar o episódio, sem contudo entregar os acusados à fornalha eterna.
Bolsonaro foi na mesma linha, colocando a Polícia Federal como uma Santa Inquisição: se acusou, é porque tem algo a ser explicado. Mas foi isso, sem maiores elaborações como de resto é típico do modus operandi do político.
Assim, buscou evitar a ideia de que joga Ribeiro e seus preciosos pastores, que estiveram 45 vezes no Planalto e 100 vezes com o então ministro, no mesmo lago de fogo.
Cabe lembrar que o apoio ao presidente entre evangélicos só fez crescer após a eclosão do escândalo, em março deste ano, naquilo que um estrategista bolsonarista chamou de reação corporativa clássica. Resta saber como será agora.
Ao fim, não parece uma tática muito eficaz, em especial se o caso desdobrar-se, mas é a única possível neste momento. Bolsonaro sempre se gabou de ter 90% das igrejas evangélicas, mas não as históricas como a de Ribeiro.
É, como se sabe, uma imprecisão grosseira baseada em seu bom desempenho entre esse eleitorado em 2018.
A pesquisa Datafolha de maio dá a medida: 44% dos evangélicos afirmam apoiar o presidente no primeiro turno, descontados aí votos brancos e nulos e indecisos, enquanto 40% vão de Lula. Empate técnico, que se repete em simulações de segundo turno.
Do lado de Lula, o problema é análogo, embora a metodologia seja diferente. Arroubos que já se viram entre ditos progressistas, reduzindo evangélicos a corruptos pela associação a Bolsonaro, não deverão ser registrados entre aliados do petista.
O ex-presidente já conta com um passivo muito grande entre esse eleitorado, a começar pela defesa que deixou de ser defesa do direito ao aborto no começo deste ano.
Lula escorregou em outros itens caros ao eleitor mais conservador, como seu apoio a ditaduras e a fala recente lembrando a gestão que fez para soltar os sequestradores do empresário Abílio Diniz.
A máquina de moer digital do bolsonarismo já juntou tudo no mesmo pacote para tascar rótulos anticristãos em Lula, que por ora conta mais com a gravidade do impacto da crise econômica entre os mais pobres —franjas que se sobrepões à filiação evangélica.