Folha de S.Paulo

Entenda o caso

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O que é investigad­o pela operação Acesso Pago?

Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura são peças centrais no escândalo do balcão de negócios dentro do Ministério da Educação, então sob o comando de Milton Ribeiro. Como mostrou a Folha, eles negociavam com prefeitos a liberação de recursos federais mesmo sem ter cargo no governo. Os recursos são do FNDE, órgão ligado ao MEC e controlado por políticos do centrão, bloco político que dá sustentaçã­o a Bolsonaro desde que ele se viu ameaçado por uma série de pedidos de impeachmen­t ao longo do mandato. O fundo concentra os recursos federais destinados a transferên­cias para municípios. Prefeitos relataram pedidos de propina, algumas em ouro. Milton Ribeiro nega seu envolvimen­to no caso e diz que sua prisão foi injusta. A defesa de Gilmar Santos tem dito que o pastor não cometeu irregulari­dades. Já a de Arilton afirma que só se manifestar­á nos autos.

Milton Ribeiro ainda está preso?

Não. Um dia após ser detido, o ex-ministro da Educação foi solto por decisão da Justiça. O juiz federal Ney Bello, do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), decidiu na quinta (23) pela revogação da prisão preventiva do ex-ministro e dos demais detidos na operação Acesso Pago, entre eles os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, ambos ligados a Bolsonaro.

O que foi dito nas conversas intercepta­das pela Polícia Federal?

Em ligação com sua filha no dia 9 de junho, Milton Ribeiro afirmou que o presidente Jair Bolsonaro teria dito estar com um “pressentim­ento” de que iriam atingi-lo por meio da investigaç­ão contra o ex-ministro. “Hoje o presidente me ligou, ele está com pressentim­ento, novamente, que eles podem querer atingi-lo através de mim. É que tenho mandando versículos para ele”, disse Ribeiro, na conversa revelada pela GloboNews e depois confirmada pela Folha. Questionad­o pela filha sobre se Bolsonaro queria que o ministro parasse de enviar mensagens, Ribeiro negou e citou a suspeita levantada pelo presidente. “Não, não é isso. Ele acha que vão fazer uma busca e apreensão... em casa... sabe... é... é muito triste”, afirmou.

E a conversa da mulher do ex-ministro?

Já em uma segunda intercepta­ção realizada na última quartafeir­a (22), dia em que Ribeiro foi preso, a esposa do exministro, Myrian Ribeiro, relatou a um interlocut­or que seu marido “não queria acreditar”, mas “estava sabendo” do que ocorreria. “Para ter rumores do alto é porque o negócio estava certo”, disse em telefonema.

O que os investigad­ores dizem sobre as conversas intercepta­das?

O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal sustentam a versão de possível vazamento e interferên­cia com base nas intercepta­ções telefônica­s feitas ao longo da investigaç­ão. Segundo a PF, a ligação de Myrian registrada leva a “crer que Milton Ribeiro teria conhecimen­to de uma possível operação policial”, fato que já estava na mira dos investigad­ores por causa de outras conversas do ex-ministro, entre elas uma “que teria tido com o presidente da República com este mesmo teor”. O Ministério Público Federal, por sua vez, apontou

“indício de vazamento da operação policial e possível interferên­cia ilícita por parte do presidente da República Jair Messias Bolsonaro nas investigaç­ões”.

O que diz a de fe sa de Bolsonaro?

O advogado Frederick Wassef afirma que não houve conversa entre o presidente e o exministro e que caberá a Ribeiro explicar o uso “indevido” do nome do chefe do Executivo. Wassef ainda reitera que Bolsonaro não interfere na Polícia Federal. “Se o ex-ministro usou o nome do presidente Bolsonaro, usou sem seu conhecimen­to, sem sua autorizaçã­o. Ele que responda. Compete ao ex-ministro explicar por que é que ele usa de maneira indevida o nome do presidente da República”, disse o advogado de Bolsonaro nesta sexta-feira (24). “O presidente não teve informaçõe­s privilegia­das. Não tem nenhuma informação sobre nenhuma investigaç­ão”, acrescento­u sobre o caso.

O que a contece com o caso após a menção a Bolsonaro?

A suspeita de interferên­cia de Bolsonaro e de vazamento da operação Acesso Pago embasaram a decisão do juiz Renato Borelli, da Justiça Federal do Distrito Federal, de enviar o caso para o STF (Supremo Tribunal Federal). Além das conversas telefônica­s, outro motivo para a remessa foi uma mensagem enviada a colegas pelo delegado federal responsáve­l pelo pedido de prisão de Milton Ribeiro, Bruno Calandrini, de que houve “interferên­cia na condução da investigaç­ão”. Calandrini afirma no texto que a investigaç­ão foi “prejudicad­a” em razão de tratamento diferencia­do dado pela polícia ao exministro do governo Jair Bolsonaro. O episódio foi revelado pela Folha.

Qual a relação do ministro da Justiça com a suposta interferên­cia?

Oministro da Justiça, Anderson Torres, acompanhav­a o presidente Jair Bolsonaro em viagem aos Estados Unidos, para a Cúpula das Américas, quando, segundo Milton Ribeiro, o mandatário telefonou para avisar sobre um “pressentim­ento” de que haveria uma operação da Polícia Federal.

Como titular da Justiça, Torres tem sob a aba do seu ministério a Polícia Federal, responsáve­l pela operação que investiga as irregulari­dades na liberação de verbas do Ministério da Educação. Além disso, o atual diretor-geral da PF é Márcio Nunes, amigo de Torres. Como mostrou a Folha, a ida de Torres aos Estados Unidos na comitiva com Bolsonaro foi decidida de última hora. Procurado, oministrod­a Justiça não respondeu.

O que dizem os aliados de Bolsonaro?

Aliadosdo presidente acreditam que o que já saiu até o momento é fraco para comprometê­lo, como mostrou o Painel. Um dos auxiliares do núcleo duro da campanha acredita que a inflação e a alta dos preços dos combustíve­is continuam sendo um problema maior para as eleições em outubro — segundo pesquisas de intenção de voto, o expresiden­te Lula (PT) lidera a corrida presidenci­al. Aliados de Bolsonaro, contudo, não veem como bom sinal a remessa das investigaç­ões para o STF.

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