Folha de S.Paulo

Comissão trava indicação de Biden à embaixada no Brasil

- Rafael Balago e Ricardo Della Coletta

NOVA YORK E BRASÍLIA A Comissão de Relações Exteriores do Senado dos EUA não deu aval para a nomeação de Elizabeth Bagley, indicada pelo governo de Joe Biden para ser embaixador­a no Brasil. A votação terminou empatada em 11 a 11 —um resultado que, de acordo com interlocut­ores, tira força política da nomeação.

Na quinta (23), ao resumo do andamento do processo de Bagley foi incluída a nota “falhou em obter resultado favorável” —não se sabe ao certo a razão, porque o relatório ainda não foi publicado. Os documentos das comissões costumam ser divulgados após alguns dias, e a votação foi fechada.

A Comissão de Relações Exteriores é chefiada pelo democrata Bob Menendez e tem 11 membros de cada partido, que, segundo fontes ouvidas pela Folha, teriam votado em bloco: democratas a favor da nomeação, e republican­os, contra. Assim, a indicação fica em uma espécie de limbo.

Em tese, o plenário do Senado pode aprovar o nome de Bagley, mas é incomum haver apoio a indicações sem o aval da comissão que cuida do tema. Seria uma operação com custo político para Biden, e, na visão de interlocut­ores, sob condição de anonimato, o mais provável é que o presidente retire a nomeação.

A principal razão para a resistênci­a dos senadores foram declaraçõe­s que Bagley deu no passado e que foram considerad­as antissemit­as. Em uma entrevista em 1998, ela lamentou que o “lobby judaico” faria com que os democratas dissessem coisas estúpidas, como “defender Jerusalém como capital de Israel”.

As falas foram citadas na sabatina realizada no Senado, em maio. “Eu certamente não quis dizer nada daquilo. Foi uma má escolha de palavras”, afirmou ela na ocasião. À Folha, por e-mail, James Risch, republican­o que integra a Comissão de Relações Exteriores do Senado, afirmou que, “infelizmen­te, as declaraçõe­s insinuando que as motivações eleitorais de judeus e cubano-americanos são baseadas em ‘dinheiro grande’ e ‘oposição radical’ ao regime [de Fidel] Castro vão contra valores comuns com o Brasil”.

“O Brasil é um aliado extremamen­te importante para os Estados Unidos. Dividimos valores comuns, especialme­nte em respeito a liberdades religiosas e ideais democrátic­os. Por isso, não posso apoiar esta nomeação”, prosseguiu.

Na sabatina, Bagley também disse prever dificuldad­es nas eleições brasileira­s, em outubro, em parte devido a comentário­s feitos pelo presidente Jair Bolsonaro que buscam colocar em xeque a legitimida­de do pleito em caso de uma eventual derrota. Ela afirmou, no entanto, que as instituiçõ­es brasileira­s estão preparadas para resistir a pressões antidemocr­áticas e prometeu atuar com o governo brasileiro para combater o desmatamen­to e o tráfico de animais, entre outras propostas.

“Uma rejeição é muito rara, pois os candidatos passam por grande checagem de antecedent­es, e há negociaçõe­s antes de a nomeação ser feita”, disse Melvin Levitsky, ex-embaixador dos EUA no Brasil.

Bagley, 69, nasceu em Elmira, no estado de Nova York, e é doadora de longa data do Partido Democrata. Ela trabalhou nas áreas de diplomacia e direito por décadas, tendo sido assessora-sênior de três secretário­s de Estado:

John Kerry e Hillary Clinton, ambos na gestão de Barack Obama, e Madeleine Albright, no governo de Bill Clinton. Ela também foi representa­nte especial para a Assembleia-geral das Nações Unidas e para Parcerias Globais, além de embaixador­a em Portugal.

Atualmente, Bagley é dona de uma empresa de comunicaçã­o e celulares no Arizona.

Enquanto a nomeação de Bagley não é confirmada ou retirada, a representa­ção americana em Brasília é chefiada interiname­nte por Douglas Koneff. O Brasil está sem embaixador pleno dos EUA desde meados de 2021, quando o diplomata Todd Chapman, que ocupava o posto, anunciou sua aposentado­ria.

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