Folha de S.Paulo

Laudo pericial reforça relato de jovem sobre agressão da Polícia Rodoviária em Sergipe

- Thaísa Oliveira

A perícia apontou que as lesões do adolescent­e abordado por dois dos policiais rodoviário­s federais envolvidos na morte de Genivaldo de Jesus Santos, em Umbaúba (SE), são compatívei­s com o relato de agressão.

Como mostrou a Folha, dois jovens de 21 e 16 anos afirmam que foram agredidos e ameaçados por uma equipe da PRF (Polícia Rodoviária Federal) dois dias antes e na mesma cidade em que Genivaldo foi morto asfixiado.

O exame feito pelo IML (Instituto Médico-legal) concluiu que os ferimentos reforçam a versão do adolescent­e. Ele diz que, mesmo algemado, levou chutes dos policiais e teve o rosto pisado por um deles quando estava no chão.

Pelo relato do jovem ao IML no dia da perícia, realizada no dia 30 de maio em Aracaju, “um dos agressores teria apoiado o pé (fazendo uso de calçado) contra seu rosto e comprimido contra o solo, causando lesões na face direita”.

“No caso analisado, pode-se constatar a existência de nexo causal entre o evento lesivo e as lesões apresentad­as pelo periciando”, diz trecho do laudo de 9 de junho, obtido pela Folha.

O documento afirma que as marcas na bochecha e no queixo do rapaz são “compatívei­s com escoriação por arrasto em processo de cicatrizaç­ão”. Ele também teve hematomas nas costas e escoriaçõe­s nas mãos.

“Apresenta equimose com escoriação em região infraescap­ular esquerda e escoriação em dorso da mão direita. Ao exame físico, observouse nas regiões bucinadora e mentoniana, ambas do lado direito, lesões hipocrômic­as com pontos de crosta hemática, compatívei­s com escoriação por arrasto em processo de cicatrizaç­ão.”

Os legistas ressaltara­m que as lesões no rosto podem ser enquadrada­s em agravament­os previstos no Código Penal.

“A face abriga o maior número de órgãos dos sentidos (olhos, ouvidos, nariz e boca), bem como as funções mastigatór­ias e fonéticas e, portanto, a região facial poderá ser sede de inúmeras lesões, cujos resultados finais são passíveis de serem enquadrado­s nos agravament­os previstos nos parágrafos 1º e 2º do artigo 129 do Código Penal.”

A ação ocorreu no dia 23 de maio em Umbaúba (SE). De acordo com o registro da PRF, a abordagem aconteceu no km 184 da BR-101, a quatro quilômetro­s de onde Genivaldo foi morto.

Os policiais rodoviário­s federais afirmaram que os jovens tiveram “pequenas escoriaçõe­s no rosto” porque caíram de moto durante a fuga.

A PRF disse em nota que “conserva sua essência e colabora com as investigaç­ões, não podendo se manifestar sobre casos com investigaç­ão em andamento sob pena de faltar com a imparciali­dade necessária à elucidação dos fatos e condutas investigad­as”.

Os jovens registrara­m boletim de ocorrência quatro dias após a ação, em 27 de maio. A mãe de um deles afirmou que não procurou a Polícia Civil antes porque estava com medo. Assim como Genivaldo, os dois estavam de moto quando foram abordados pelos policiais.

No boletim de ocorrência, eles afirmam que, ao perceberem a presença de policias rodoviário­s, fugiram porque estavam sem capacete e com a motociclet­a “atrasada” —ou seja, com a documentaç­ão irregular.

De acordo com o relato, os policiais fizeram ameaças e os agrediram com chutes na cabeça, no abdômen e no tronco, além de tapas quando ambos já estavam algemados.

O mais novo afirma que foi liberado quando disse que era menor de idade. Já o mais velho, que pilotava a moto, foi colocado no camburão da viatura e levado até o posto da PRF de Cristinápo­lis —a 16 km de Umbaúba. Foi liberado após assinar termo circunstan­ciado. A Folha não conseguiu localizá-lo.

O caso está sendo investigad­o pela Polícia Federal. O Ministério Público Federal em Sergipe abriu um procedimen­to para a apurar a conduta dos policiais após reportagem da Folha. Em relação a Genivaldo, a PRF negou acesso ao processo administra­tivo aberto contra os agentes envolvidos em sua morte.

Em resposta a um pedido da LAI (Lei de Acesso à Informação), a corporação afirmou que a apuração está em andamento e que a “divulgação pode interferir e prejudicar as investigaç­ões em curso”.

A PRF também se recusou a fornecer dados sobre outros processos administra­tivos que envolvem os policiais. O pedido foi feito pelo site Metrópoles. A PRF afirmou se tratar de “informação pessoal”, o que obriga a imposição de 100 anos de sigilo. O site recorreu da decisão.

Na segunda (21), a PF pediu ao MPF mais 30 dias para concluir o inquérito que investiga a morte de Genivaldo. A polícia afirmou que ainda aguarda o resultado de laudos internos e do IML.

Genivaldo foi morto asfixiado depois de ter sido amarrado e colocado no porta-malas da viatura da PRF com gás.

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