Folha de S.Paulo

Militares, usados por Bolsonaro em teses golpistas, fiscalizar­ão urnas

Forças Armadas preparam checagem de boletins, além de teste de integridad­e e da zerésima

- Cézar Feitoza Júlia Chaib e CF

A atuação inédita das Forças Armadas na fiscalizaç­ão das eleições que ocorrem neste domingo (2) foi utilizada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para desacredit­ar o sistema eletrônico de votação e motivo para acirrar a crise entre o governo e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Mesmo com toda a turbulênci­a, generais ouvidos pela Folha afirmam que a atuação não busca promover uma ruptura institucio­nal, por mais que Bolsonaro use os militares para fazer insinuaçõe­s golpistas. Para eles, a tentativa é de auxiliar no aprimorame­nto do processo eleitoral, mesmo sem experiênci­a no assunto.

No dia da votação, as Forças Armadas trabalharã­o em duas frentes. Como de costume, vão atuar em operações de Garantia de Votação e Apuração, cujo objetivo é auxiliar em questões logísticas e de segurança. Ao todo, 34 mil militares vão a 585 municípios em 11 estados para transporte de urnas e segurança de eleitores. O trabalho envolve ainda proteção aeroespaci­al e cibernétic­a.

Em outra frente, as Forças Armadas vão trabalhar em três etapas da fiscalizaç­ão. Na manhã de domingo, os militares vão checar a emissão da zerésima, boletim cujo objetivo é confirmar que as urnas não possuem votos antes do início da votação. Durante o pleito, representa­ntes das Forças também vão acompanhar o teste de integridad­e —auditoria que confirma se as urnas registram corretamen­te os votos.

Após a votação, militares espalhados pelo país vão tirar fotos de 385 boletins de urna e enviá-las a técnicos das Forças Armadas em Brasília. O objetivo é conferir se os votos não sofrem mudanças ao chegar ao TSE. Essa última etapa, revelada pela Folha, causou mal-estar entre Defesa e tribunal.

Estimulado por integrante­s da corte eleitoral, o TCU (Tribunal de Contas da União) também decidiu realizar uma checagem semelhante à dos militares no dia da eleição, para servir como uma salvaguard­a contra possíveis questionam­entos dos militares. Auxiliares da Defesa e generais do Alto Comando do Exército ouvidos pela Folha afirmam que o objetivo da fiscalizaç­ão não é contestar o resultado do pleito.

Dizem, porém, que se encontrare­m falhas no processo eleitoral que possam influencia­r no resultado das eleições há caminhos previstos em resoluções do TSE para pedira verificaçã­o dos sistemas eleitorais.

Os militares foram incluídos na discussão do processo eleitoral em setembro de 2021. Numa tentativa de frear os ataques de Bolsonaro às urnas, o então presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, criou a Comissão de Transparên­cia Eleitoral e incluiu as Forças Armadas no colegiado. A ideia era trazer os militares para perto do processo e, assim, conseguir o respaldo deles na defesa do sistema de votação.

Em conversas reservadas, porém, magistrado­s avaliam que a tentativa de obter um antídoto teve o efeito contrário: em vez de aumentar a confiabili­dade do pleito, forneceu uma ferramenta para as Forças Armadas inflarem ainda mais o discurso de Bolsonaro contra o sistema eleitoral brasileiro.

Defesa fará checagem de máquinas de voto em 153 municípios

Brasília O Ministério da Defesa afirmou ao TCU (Tribunal de Contas da União) na sexta-feira (30) que coletará boletins de urna em 153 municípios para fazer a checagem da totalizaçã­o dos votos no primeiro turno das eleições.

Segundo relatos de quem teve acesso ao documento, os militares informaram que a amostra não será aleatória. De acordo com os integrante­s da Defesa, a definição foi feita seguindo princípios metodológi­cos de estatístic­a.

Na resposta ao TCU, a Defesa ainda afirmou que não pretende usar os boletins de urna para fazer as contas e descobrir o resultado final da eleição. O objetivo é apenas conferir se os votos não sofrem alterações durante a transmissã­o dos dados para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

No ofício, os militares falam em conferênci­a de dados e não em totalizaçã­o.

A equipe da Defesa ainda diz que se forem encontrada­s divergênci­as nos números, um relatório será encaminhad­o ao TSE para que o próprio tribunal adote as providênci­as para análise do caso.

Na avaliação de integrante­s do TCU, a amostra a ser coletada pela Defesa não é suficiente para contrapor o resultado da eleição a ser anunciado pelo TSE.

A resposta foi bem recebida entre auditores já que, como a própria Defesa confirmou que não vai extrapolar os dados e checar, pela amostra, o resultado das eleições, este é um indício de que não haverá questionam­ento do resultado das urnas.

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