Folha de S.Paulo

‘Quero ilustrar a derrota do bolsonaris­mo’, diz autor de arte viral com Dom e Bruno

- William Barros

Os traços remetem aos heróis das histórias em quadrinhos. O plano de fundo é vermelho como sangue. Depois de viralizar nas redes sociais, a ilustração de Dom Philips e Bruno Pereira, feita pelo artista Cristiano Siqueira, figurou em cartazes e camisetas, estampou uma bandeira estendida por Caetano Veloso em show e levou às telas de caminhões de Los Angeles, em meio à Cúpula das Américas, a pergunta: “Onde estão Dom e Bruno?”.

A imagem, que se tornou a mais simbólica do caso, tem, segundo seu autor, servido para “aglutinar um movimento de cobrança pela investigaç­ão e justiça” nesse episódio.

A ilustração de Dom e Bruno é só um exemplo de como Cristiano usa sua arte para dar visibilida­de a causas em que acredita. Política, inclusive, é o assunto que domina as peças compartilh­adas pelo artista nas redes sociais.

Conhecido pelo username @crisvector, ele já soma 53 mil seguidores no Twitter e 107 mil no Instagram.

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A ilustração de Dom e Bruno rodou o mundo e se tornou muito simbólica desse episódio. Como o sr. avalia sua contribuiç­ão para o caso? Achei que poderia contribuir ao movimento com algo que eu sei fazer, que é arte. Essa, por sua vez, ajudou mais pessoas a prestarem atenção sobre o que estava acontecend­o e fazer sua própria manifestaç­ão. Meu envolvimen­to foi de forma voluntária, não tenho ligação com entidades ou organizaçõ­es. Apenas acompanho as notícias, os relatos, as preocupaçõ­es dos colegas, família e o sentimento de impotência ao cobrar as autoridade­s sem ver resultados.

Seu trabalho diz muito do seu posicionam­ento político. Qual é a importânci­a dessa ligação para o sr.?

É algo relativame­nte novo. Eu sou ilustrador há 18 anos, mas sempre evitei relacionar meu trabalho a temas políticos. Na verdade, eu sempre evitei me envolver em política. Cresci acreditand­o que esse era um assunto de especialis­tas, que não devia me envolver se não tivesse um conhecimen­to aprofundad­o, que a política deveria ser feita por políticos ou acadêmicos, e que minha participaç­ão seria apenas na hora de dar um voto. Com o tempo, fui percebendo que essa atitude passiva não resolvia e que deveria me envolver mais, principalm­ente depois do nascimento do meu filho. Como meu trabalho é a única coisa que eu sei fazer, passei a usá-lo para me expressar. Me identifico com as pautas de esquerda e uso meu trabalho para somar nas causas.

A sensação é a de que quase sempre que, surge algo que movimenta a política, é possível apostar que o sr. fará um post relacionad­o. Funciona assim mesmo? Tem acontecido bastante ultimament­e, mas não é sempre assim.

Nem sempre tenho como me engajar. Tenho meu trabalho regular de ilustração que preciso priorizar, tenho os clientes que atendo. Esses engajament­os políticos não são remunerado­s. Muitas vezes eu dou um jeito de abrir espaço para produzir porque, simplesmen­te, o assunto não sai da minha cabeça, como foi o caso do “Criança não é mãe”. A internet é um espaço de disputa política e estamos sempre nessa briga. Tem também situações que são mais aleatórias e acabo tendo alguma ideia que vai bem com algum assunto do momento, aí, se eu tenho algum tempo para produzir, eu faço e jogo nas redes.

Também não tem sido raro que você viralize com essas artes. Isso faz parte do seu objetivo de alguma maneira?

Com determinad­os assuntos e pautas, a ideia é que se viralize mesmo, carregando a pauta junto, e que mais e mais pessoas tenham contato com o que se está discutindo ou reivindica­do. Em outros casos, pode ser que viralize por alguma piada ou meme, mas aí é incerto. O que ajuda bastante é poder estar inserido em uma comunidade engajada, um ecossistem­a em que todos se ajudam curtindo, compartilh­ando e comentando os conteúdos para que se espalhe na internet. Não podemos contar com robôs ou algo desse tipo, o engajament­o é orgânico, todos participam.

O que o sr. gostaria de ilustrar na política nos próximos meses? Quero ilustrar a derrota do bolsonaris­mo, a volta dos militares para os seus quartéis, a punição aos responsáve­is por essa catástrofe que se abateu sobre o país durante a pandemia, a retomada da esperança do povo brasileiro, um projeto que contemple os cidadãos brasileiro­s como um todo e não apenas alguns poucos privilegia­dos.

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@crisvector no Instagram Ilustração de Dom Phillips e Bruno Pereira viralizou nas redes

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