Aluno na universidade e professor na vida, foi afeto e resistência
GERMÂNIO EUSTÁQUIO DA SILVA (1952-2022)
são paulo Germânio Eustáquio da Silva tinha 69 anos. Com o trabalho de conclusão de curso aprovado, ultimamente finalizava disciplinas da graduação de publicidade e propaganda da Unipac (Universidade Presidente Antonio Carlos), em Barbacena (MG). No dia 19 de junho, ele entrou para as estatísticas de mortos por Covid-19.
Paciente psiquiátrico internado na década de 1980, ao sair do hospital foi para uma RT (residência terapêutica), destinada a pessoas com transtornos mentais internadas em hospitais psiquiátricos, que não puderam retornar às famílias. Lá manifestou vontade de estudar.
Fez o EJA (Educação de Jovens e Adultos), prestou o Enem e com a nota da prova ingressou na universidade.
Pelo menos na região de Barbacena, ele foi o primeiro morador de RT a chegar ao ensino superior, segundo alguns professores.
Germânio nasceu na cidade mineira de Barroso. Bicampeão do Prêmio Expocom Sudeste nos anos de 2021 e 2022, é ainda coautor de dois trabalhos que serão apresentados no 45º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (Intercom), que será em setembro, em João Pessoa.
“Tinha sede pelo conhecimento e amor pelo ensino superior. Era ávido por estudar, participar e colocar sua opinião. Ele encontrou na faculdade o espaço para ser ouvido e para ser alguém. Aprendi muito mais com o Germânio do que ele comigo. Ele foi a minha maior alegria e o melhor desafio que eu poderia ter como educador”, afirma Ricardo Rios, professor do curso de Publicidade e Propaganda da Unipac.
Motivos não faltaram a Germânio para se revoltar contra a vida, mas ele optou por usar sua doçura para ensinar as pessoas a sua volta a ser alguém melhor.
“Ele me ensinou a escutar mais e ter mais doçura. Sempre foi um ser humano amigo, calmo e paciente. É muito bonito uma pessoa de quase 70 anos buscar a formação numa faculdade”, diz Ricardo.
“Germânio era muito generoso, um ser de luz que deixou um legado de afeto, força, resistência. Era a prova viva de que o diagnóstico não pode fechar portas. A trajetória dele foi um resgate de cidadania e superação”, afirma a psicopedagoga e psicóloga Maria da Conceição Fajardo Monteiro, a Sãozinha. Ela o acompanhou durante sua trajetória acadêmica quando era responsável pelo NAP (Núcleo de Apoio Psicopedagógico) da Unipac.
“Os versos ‘A arte de sorrir / Cada vez que o mundo diz não’ da canção ‘Brincar de Viver’, cantada por Maria Bethânia, o representava. Germânio transmitia alegria, apesar das dificuldades. Ele adorava essa música e brincava que era nossa”, conta Maria Fajardo.
Germânio deixa muitos amigos. Não há informações sobre a sua família.
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