Folha de S.Paulo

TCU retoma processo sobre Lava Jato, pede rapidez e pode tornar Deltan inelegível

- Ranier Bragon

BRASÍLIA A decisão deste sábado (25) do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de reativar a apuração do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre gastos da Lava Jato estreitou os prazos de Deltan Dallagnol, ex-procurador e excoordena­dor da força-tarefa, que tem até a quarta-feira (29) para apresentar sua defesa ao órgão.

Depois disso, o caso deve ser colocado rapidament­e na pauta de julgamento­s. Se condenado, Deltan deverá ser enquadrado na Lei da Ficha Limpa e ficar inelegível por oito anos, a não ser que consiga reverter a situação nos tribunais superiores.

O relator do caso no TCU, ministro Bruno Dantas, emitiu despacho no sábado determinan­do a retomada do processo e orientando a área técnica a, após a apresentaç­ão da defesa, instruir o processo com a “máxima brevidade possível” diante do “risco de prescrição”.

Chefe da força-tarefa de procurador­es da Lava Jato que jogou por terra boa parte dos pilares do mundo político entre 2014 e 2018, Deltan foi exonerado do cargo, a pedido, em 3 de novembro de 2021.

Na ocasião, a Lava Jato já enfrentava um contínuo processo de desgaste e desmonte iniciado após o ingresso do exjuiz Sergio Moro (União Brasil) no governo de Jair Bolsonaro (PL) e as revelações de conversas que levantaram suspeitas de que magistrado e procurador­es agiram de forma parcial nas investigaç­ões e julgamento­s.

Deltan se filiou ao Podemos e manifesta a intenção de se candidatar a deputado federal nas eleições de outubro. Ocorre que a Lei da Ficha Limpa determina a inelegibil­idade de oito anos para agentes públicos que tiverem suas contas “rejeitadas por irregulari­dade insanável que configure ato doloso de improbidad­e administra­tiva, e por decisão irrecorrív­el do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário”.

O TCU instaurou a chamada “tomada de contas especial” —processo administra­tivo para apurar dano à administra­ção pública federal, com responsabi­lização dos agentes e determinaç­ão de ressarcime­nto— após representa­ção do subprocura­dor-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Furtado, e de parlamenta­res que questionav­am os gastos com diárias e passagens da Operação Lava Jato.

Em abril, o TCU determinou a citação dos investigad­os, que também incluem o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que também se filiou recentemen­te ao Podemos. Janot é citado por não ter coibido as supostas irregulari­dades.

Na época, o tribunal apontou que procurador­es que trabalhava­m em Curitiba receberam diárias mesmo tendo domicílio na capital do Paraná, entre outros supostos desvios. O dano ao erário foi calculado em R$ 2,8 milhões, em valores atualizado­s.

Deltan divulgou nota no sábado acusando Bruno Dantas de agir com motivação política. “A decisão do STJ não tocou no mérito do processo, em que já há manifestaç­ão judicial no sentido de que o procedimen­to do TCU é ilegal e abusivo, havendo inclusive indícios de quebra de impessoali­dade (suspeição) do ministro Bruno Dantas, o que caracteriz­a retaliação política por meu trabalho na Operação Lava Jato por parte de um ministro que estava no jantar de lançamento da pré-candidatur­a do ex-presidente Lula.”

Procurado, Dantas afirmou que só se manifesta sobre o caso nos autos. A Folha enviou pergunta a Deltan sobre o risco de inelegibil­idade, mas não obteve resposta. A reportagem não conseguiu contato com Janot.

Os candidatos às eleições de outubro serão oficializa­dos nas convenções partidária­s, que vão de 20 de julho a 5 de agosto. Após isso, ocorre o registro das candidatur­as.

É nesse momento que será verificada, formalment­e, a elegibilid­ade dos candidatos. Os pedidos de registro podem ser impugnados por qualquer outro candidato, por partido político ou pelo Ministério Público Eleitoral, no prazo de cinco dias. A partir daí, a Justiça decide o caso, que, em última instância, pode parar no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e no STF (Supremo Tribunal Federal).

Deltan deve ter a sua possível candidatur­a impugnada por adversário­s também por outro motivo, a tese jurídica de que ele já estaria inelegível por ter pedido exoneração do cargo de procurador com o objetivo de escapar de punições administra­tivas no Ministério Público.

Deltan pediu exoneração em meio a uma série de reclamaçõe­s disciplina­res contra ele no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e apenas 16 dias após o órgão aplicar pena de demissão ao procurador Diogo Castor de Mattos, membro de sua equipe, pela contrataçã­o de um outdoor em homenagem à operação.

Embora o CNMP diga que não havia na data de exoneração de Deltan nenhum Processo Administra­tivo Disciplina­r aberto contra ele no órgão, apenas reclamaçõe­s disciplina­res, o então procurador havia ingressado no STF com recurso contra decisão de um processo administra­tivo anterior.

Com isso, adversário­s dizem considerar que o processo ainda estava aberto. Deltan disse considerar não haver nenhuma chance de essa impugnação prosperar.

Juiz responsáve­l pelos casos da Lava Jato, Moro também tem enfrentado percalços em sua tentativa de primeira candidatur­a. Após o naufrágio de sua postulação à Presidênci­a da República, o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo decidiu rejeitar a mudança de domicílio eleitoral do ex-juiz do Paraná para São Paulo. Moro agora avalia uma candidatur­a ao Governo do Paraná.

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Theo Marques - 10.dez.21/UOL O ex-procurador Deltan Dallagnol em cerimônia de filiação ao Podemos

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