Folha de S.Paulo

Coleção Folha investiga vida e obra de Michelange­lo a partir da desafiante Capela Sistina

- Nina Rahe

Para Goethe, um dos principais nomes da literatura alemã, “quem não viu a Capela Sistina não consegue ter noção intuitiva do que um homem sozinho pode alcançar”.

E é a partir dos afrescos da Capela Sistina, no Vaticano, que o sétimo volume da Coleção Folha Grandes Pintores, “Mestre dos Mestres”, destrincha a vida e a obra de Michelange­lo, o escultor, pintor, poeta e arquiteto que mudou a história da arte com suas criações.

O teto da capela, na opinião do historiado­r de arte Kenneth Clark, é uma declaração apaixonada à unidade entre a beleza anatômica, a energia intelectua­l e o propósito espiritual. Os nove episódios inspirados no Gênesis, no entanto, mostram que o artista estava preocupado, principalm­ente, com a representa­ção da alma humana. Na cena “A Expulsão do Paraíso”, Adão e Eva estão envelhecid­os, como se Michelange­lo quisesse mostrar que o aspecto físico expressa a espiritual­idade.

Em uma de suas cartas, o artista chegou a afirmar que o papa Júlio 2º, seu mecenas, havia permitido a ele fazer os afrescos como bem desejasse. Mesmo assim, o trabalho na Capela Sistina provocou diversas reações por causa da grande quantidade de nus, o que fez com que o pintor Daniele da Volterra fosse contratado para “vestir” boa parte deles.

Mas, para além desta que se tornou a principal obra de Michelange­lo, ao artista também havia sido confiado outro grande desafio —o túmulo do papa, para o qual ele levou quase 40 anos desde o primeiro esboço, em 1505, até a conclusão parcial, em 1542. Atualmente, do que se vê na basílica de San Pietro in Vincoli, em Roma, apenas três figuras foram feitas —Moisés, ladeado por Léa e Raquel.

É neste trabalho inconcluso e no conjunto funerário encomendad­o por Giuliano de Medici que estão as esculturas mais originais do artista. Nos túmulos dos Medici, para indicar a passagem do tempo, Michelange­lo associa as figuras femininas e masculinas ao princípio e ao fim, trabalhand­o os conceitos de aurora e crepúsculo, dia e noite.

Seu interesse pelas torções, que são trabalhada­s nas esculturas “O Dia” e “A Noite”, datadas entre 1526 e 1533, é analisado na coleção desde o crucifixo de madeira que o artista realizou durante o período em que esteve alojado no Convento de Santa Maria del Santo Spirito, em Florença, quando tinha apenas 17 anos. Nele, Jesus é retratado com a cabeça inclinada para a direita enquanto as pernas e os joelhos apontam para a esquerda, rotacionan­do a pelve.

O volume também analisa “A Batalha dos Centauros”, datada entre 1490 e 1492, primeiro grande trabalho da carreira do escultor em que tudo é pretexto para os estudos anatômicos, o que se percebe por meio da representa­ção das contrações musculares, dos braços, troncos, costas e pernas.

Para Michelange­lo, havia uma dimensão fundamenta­l na arte da escultura (e na obra inacabada) que permitia exprimir um sonho de perfeição inalcançáv­el. Mesmo assim, o historiado­r Giorgio Vasari não deixou de ver em sua “Pietá”, feita em 1498 e 1499, escultura que realizou com apenas 23 anos, o milagre de uma rocha sem forma que adquire uma perfeição que nem mesmo a natureza modela.

 ?? Reprodução ?? Detalhe do afresco ‘O Juízo Final’, de Michelange­lo, dentro da Capela Sistina, no Vaticano
Reprodução Detalhe do afresco ‘O Juízo Final’, de Michelange­lo, dentro da Capela Sistina, no Vaticano

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil