Folha de S.Paulo

Genro de pastor do MEC recebeu dinheiro em negociação de evento

Wesley Costa de Jesus ganhou R$ 17 mil; empresário acertou agenda e depois levou denúncia a ex-ministro

- Paulo Saldaña

O genro do pastor Gilmar Santos, investigad­o por operar um balcão de negócios no MEC (Ministério da Educação), também recebeu dinheiro a partir de tratativas de um encontro com o ex-ministro Milton Ribeiro no interior de São Paulo em agosto de 2021.

Wesley Costa de Jesus, que também é pastor e já esteve com o presidente Jair Bolsonaro (PL), recebeu R$ 17 mil.

O comprovant­e da transferên­cia, obtido pela Folha, foi entregue à CGU (Controlado­ria-geral da União) pelo empresário José Edvaldo Brito.

As informaçõe­s prestadas por Edvaldo fazem parte do processo que baseou a operação Acesso Pago, que prendeu Milton Ribeiro e os pastores Gilmar e Arilton Moura, além do ex-assessor do MEC Luciano Musse e de Helder Bartolomeu, que é genro de Arilton.

A Polícia Federal investiga o balcão de negócios no MEC. Os pastores, ligados a Bolsonaro e Milton Ribeiro, negociavam com prefeitos a liberação de verbas da educação mesmo sem cargos no governo.

Ribeiro deixou o cargo no fim de março, uma semana depois de a Folha revelar um áudio em que diz priorizar pedidos dos pastores sob orientação de Bolsonaro. A prisão de Ribeiro foi grande desgaste político para Bolsonaro a menos de quatro meses da eleição.

A investigaç­ão foi remetida para o STF (Supremo Tribunal Federal) após o Ministério Público Federal apontar “indício de vazamento da operação policial e possível interferên­cia ilícita por parte do presidente da República”.

O pagamento a Wesley Costa de Jesus não é citado na manifestaç­ão do MPF nem na decisão da Justiça Federal que determinou as prisões.

Wesley recebeu a transferên­cia de R$ 17 mil no dia 5 de agosto de 2021. No mesmo dia, foram pagos R$ 20 mil para Luciano Musse e R$ 30 mil para Helder, conforme comprovant­es também obtidos pela Folha.

Casado com a filha de Gilmar Santos, Wesley, 35, é tratado como presbítero. Ele vai frequentem­ente a eventos religiosos com o sogro.

Em 14 de outubro de 2020, acompanhou Gilmar Santos em encontro com Bolsonaro em Brasília. Na ocasião, Santos divulgou nas redes sociais que o presidente confirmara a presença em um encontro evangélico na cidade de Balsas (MA) naquele mês.

O presidente desistiu da viagem em outubro de 2020 alegando problemas de segurança. Wesley também esteve com os pastores no MEC, como por exemplo, em 27 maio de 2021.

A Folha procurou Wesley e o advogado do pastor Gilmar, Reginaldo Silva, mas eles não respondera­m.

Os depósitos para Wesley, Musse e Helder somaram R$ 67 mil, valor citado por José Edvaldo Brito à CGU.

Os pagamentos foram feitos dias antes de um evento em Nova Odessa (SP) com a presença de Ribeiro. Ocorrida em 21 de agosto, a reunião com prefeitos da região foi organizada pelos pastores e seu grupo de apoio.

A Folha mostrou em março que o prefeito de Piracicaba (SP) disse ter recebido pedido de dinheiro para fazer um evento com Ribeiro na cidade poucos dias antes do encontro ser confirmado em Nova Odessa.

Foi o empresário Edvaldo Brito que negociou com os pastores a realização do evento após saber que ambos controlava­m a agenda do MEC. Eles se reuniram no hotel Grand Bittar em Brasília, onde também encontrara­m Luciano Musse (enquanto era assessor do MEC).

Esse hotel era o QG das negociaçõe­s dos religiosos e assessores do MEC com prefeitos.

Edvaldo Brito é presidente do Avante em Piracicaba e é ligado ao tema da educação.

Elecontaqu­esoubedopr­ojeto de gabinete itinerante do OC e entendeu que poderia ser útil para que gestores locais conseguiss­em preencher os trâmites técnicos para acessar os recursos federais.

“Uma pessoa me indicou que procurasse os pastores no hotel, e fui lá. Depois é que o Arilton falou do trabalho da igreja e pediu uma doação missionári­a. Em nenhum momento entendi isso como propina”, disse.

Os dados das três contas para pagamento foram repassados por Arilton. Quem fez os depósitos, diz Brito, foi outro empresário da região, Danilo Felipe Franco.

“Pedi ajuda a esse amigo, que também entendeu que era uma doação”, disse Brito.

Segundo Brito, ele passou a desconfiar dos pastores poucos dias antes do evento, quando solicitaçõ­es de passagens aéreas para aliados passaram a se avolumar. Ele recebeu um novo pedido de Arilton de mais R$ 10 mil no dia do evento.

Isso fez com que ele reclamasse com uma assessora concursada do MEC, que o chamou a relatar as denúncias. “Fui ao MEC em setembro. Estava o Milton, o Victor [Godoy Veiga, atual ministro], o Marcelo [Lopes da Ponte, presidente do FNDE]. Ai o ministro disse: estou sabendo que estão usando meu nome? Chegou a botar a mão na cabeça e perguntou se eu topava depor à CGU, o que aceitei, claro”.

Na primeira vez em que Brito falou com a CGU, só contou o que viu, segundo ele próprio. Somente numa segunda oportunida­de, depois que as denúncias já haviam sido publicadas, é que ele entregou os comprovant­es de pagamentos.

Ao se defender das denúncias, Milton Ribeiro citou essa denúncia encaminhad­a à CGU e disse ter se afastado de Arilton. Os registros de agenda provam o contrário. Além disso, houve a venda de carro entre Ribeiro e Arilton em fevereiro deste ano, o que é citado como suspeito nas investigaç­ões.

O ex-assessor Luciano Musse, que recebeu R$ 20 mil, só foi nomeado no MEC porque não deu certo a tentativa de empregar o próprio Arilton na pasta, como a Folha mostrou.

Além das transferên­cias de R$ 67 mil, José Edvaldo Brito gastou mais R$ 23,9 mil com passagens aéreas para o grupo dos pastores.

“Uma pessoa me indicou que procurasse os pastores no hotel, e fui lá. Depois o Arilton falou do trabalho da igreja e pediu uma doação missionári­a. Em nenhum momento entendi como propina

Edvaldo Brito (Avante-sp) prefeito de Piracicaba (SP) falando sobre o balcão de negócios do MEC

 ?? Reprodução ?? Gilmar Santos, Jair Bolsonaro e Wesley Costa de Jesus, em Brasília
Reprodução Gilmar Santos, Jair Bolsonaro e Wesley Costa de Jesus, em Brasília

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